Ruptura e continuidade

Jornal O Popular, 09/12/2007

Ruptura e continuidade

Ninguém espera que haja unanimidade em relação ao vestibular. Ontem, na Reforma Rivadávia Correa, como hoje, no vestibular da UFG, o debate é produtivo e permite a confrontação de perspectivas em relação à sociedade em geral e à educação, em particular. Múltiplos interesses (empresariais, familiares e outros) intervêm, como é razoável, no debate democrático. O concurso vestibular, sabemos todos, não é uma coisa fácil para ninguém. Professores, vestibulandos, familiares reclamam por diversas, particulares e justas razões. Mas, principalmente, por um motivo: não existe a fórmula perfeita.

Antonio Luiz de Souza

O vestibular 2008 da UFG apresentou a última avaliação ainda dentro do modelo que explora conhecimentos compartimentados. É considerado um concurso de transição para uma avaliação multidisciplinar, em que os conteúdos estabelecem estreitos diálogos. Muito mais importante que os conteúdos, devemos atentar para as habilidades exigidas. É mais que uma tendência dos concursos para ingresso nas Instituições de Ensino Superior (IES). É como se fosse uma política pública.

A Comissão do Vestibular da UFG organizou um seminário para discutir com os professores do Estado de Goiás os conteúdos, as habilidades e o modelo de elaboração do exame 2008. A formulação dos novos temas para composição geral do conteúdo e das habilidades foi discutida, como convém à sociedade democrática. A comissão ouviu atentamente críticas e sugestões dos presentes.

A prova do vestibular 2007 foi duramente criticada, no caso de história, por causa do conteúdo factual (ou positivista). O exame 2008 apresentou um grande avanço. Modernidade, do programa de história, dialogou com a prova de português. A prova de história foi inovadora porque rompeu com a repetição estéril e optou pela leitura e interpretação (produção de conhecimento) das informações oferecidas. A banca examinadora montou uma prova exatamente dentro dos parâmetros discutidos e publicados no Manual da UFG. Lá estão os conteúdos e as habilidades propostas, manipulando os artefatos da arte ou da literatura para interpretá-los como práticas culturais. Neste sentido, o conceito de representações foi importante para o vestibulando decodificar as questões propostas. A questão sobre historiografia republicana inovou, renovando nossas tarefas em sala de aula. A prova não explorou história de Goiás. A 10ª questão, aparentemente de Goiás, explorava o bandeirismo, construção de identidade e lugar de memória – o que é, em verdade, história geral do Brasil, conteúdo de domínio comum nos Parâmetros Curriculares Nacionais.

Os fenômenos de cultura são fatos de comunicação e devem ser estudados como sistemas de signos. Houve ruptura principalmente com aquele discurso histórico que era entendido como anjo libertador de todos os oprimidos pelas burguesias e imperialismos (o que facilitava as práticas dos dadores de aula).

A fórmula de transição para romper com os saberes compartimentados provocou duas grandes aberturas: na primeira, teria facilitado a prova para os candidatos estrangeiros; na segunda, reestruturaria a dinâmica das disciplinas em sala de aula. Então, a competição é acirrada porque os vestibulares abandonam enfoque local e regional em favor da dimensão nacional. Segundo os primeiros levantamentos, aproximadamente 180 alunos estrangeiros concorrem na segunda fase para o curso de Medicina. Linguagens, diversidade cultural e ruptura com os esquematismos simplistas são os novos horizontes dos professores. Evidentemente, o conteúdo (ou informação) é fundamental para todas as áreas no trabalho de produção do saber.

A Comissão do Vestibular precisa ter continuidade para aprimorar o processo seletivo. As bancas examinadoras precisam ser permanentes, abertas ao diálogo e à renovação bibliográfica, temática e interpretativa. Sem regionalismo tacanho, precisamos valorizar os fenômenos locais e regionais, compatibilizando o generalista ao especialista. Defendemos que a Comissão do Vestibular estabeleça um equilíbrio entre a informação (conteúdo) e a interpretação.

No caso específico de história, precisamos alcançar algo próximo ao equilíbrio entre os diversos domínios (econômico, político, imaginário) para explorar melhor o conteúdo e as habilidades. Correntes historiográficas, relativismos metodológicos e discussão sobre provas e verdade devem perpassar continuamente a exploração dos itens do programa.

Mas, como dizíamos no parágrafo primeiro, a fórmula perfeita para uma prova que lê todos os conteúdos a partir das humanidades está muito distante.

Antonio Luiz de Souza é professor do Colégio e Curso WR