Vestibular está com os dias contados no país
Jornal Diário da Manhã, 02/12/2007
Vestibular está com os dias contados no país
Lídia Borges
Os padrões de acesso às instituições de ensino superior (IES) passam por um ciclo geral de mudanças em todo o Brasil. O tradicional vestibular ainda é o método mais utilizado, mas outras formas de seleção são adotadas de maneira gradual. O quadro goiano segue a mesma tendência. Há três anos a Universidade Estadual de Goiás (UEG) adotou o Sistema de Avaliação Seriado (SAS), que divide o processo seletivo ao longo do Ensino Médio (EM), com a aplicação de provas para os alunos no 1º, 2º e 3º anos. Há também, pelo menos, 12 IES no Estado que aderiram ao Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) – são quase mil no País inteiro, segundo publicado no Guia do Estudante 2008.
Na Universidade Católica de Goiás (UCG), por exemplo, a pontuação do Enem pode ser aproveitada como parte da nota das provas do vestibular, enquanto na Faculdade Brasileira de Educação e Cultura (Fabec), o exame substitui o processo seletivo no ingresso. Mas a grande questão debatida entre estudantes e educadores é: o vestibular tradicional vai acabar? Enquanto não houver vagas nas universidades públicas suficientes para atender todos os estudantes que terminam o EM, algum tipo de seleção sempre vai existir, afirma o professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG) João Ferreira de Oliveira, doutor em Educação.
A desproporção entre os números confirma a idéia do professor. O último censo da Educação Superior, de 2005, aponta que o número de ingressos em universidades e faculdades públicas brasileiras foi de 331,3 mil alunos. Mas a quantidade de matrículas no último ano do Ensino Médio superou os 2,4 milhões de estudantes. Em outras palavras, para cada aluno que obteve uma vaga na graduação pública, ao menos, sete ficaram de fora. Para o pós-doutor em Filosofia Sirio Lopez Velasco, a limitação do acesso ao ensino superior para os egressos do EM denuncia a deficiência das políticas públicas para o setor.
“Depois que o vestibular é instalado, passa a funcionar por inércia e transforma-se numa espécie de rito social, cujo fundamento não é questionado. Sou partidário pelo fim do vestibular”, critica. Nesse contexto, o professor da Fundação Universidade Federal de Rio Grande (FURG) também desaprova a adoção do Enem como critério para a entrada do estudante nas universidades, se for estabelecido como processo seletivo. “O único critério justo para brindar acesso à universidade é o fato de ter ou não ter concluído o ensino médio.”
UFG
Como forma de ingresso, a Universidade Federal de Goiás manteve até a sua última seleção para 2008 o mesmo modelo de vestibular tradicional. Mas a instituição tem um projeto denominado “UFG inclui” que prevê mudanças para a forma de selecionar seus candidatos. Uma das propostas é o aproveitamento de notas do Enem na primeira fase. Além disso, propõe o chamamento de, pelo menos, 20% de alunos de escolas públicas para a 2ª Etapa e um acréscimo de 8% na nota da 2ª Etapa dos candidatos egressos de escolas públicas. O objetivo é ampliar o ingresso e a permanência dos estudantes de escolas públicas em todos os cursos.
“O UFG Inclui” estima um impacto significativo em cursos mais concorridos, já que um pequeno acréscimo na nota representa um avanço em muitas posições na classificação geral. Isto traria uma possível mudança no cenário verificado hoje, que é de elitização dos cursos com maior prestígio social, como Medicina e Odontologia. “Infelizmente, o vestibular não seleciona só os que têm melhor desempenho. Existe uma seletividade social, em que os alunos com menos condições financeiras não concorrem em pé de igualdade porque não tiveram condições de comprar livros, de se dedicar exclusivamente aos estudos, de ter mais acesso à educação e cultura de forma geral”, avalia o professor João de Oliveira.
UEG OFERECE SISTEMA DE AVALIAÇÃO SERIADO
Márcya Cristina Gomes e Vinícius Ferreira, ambos de 17 anos e alunos do 3º ano do Ensino Médio do Sesc Cidadania Elias Bufaiçal, chegaram ao vestibular deste ano com relativa tranqüilidade em relação aos colegas. A diferença é, que desde o 1º ano, já faziam provas do Sistema de Avaliação Seriado (SAS), aplicadas pela Universidade Estadual de Goiás (UEG). Eles fazem parte da primeira turma que participou do programa e ainda têm que completar a segunda fase da etapa do 3º ano. Se obtiverem bom desempenho, têm a chance de entrar na faculdade sem passar pela seleção tradicional.
Uma das vantagens é que enfrentam uma concorrência significativamente menor. Márcya disputa uma vaga para Educação Física com outros seis candidatos. No vestibular tradicional, o índice chegou a 29 concorrentes/vaga no período matutino e 14, no vespertino. Vinícius também teve sorte e vai concorrer com 12 candidatos para Administração – seriam 20, se tivesse feito apenas a seleção única. “A idéia de testar o aluno a cada ano com menor número de questões é interessante, porque se pode aprofundar mais a avaliação do conhecimento na prova”, afirma Vinícius.
Os dois alunos também ampliaram a possibilidade de acesso a outras instituições, já que fizeram o Exame Nacional de Ensino Médio (Enem). A diretora do Núcleo de Seleção da UEG, Maria Salette da Trindade Rebelo, afirma que a divisão da avaliação das habilidades dos candidatos em três anos é mais justa e democrática, uma vez que permite que eles demonstrem seus conhecimentos em mais de uma oportunidade e sem o estresse comum ao vestibular.
Isso tem estimulado também as escolas a investirem melhor no ensino já no início do Ensino Médio, explica Salette. A diretora ressalta a importância adquirida pelo SAS ao longo dos três anos, com uma crescente adesão ao sistema. Na última edição, mais de dez mil alunos das três séries do EM e de 706 escolas particulares e públicas do Estado se inscreveram para as 1.001 vagas disponíveis em todos os cursos. Esse número representa 20% do total de vagas da UEG, que é de 5.005.