Um novo olhar sobre Machado
Um novo olhar sobre Machado (Diário da Manhã, 23/07/2008)
Lorena Lázaro, Da editoria do DMRevista
Machado de Assis, considerado um dos maiores escritores brasileiros, ganha mais uma homenagem no ano do centenário de sua morte (1908). O conto A Cartomante, famoso triângulo amoroso que se passa no Rio de Janeiro, tem agora edição especial com fotos do Rio antigo, complementadas com desenhos ilustrativos que incrementam a história. Quem encarou o desafio de produzir os desenhos foi o designer gráfico, professor e ex-ilustrador do DM Flávio Pessoa. Em parceria com Maurício Dias, na roteirização do projeto, eles lançam um novo olhar sobre Machado de Assis com a obra, que será lançada hoje, no Rio, pela editora Zahar.
Carioca, com pé em Goiás, Flávio morou na Capital de 2003 a 2007 e, além de dar aulas na Universidade Federal de Goiás, trabalhou como ilustrador no DM durante nove meses, entre dezembro de 2003 e setembro de 2004. Foi aqui, em terras goianas, que o projeto de A Cartomante começou. “No início era para ser alguns contos de Machado de Assis e A Cartomante estava entre eles. Foi criando ritmo e ficando muito legal. A obra já era de domínio público, então fechamos somente com essa história”, explica.
Pessoa conta que, ao todo, o processo de criação durou dois anos. “Primeiro, recebi o convite da editora. Só para a produção dos desenhos foram seis meses. Cada foto foi feita isolada, como bonequinhos recortados, diferente dos quadrinhos tradicionais, que trazem a página inteira pronta. Depois vieram a edição, impressão...” Quanto ao convite, o desenhista explica que já havia feito ilustrações em quadrinhos de histórias da série A vida como ela é, de Nelson Rodrigues. A editora conheceu o trabalho do artista e ele foi escolhido para participar da releitura de Machado de Assis. Na época, Flávio ainda morava em Goiânia, mas já pensava em voltar à cidade maravilhosa. “O novo trabalho veio em boa hora.” Mas, segundo ele, os desenhos foram produzidos aqui na Capital.
Imagens
Além de comemorar o centenário de Machado de Assis, o livro ilustrado tem também o objetivo de despertar no público adolescente maior interesse pela literatura clássica brasileira. “Eu mesmo, aos 16 anos, não lia muito Machado, só fui me interessar por sua obra depois de adulto”, relembra. Ele justifica o “desinteresse” jovem por esse tipo de leitura pela dificuldade de entender o autor. Outro agravante para a situação esquecida dos livros que menciona é que, hoje, com a internet por exemplo, os jovens têm uma identidade visual muito forte e os livros não oferecem a quantidade de imagens a que estão acostumados. “Tentamos levar esse mundo cheio de imagens para dentro do livro e também levar o livro para dentro do mundo das imagens”, conjectura Flávio. Para ele, essa obra pode ainda servir como incentivo para retomada do hábito da leitura, que está cada dia menos freqüente. Isso porque as ilustrações servem como um atrativo que os livros antigos não têm.
Para o desenhista, o trabalho foi muito satisfatório, pois, além de já conhecer a obra, teve ainda a sorte de “pegar” uma fase realista de Machado de Assis, para ele, a mais intensa do autor.
A história
A Cartomante conta a história de um triângulo amoroso que acontece entre a esposa e o melhor amigo do marido. Paixão, traição e adultério fazem parte da trama, que tem, claro, uma cartomante como personagem-chave da história. O conto foi publicado originalmente em 1884, e esta versão em quadrinhos tenta alcançar a adaptação fiel ao espírito do original da obra. A ilustração é feita sobre fotos do Rio do século XIX, de importantes fotógrafos da época, como Marc Ferrez e Augusto Malta, que levam o leitor às mais belas paisagens da cidade.
Cada página do livro traz uma fotografia do Rio antigo e nela uma ilustração. Nos desenhos, Flávio usou aquarela e, nos contornos, nanquin (tinta preta). As páginas dão um tom de nostalgia com toque de alegria; misturam o preto e o branco das fotos antigas com as cores utilizadas por Flávio. Segundo ele, o livro tenta refazer o trajeto que Machado de Assis percorreu na cidade. “Ele menciona ruas e casas. Tentamos recriar esses locais com as fotografias.” O tom lúdico fica por conta dos desenhos.
Para ajudar na divulgação, a editora lançou também uma série de cartões-postais com as imagens que compõem o livro.
Flávio Pessoa já tem planos para o futuro: fazer uma retrospectiva da história do Brasil dos anos 50, com ilustrações e quadrinhos dos principais a-contecimentos. “Do suicídio de Getúlio à construção de Brasília; as histórias do samba e da bossa nova e dois momentos marcantes no futebol, a decepção da Copa de 1950 e a conquista do título em 1958”, diz.