Dr. Aldemar de Andrade Câmara: do bisturi ao desenvolvimento da pecuária em Goiás

Dr. Aldemar de Andrade Câmara: do bisturi ao desenvolvimento da pecuária em Goiás (Diário da Manhã, 08/08/2008)

O meu ofício de biógrafo (bisbilhoteiro de vidas) tem me proporcionando um enriquecimento existencial fantástico, como é o caso da biografia, ainda inédita, do Dr. Aldemar de Andrade Câmara.

Filho de João de Andrade Câmara e Cândida Mendes, Aldemar nasceu em Montes Claros, a mais importante cidade do norte de Minas Gerais, no dia 20 de novembro de 1913, vizinho às casas de José Mendes Júnior, fundador da empresa Mendes Júnior, e do memorável educador Darcy Ribeiro, cujas famílias eram bastante amigas.

Quando foi para Belo Horizonte estudar no tradicional Colégio Arnaldo, teve contato e fez parte da comissão que implantava o Esperanto na capital mineira. Dominando o Esperanto, logo assumiu a presidência do Clube dos Jovens Esperantistas de Belo Horizonte.

Ocupando essa função diretiva recebeu a missão de procurar o futuro imortal da Academia Brasileira de Letras e um dos ícones da literatura da língua portuguesa, hoje admirado em todo mundo, o escritor João Guimarães Rosa. O escritor, que escreveria o antológico Grande Sertão: Veredas era notabilizado pela sua facilidade de deter o conhecimento de vários idiomas. O clube de Esperanto, para melhor difundir seus propósitos de uma língua auxiliar universal, carecia ter entre seus adeptos pessoas notáveis como Guimarães Rosa.

Muito bem recebido pelo seu futuro colega médico que havia acabado de se formar na Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, Aldemar pergunta a Guimarães Rosa:

O senhor conhece o Esperanto?

Não conheço. Mas se você trouxer seus livros de gramática, dentro de um mês, garanto-lhe que estarei também falando o Esperanto.

Dito e feito. Aldemar levou-lhe alguns livros que versavam sobre a gramática do Esperanto, e no prazo determinado por ele, o escritor estava falando fluentemente o Esperanto.

Em dezembro de 1938, Aldemar graduou-se em Medicina, pela Faculdade de Medicina de Belo Horizonte, tendo como colegas os goianos Francisco da Cunha Bastos e José Peixoto da Silveira, os dois bastante conhecidos da crônica médica e política de Goiás.

Depois de uma curta temporada exercendo a profissão na cidade de Poxoréu (MT), desembarca em Goiânia, no mês de janeiro de 1940, a convite do irmão engenheiro Aníbal de Andrade Câmara, para trabalhar como médico sanitarista na construção do prédio da Escola Técnica Federal que estava sendo erguido para as comemorações do Batismo Cultural de Goiânia, arquitetado por Joaquim Câmara Filho e regido pelo interventor Pedro Ludovico Teixeira.

Paixão à primeira vista, logo se casa com Leila Borges Cruvinel, filha de Belarmino Cruvinel e Alice Borges Cruvinel.

Médico particular de Pedro Ludovico Teixeira e protagonista do primeiro e único parto realizado no Palácio das Esmeraldas, trouxe ao mundo Mauro Borges Teixeira Júnior, no ano de 1944, filho de Mauro Borges Teixeira e Lourdes Estivallet Teixeira. Foi também o médico-legista do jornalista Haroldo Gurgel assassinado covardemente em Goiânia, no dia 8 de agosto de 1953, às 11 horas da manhã.

Dr. Aldemar faz parte da história médica de Goiás. Ao longo de várias décadas, no exercício da sua profissão, foi médico adjunto do Centro de Saúde de Goiânia; diretor da Divisão Técnica da Diretoria Geral de Saúde; presidente da Comissão Estadual de Fiscalização de Entorpecentes do Estado de Goiás; diretor-geral de Saúde (cargo, hoje, equivalente a secretário estadual de Saúde); professor-fundador da Faculdade de Farmácia e Odontologia de Goiás; professor de Medicina Legal da Faculdade de Direito de Goiás, sucedendo o colega e o político Vasco dos Reis Gonçalves; professor-fundador da Universidade Federal de Goiás; professor-fundador da Escola de Enfermagem do Hospital São Vicente de Paula (Santa Casa); chefe da equipe de cirurgia da Santa Casa de Goiânia; chefe do departamento regional médico do Sesi; sócio-fundador do Hospital São Lucas; co-fundador da Associação Médica de Goiás; co-fundador do Conselho Regional de Medicina de Goiás.

Como pecuarista, foi pioneiro na criação do cavalo mangalarga marchador em Goiás, e um dos mentores da fundação da Associação Goiana de Criadores de Zebu. Integrou a diretoria da SGPA, em doze diferentes diretorias.

Recebeu do setor educacional universitário, do segmento pecuário (goiano e mineiro), das entidades médicas e do poder legislativo, assentados em Goiás, as mais importantes homenagens.

Os originais da sua biografia já estavam prontos, bem como o local do lançamento do livro, que ocorreria na sede Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura, quando na manhã de 23 de dezembro de 2006, Dr. Aldemar nos deixou parcialmente. Ficou a sua rica história familiar e profissional, povoando as 140 páginas do livro, que será lançado pela sua família ainda neste semestre, um belo presente à memória médica e pecuária de Goiás.


Ubirajara Galli é escritor. Membro da Academia Goiana de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás