Festival de festivais

Festival de festivais (Diário da Manhã, 04/11/2008)

Rafael Ventuna

Goiânia vive um momento de pujança na cena cultural. Evidentemente, ainda há carência de políticas públicas afirmativas e persiste a tímida participação das empresas como patrocinadoras. Mas o que não falta para o goianiense são opções, que está tendo a árdua tarefa de decidir "aonde não ir" ou "o que não ver". O calendário de festivais goianos para o ano de 2008 ressalta duas problemáticas sociais: a inviabilidade de participação do público e a falta de diálogo entre realizadores.

A condição de existência das manifestações e da realização de eventos é a garantia de que há um público interessado em participar das atividades propostas. Assim, o público também precisa ser encarado como um coletivo de pessoas que tem inúmeras outras ocupações. Além do mais, é necessário ponderar que essas mesmas pessoas arcam com gastos diversos (deslocamento, alimentação, etc.). Desta maneira, qualquer justificativa invalida o argumento de que é possível acompanhar simultaneamente dois eventos ou mais. Do contrário, opta-se, então, por desejar um público espontâneo em detrimento do público cativo.

Neste mês de novembro, vê-se o choque da programação de eventos de grande projeção. Isso revela que os realizadores não estão dialogando sobre o calendário anual da cidade. Embora os festivais contemplem temáticas e linguagens diversificadas, eles recaem sobre o mesmo campo: o cultural. Daí, voltamos a discutir sobre a problemática do público. Em parte, a imprensa tem culpa nisso. Porque deveria promover um elo entre realizadores e público. Mas também acaba por ser vitimizada e não consegue dar cobertura adequada, porque isso exige o consumo de mais papel e mais tempo na TV e no rádio. Todos entram em disputa por público e espaço na mídia. A verba ou patrocínio é outro fator que dificulta a definição de um calendário anual. As comissões organizadoras levam até o último momento à escolha das datas, devido à dependência que elas têm do financiamento externo, e, em muitos casos, boa parte do dinheiro chega após o término do evento.

O Dia D (ou F?)
Após o término do Goiânia Mostra Curtas, no dia 12 de outubro, quem sabia o que vinha pela frente tratou de tomar fôlego e recarregar as baterias. O Festival Goiânia em Cena, que começou no último dia 24, conta na sua programação 12 dias com espetáculos, debates e oficinas, terminando amanhã, dia 4 de novembro. E é justamente no dia 4 que iniciam dois outros aguardados festivais: o Festival de Artes de Goiás e o Perro Loco.

O Festival de Artes de Goiás está em sua nona edição e vai ser realizado em uma versão compacta. Serão quatro dias, de hoje a 7 de novembro. As atividades serão desenvolvidas no Centro Federal de Educação Tecnológica de Goiás, o Cefet-GO, onde serão apresentados espetáculos de teatro, dança e música. O Festival de Artes, como é conhecido, reúne em si a sobreposição de programações. Ao mesmo tempo, o Cefet também realiza o 8º Seminário de Educação Estética, o 2º Encontro de Filosofia e o 1º Fórum de Professores de Arte da Rede Federal Tecnológica. E ainda oferece palestras, oficinas e minicursos.

Com uma elogiada repercussão e correta execução em 2007, o Perro Loco - Festival de Cinema Universitário Latino-americano realiza a sua segunda edição de 4 a 9 de novembro. Nascido como uma iniciativa de alunos da Faculdade de Comunicação e Biblioteconomia da Universidade Federal de Goiás, o evento exibe obras audiovisuais elaboradas por estudantes universitários de diversos Estados brasileiros e outros países. Também oferece oficinas e debates com os realizadores. O Perro Loco tem viabilizado o seu projeto de expansão para que o evento seja um lugar para manifestações multiculturais e, igualmente, inclui apresentações de dança, teatro e música.

Depois do boom imobiliário
Todo este fenômeno está ligado às mudanças que ocorrem na capital goiana. Apontada como um dos principais centros de consumo no País, a cidade tem atraído investimentos externos, ocasionando o crescimento da população e aumento da geração de renda. Outro fator, Goiânia é considerada uma cidade universitária, que define o perfil da escolaridade do goianiense.

Durante o ano é possível ver como os festivais estão sendo freqüentados. A começar pelos que têm sede no Centro Cultural Martim Cererê, que geralmente envolvem os ouvintes da chamada música alternativa. Além dos eventos, na cidade também estão em cartaz atividades permanentes.

O Centro Municipal de Cultura Goiânia Ouro é um ponto de referência já consolidado, pelos seus projetos de curto e longo prazos, como a sessão de jazz das sextas. O diretor Carlos Brandão, ao lado de Marci Dornelas, Itamar Borges e equipe, tem tomado os devidos cuidados para que o Teatro e o Cinema do Goiânia Ouro tenham uma programação ininterrupta, de segunda a domingo.

Em uma das mais belas mobilizações já vistas na cidade, o projeto Grande Hotel revive o Choro necessitou até do fechamento de uma das principais avenidas da cidade. A coordenadora do projeto, a jornalista Marley Costa Leite, conseguiu reunir no mesmo evento música de boa qualidade, valorização da música popular instrumental brasileira e as conveniências de um happy hour. Não deu outra: sucesso de público entre jovens e adultos.

Após a franca expansão do setor imobiliário, resta ao setor empresarial se sensibilizar para investir no mercado cultural. Opções de investimento não faltam. E quanto ao público, há quanto tempo mesmo estou na fila da bilheteria?

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Novembro