Para Goiás não esquecer

Para Goiás não esquecer (Diário da Manhã, 26/08/2008)

Relatos sobre as marcas da violência de quem lutou pelo fim da ditadura no Estado goiano agora estão registrados na história. Será lançado hoje, às 16 horas, no Salão Henrique Santillo, da Assembléia Legislativa do Estado de Goiás (Alego), o livro A Ditadura Militar em Goiás: Depoimentos para História (Kelps Editora, 182 páginas).
A obra, que será distribuída gratuitamente, é uma iniciativa da Comissão de Direitos Humanos da Alego. A organização dos textos é do jornalista e advogado Antônio Pinheiro Salles, 73.
A idéia do livro surgiu em uma audiência pública ocorrida em janeiro deste ano, na qual a Comissão de Direitos Humanos se reuniu com a Associação dos Anistiados Políticos de Goiás. Na época, Pinheiro Salles, como é mais conhecido, sugeriu a proposta, que foi prontamente aceita pela casa parlamentar.
O jornalista diz que o principal objetivo do livro é trazer à tona, por meio de denúncia, as atrocidades do período, para que se recupere a memória dos militantes, que já está esquecida, e no futuro sirva de ferramenta para construção de um País mais justo.
A Ditadura Militar em Goiás: Depoimentos para História traz à luz 28 depoimentos de militantes políticos (entre estudantes, camponeses, sindicalistas e parlamentares), perseguidos, presos e humilhados pelo governo militar em 1964. “São relatos emocionantes, e às vezes escabrosos. Essa experiência não pode ser esquecida. As pessoas estão morrendo e elas precisam ser lembradas”, enfatiza Pinheiro Salles, ele próprio um dos personagens que narram a experiência durante a repressão.

TRAUMAS
A obra deixa claro que as perseguições políticas não se limitaram apenas aos grandes centros do Brasil, como nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. O assunto ainda causa polêmica e para alguns depoentes as lembranças causam dor. Das cinco personagens procuradas pelo DMRevista, três se negaram a atender à reportagem. “O que tinha para falar está no livro. Prefiro não tocar mais no assunto; já dei minha contribuição”, sentencia o procurador Maurício Samuel Zaccariotti, 70, que, como líder estudantil, foi indiciado criminalmente por atividades subversivas contra a Universidade Federal de Goiás (UFG), local onde estudava.
A dona de casa Dirce Machado Silva, 78, acha que falar do passado é uma forma de a nova geração se inteirar sobre a luta destes militantes. A história dela não é muito diferente das demais. Ela e o marido, José Ribeiro da Silva, 40, eram camponeses na cidade de Formoso e lutavam pelo direito da terra aos posseiros da região. Em determinado momento, o casal teve de fugir, separadamente, deixando para trás a filha de seis meses aos cuidados da mãe.
Após quatro meses na clandestinidade, Dirce reencontrou o marido, mas foram presos e submetidos a sucessivas cenas de violência, cometidas inclusive contra familiares do casal.

PERDAS
A professora de História da Educação, a mineira Walderês Nunes Loureiro, 62, afirma que “a insatisfação com o presente e a utopia de um futuro melhor e mais justo para os oprimidos foram sempre o fio condutor que permeia minha vida”.
O ideal, porém, custou caro para a professora, que perdeu muito cedo o marido, Antônio da Fonseca, numa emboscada, entre as fugas e perseguições que sofreu durante os anos de chumbo.
Em 1974, depois de cumprir pena de um ano e meio na prisão, Walderês tentou retomar a vida profissional, mas, acusada de subversiva, perdeu o cargo de professora no Estado mineiro. Em 1975, mudou-se para Goiânia e três anos depois ingressou na Universidade Federal de Goiás, porém, todo o passado de militância política fora investigado e ela continuava a ser perseguida. Por sorte, a burocracia vigente protelou tanto a resposta sobre sua admissão que acabou chegando o tão sonhado fim da ditadura, em 1979. Walderês então foi anistiada e sua demissão, impedida.

O quê: Lançamento do livro A Ditadura Militar em Goiás: Depoimentos para História
Quando: Hoje, às 16 horas, na Assembléia Legislativa (Alameda dos Buritis, 231, Centro)
Organização: Antônio Pinheiro Salles
Páginas: 182
Lançamento: Kelps Editora
Distribuição: Gratuita, pela Comissão de Direitos Humanos