Desertificação avança no Araguaia

Desertificação avança no Araguaia (Diário da Manhã, 01/08/2008)

Atividades agropecuárias, retirada irresponsável de vegetação nativa do bioma Cerrado e assoreamento desenham o quadro da desertificação do Rio Araguaia. Mais grave é que em toda a extensão do manancial já é possível perceber a degradação provocada pela ação humana. Entre as principais agressões estão as voçorocas, resultantes do desmatamento, e a redução do volume de água em decorrência da construção de açudes e represas artificiais.

Pesquisa conduzida pela professora Rosane Amaral Alves da Silva, do Instituto de Estudos Sócio-Ambientais, da Universidade Federal de Goiás (Iesa-UFG), mostra que na região das nascentes do Araguaia há locais em processo de desertificação. As nascentes do rio estão na região do Parque Nacional das Emas, entre os municípios de Mineiros, Alto Taquari, Araguainha e Alto Araguaia. Compreendem área de 1,5 mil km², sendo que 0,5%, que equivale a 603 hectares, já está em desertificação.

O estudo, concluído com base em pesquisa de trabalhos realizados entre as décadas de 1960 e 1990, verificou o quantitativo de areais existentes na área, quando surgiram e a relação com o uso e ocupação do solo. Em 1960 e 1970 não havia registros de areais na área. A partir de 1980, os bancos de areia começam a surgir, mesma época em que o uso do solo para pastoreio, agricultura e monocultura de soja se intensificam. Esse processo acelerou o desmatamento, assoreamento e o conseqüente aparecimento de voçorocas.

Áreas desertificadas apresentam camadas de areia solta de pelo menos 10 centímetros, onde plantas não se fixam nem conseguem sugar nutrientes do solo. Mas o processo de desertificação não pode ser confundido com deserto. Para que a região das nascentes do Rio Araguaia se torne deserta é preciso também que haja mudança gradativa no clima.

Isso só poderia acontecer caso houvesse catástrofe ambiental, já que no local chove regularmente 1,5 mil milímetros, anualmente, e existem plantas do bioma. Contudo, 60% da área está suscetível à desertificação, número que pode chegar a 90%, caso não sejam tomadas medidas que inibam a ação humana irresponsável.

A professora salienta que é necessário estimular a preservação das Áreas de Proteção Permanente (APP), conservar matas ciliares, realizar o manejo adequado do solo. As ações incluem estudos sobre qual o tipo de planta é mais indicado para o local, plantar de acordo com curvas de nível do rio, que evitam erosões e realizar o escoamento superficial da água.

Desmatamento
Em todo o curso superior do Araguaia, que abrange municípios como Barra do Garças (MT), Alto Araguaia e Baliza, é observada a ocupação por sistemas agropastoris, resultando em alto índice de desmatamentos. A extração ilegal da vegetação nativa do Cerrado dá espaço também à construção de represas que servem para irrigar pastos e alimentar o gado. Com a retirada indiscriminada da vegetação, os sedimentos são levados ao leito do rio, acelerando o processo de desertificação e conseqüente desaparecimento do Araguaia.

A conclusão é do professor-doutor Altair Sales Barbosa, do Instituto do Trópico Subúmido da Universidade Católica de Goiás (ITS-UCG). “Se permanecer o atual modelo econômico, o Rio Araguaia vai secar em breve.” Outra agravante é que projetos de irrigação por meio de canais construídos nas laterais do rio contribuem para a diminuição gradativa do nível do volume de água. Atualmente, os canais, responsáveis por abastecer com água do rio as represas artificiais, podem ser encontrados em quase toda a extensão do Araguaia. Vão desde o município de São Miguel do Araguaia até o Bico do Papagaio, no Estado do Tocantins.

Embora não existam estudos para medir a diminuição por evaporação do volume das águas de rios brasileiros, Barbosa assegura que o Araguaia perde em profundidade até 20 metros, anualmente. A degradação acelerada é decorrente da irresponsabilidade no trato das questões ambientais, especialmente no que diz respeito a coibir a ação de grandes capitalistas que se instalam na região.

O pesquisador diz que tanto a irrigação lateral (por meio de canais artificiais que alimentam represas e diques) como a irrigação por aspersão (mecanizada por meio de pivôs) representam flagrante agressão ao Rio.