Progresso derruba até 45% do cerrado
“Progresso” derruba até 45% do cerrado (Jornal Hoje, 26/09/2008)
Bruna Mastrella
Criação de pastagens, expansão das fronteiras agrícolas, e pavimentação de rodovias são apontadas como as principais causas da devastação de aproximadamente 45% do Cerrado existente no País. A perda dessa camada vegetal é equivalente a 16 vezes o tamanho do município do Rio de Janeiro. Em Goiás, a produção de carvão vegetal dá à cidade de Niquelândia a liderança do índice de depredação.
As constatações estão presentes no livro A Encruzilhada Socioambiental: Biodiversidade, Economia e Sustentabilidade do Cerrado, do professor Laerte Guimarães Ferreira, da Universidade Federal de Goiás (UFG). Lançada ontem durante a vinda do ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, a Goiânia, a obra se baseia em mapas produzidos pelo Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig) que, por meio do Sistema Integrado de Alerta de Desmatamento (Siad), também elaborado pela UFG, detectava qualquer processo supostamente ligado à perda de camada vegetal.
Realizado entre os anos de 2003 e 2007, o estudo considerou os processos de modificação nos mais de 2 milhões de quilômetros quadrados existes de Cerrado em todo o território nacional. As estimativas apontam para a perda de 40% a 45% do bioma nos últimos 40 anos. Para o professor Laerte Guimarães, se levarmos em conta os níveis de desenvolvimento humano, social e econômico conquistado, o dado é preocupante. “É muita mudança e impactos climáticos e hídricos para tão pouco tempo”, argumenta.
CONSERVAÇÃO NÃO IMPEDE AVANÇO
Ao todo, os quatro anos de monitoramento apontaram 18,9 mil quilômetros quadrados como área de alerta por terem sofrido possíveis desmatamentos. A maior parte dessa área está presente nas regiões mais pobres dos Estados do Mato Grosso, Bahia e Piauí. Niquelândia, a 370 quilômetros de Goiânia, aparece em 46º lugar no ranking das 50 cidades brasileiras que concentram 60% dos maiores níveis de desmatamento, com 112 quilômetros quadrados considerados como área de alerta especialmente por causa do uso excessivo de carvão vegetal. As regiões mais atingidas coincidem com as maiores fronteiras agrícolas e as principais malhas rodoviárias.
Considerado um dos recortes mais abrangentes sobre a situação do Cerrado no País, o levantamento cria condições de o governo traçar metas de crescimento sem agredir o ecossistema. Muito mais que aspectos estatísticos, Laerte Ferreira acrescenta que ele dá condições para que os governos tracem prognósticos para o futuro. “Podemos refletir sobre que forma de desenvolvimento nós queremos daqui para frente”, explica. Para ele, não há dúvidas de que é perfeitamente possível conciliar progresso socioeconômico com conservação ambiental.
A solução, observa, passa necessariamente por alternativas econômicas de estímulo à preservação, como benefícios fiscais para quem optar por práticas de produção sustentáveis e pela geração de créditos de carbono, para que o Cerrado seja mais conservado, e não desmatado. O primeiro passo para isso foi dado ontem. Um Acordo de Cooperação Técnica foi assinado pelo ministro Carlos Minc, Ibama, UFG e organizações não-governamentais. O objetivo é criar o Fundo do Cerrado para garantir atividades sustentáveis no bioma e dar continuidade a estudos como estes, mas com metodologias cada vez mais aperfeiçoadas.