Máfia das monografias age solto na internet

Máfia das monografias age solto na internet (Jornal Hoje, 25/07/2008)

Marjorie Avelar

Um universitário desesperado com o final do curso superior, sem tempo para fazer a monografia, porque trabalha o dia todo ou porque paga pelo curso na universidade e quer fazer o mesmo para receber logo o diploma. Esse é o perfil dos estudantes que procuram pelo trabalho de R.D., 30 anos, formada pela Universidade Católica de Goiás. Entre outros ganhos como free-lancer, uma de suas maiores rendas é com a produção de monografias.

E o negócio é bem lucrativo, até mesmo porque existe boa demanda. “Tenho clientes de universidades públicas e privadas, mas predominam os de faculdades particulares”, apontou R., que cobra de R$ 1 a R$ 1,30 por página. “Em geral, os preços da monografia pronta variam entre R$ 500 e R$ 1,5 mil. Se for um trabalho de cem páginas, eu o entrego dentro de dois ou três meses. Se for menor, em um mês e meio”, informou.

Para encontrar pessoas que oferecem esse tipo de serviço, basta acessar a internet em sites comuns ou no próprio Orkut. Muitas fazem propagandas de verdadeiras empresas especializadas no assunto e até oferecem pagamentos por meio de cartão de crédito. Os preços podem variar entre R$ 400 e R$ 2 mil, dependendo do tema, da complexidade, do número de páginas, entre outros aspectos.

Na opinião de R., a maioria das pessoas que a procura quer, implicitamente, comprar o diploma. Associada à desatenção do orientador da monografia, elas conseguem driblar a bancada, já que atualmente o mercado oferece trabalhos exclusivos, sem o risco de serem apontados como plagiados. “Das 15 monografias que já fiz, nenhum aluno foi reprovado ou pego pela banca”, garantiu.

Ela, inclusive, ensina passo a passo de tudo que escreveu para que o universitário não dê vexame na hora de defender a monografia. E ainda revelou que chega a entrar em contato com professores, quando eles apontam alguma falha inicial em “seu texto”. “Eu me identifico como uma pessoa que está orientando o aluno, por fora, e cobro explicações dos professores. Muitos deles sabem que isso não é verdade, por isso fingem acreditar que sou apenas uma conselheira”, salientou R.

Ex-professor de Matemática da Universidade Federal de Goiás, Júlio César Ferreira já flagrou um formando que pagou pela monografia. “Bastou copiar e colar frases do trabalho dele, na internet, para logo identificarmos o plágio”, lembra. Mesmo sabendo que se trata de um crime – de falsificação, por assinar um trabalho que não foi feito pelo universitário, ou até plágio, no caso por violação de direitos autorais –, a maioria das instituições de ensino superior acaba concedendo uma segunda chance ao aluno. No episódio do flagrante, Ferreira contou que o rapaz foi notificado pela UFG, mas acabou conseguindo se formar. “Colocamos a banca inteira em cima dele para orientá-lo. Ele fez a monografia e concluiu o curso de Matemática”, disse.


PRÁTICA FACILITADA POR DESCASO DE PROFESSOR

Para Ferreira, esse tipo de comércio é alimentado também pela falha que vem do próprio orientador da monografia. “Muitos estudantes tentam justificar o ato, dizendo que trabalham o dia todo, mas isso não é desculpa. Além do mais, casos como este ainda revelam o desinteresse do orientador”, acredita. “Se houvesse dedicação deste professor, nenhum aluno conseguiria chegar a uma banca sem ter feito a própria monografia”, reforçou.

No começo, R. se sentia mal pelo fato de que aquele universitário, que está comprando um trabalho feito por ela, não seria um bom profissional no futuro. Mas rapidamente esse sentimento foi embora. “Se ele será um mau profissional, também será um concorrente a menos para mim. E quanto mais trabalhos eu faço, mais conhecimento adquiro”, ressaltou ela, revelando-se uma apaixonada pela leitura.

Presidente do Conselho Estadual de Educação, Marcos Elias Moreira acredita que no País existe uma cultura da compra de certificação ou do diploma. “O conhecimento, nestes casos, tem pouco valor. O que vale é o papel do diploma”, analisou. Para ele, que também é professor de Sociologia da Educação da Universidade Estadual de Goiás, a produção paga pode ser facilmente reconhecida. “Quem acompanha o aluno desde os primeiros anos da faculdade conhece bem sua condição intelectual”, afirmou.

Questionado sobre o comércio das monografias, a assessoria de comunicação do Ministério da Educação (MEC), em Brasília, disse apenas que o órgão não comenta sobre o assunto, porque isso “se trata de um crime, um caso de polícia”.