Hábitos saudáveis longe do cotidiano
Hábitos saudáveis longe do cotidiano (Jornal Hoje, 16/11/2008)
Bruna Mastrella
Apesar de simples, relativamente baratos e altamente benéficos e eficazes, hábitos de vida mais saudáveis ainda estão longe de incorporar o cotidiano de muitos brasileiros. É o que constata a mais recente pesquisa divulgada pelo Ministério da Saúde, que aponta a liderança e expansão do número de mortes diretamente causadas pelas chamadas doenças crônico-degenerativas, como acidente vascular cerebral (AVC), enfartes e hipertensão, todas bastante influenciadas pelo estilo de vida.
O estudo Saúde Brasil 2007 foi feito com base em registros do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), que reúne dados sobre todos os óbitos registrados em 2005 no Brasil. Conforme o levantamento, os brasileiros, tanto homens quanto mulheres, morrem mais de doenças circulatórias, especialmente o AVC; seguido de enfartes e outros problemas relacionados à hipertensão arterial. Logo atrás, está o câncer, que tem matado cada vez mais mulheres em idade fértil.
Além de preocupante pelo alto número de mortes causadas, a pesquisa também confirma que muitas vidas continuam sendo perdidas prematuramente. Das mais de um milhão de mortes registradas em 2005, 41% eram pessoas com menos de 60 anos. Apesar de bastante amplo, o levantamento não traz grandes novidades, afirma o cardiologista Paulo César Brandão Veiga Jardim, presidente da Liga de Hipertensão Arterial do Hospital das Clínicas. “Esse crescimento não é de agora. Há mais de 15 anos já era possível observar essa situação em Goiás e no restante do País”.
Embora a predisposição genética tenha um papel importante, são os modelos de vida que mais contribuem para essa grave realidade.
Alimentação rica em sal, açúcar e gordura, associada a hábitos como tabagismo, consumo excessivo de álcool, e falta de exercícios físicos regulares são apontados pelo médico, que também é professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), como elementos decisivos quando se fala em doença cardiovascular.
MULHERES
O problema, inclusive, tem crescido bastante entre as mulheres. Naturalmente protegidas até a menopausa, após esta etapa as chances de desenvolvimento de doenças circulatórias são parecidas com a dos homens. “A independência da mulher fez com que ela infelizmente adquirisse hábitos antes masculinos, entre eles o fumo e a bebida”, pontua Veiga Jardim. Porém, se o surgimento acelerado de novos casos reflete quase uma epidemia, a boa notícia é que opções terapêuticas estão disponíveis e são consideradas relativamente simples. O grande desafio, entretanto, é fazer com que esta solução seja abraçada por todos.
A nutricionista Estelamaris Tronco Monego, professora da Faculdade de Nutrição da UFG, explica que tanto o tratamento quanto a prevenção de doenças crônico-degenerativas passam pela modificação dos hábitos alimentares e introdução de alguma atividade física regular ao dia-a-dia. “Não é necessário cortar o sal e o açúcar da comida, mas sim reduzi-los. Frituras em excesso também devem ser evitadas, enquanto maior oferta de verduras e frutas é muito importante”, recomenda. Ela salienta, ainda, que essa mudança de comportamento não deve ser vista como uma punição ou sacrifício. “Mesmo porque alimentar-se bem e viver melhor não tem nada de sacrificante, pelo contrário. Ter hábitos melhores é um prazer”, ensina.
FAÇA SUA PARTE
– Dê preferência a alimentos naturais, com a menor quantidade de conservantes possível e maior teor de vitaminas e sais minerais.
– Beba muita água (2 litros por dia) e consuma frutas, carnes magras e verduras. Evite sal, excesso de açúcar e alimentos ricos em gordura
– Uma atividade física regular contribui para uma sensação de bem-estar, reforçando nossa capacidade de combater o estresse. Escolha aquela que você realmente goste de praticar com regularidade
– Inclua períodos de relaxamento em sua rotina
– Se for ingerir bebidas alcoólicas, não exagere
– Cigarro deve ser dispensado sempre.
Fonte: Ministério da Saúde
INICIATIVAS ENFATIZAM CUIDADOS COM CRIANÇAS
Coordenadora do programa HiperDia do Programa Saúde da Família do Setor Leste Universitário, a médica Uberone de Fátima Guimarães fala com entusiasmo que as alterações do estilo de vida promovem na vida de pacientes. Criado pelo MS para ser implantado na rede básica de saúde, a iniciativa pretende melhorar a qualidade de vida de portadores de hipertensão e diabetes, e prevenir o seu surgimento em outros. “As mudanças são nítidas. Após incluir a prática de atividades físicas e alimentação mais saudável, muitos pacientes relatam desde diminuição dos sintomas até melhorias emocionais”, pontua. Apesar da ênfase maior na saúde da terceira idade, Uberone explica que a média de idade das turmas é de 40 anos, ou seja, revela a precocidade com que as pessoas estão desenvolvendo problemas de saúde sérios.
Outras iniciativas atuam no tratamento e conscientização de jovens. É o caso da Liguinha de Hipertensão Arterial do Hospital das Clínicas da UFG. Criado há 11 anos, o programa orienta crianças e adolescentes com maiores chances de desenvolver doenças cardiovasculares, geralmente filhos ou netos de portadores já diagnosticados. Assim, muitos chegam com fatores de risco associados e, outros, com problemas detectados, como obesidade e diabetes. O sorriso largo no rosto da pequena Cinthya dos Santos, de apenas 8 anos, é permanente. Alegre e comunicativa, ela ainda não parece compreender as implicações que um problema que possui pode causar. Com 46 quilos, a garota está bem acima do peso indicado para alguém de sua idade. Ela é uma das 200 crianças acompanhadas atualmente pela equipe do HC. Cinthia também possui diversos casos de diabetes e de hipertensão na família.
Uma das coordenadoras da Liguinha, a nefropediatra Cláudia Salgado, explica que o grande objetivo é reduzir os riscos de aparecimento destas doenças nas crianças e, principalmente, preveni-las. Tudo isso é feito por uma equipe de médicos, enfermeiros e nutricionistas que acompanham a evolução do peso dos participantes (que quase sempre estão com sobrepeso), desenvolvem atividades educativas; estimulam a adoção de um estilo de vida saudável, e elaboram um material de referência para o controle e prevenção das doenças cardiovasculares. “Sabemos que a criança obesa de hoje pode ser o adulto também obeso e hipertenso de amanhã, por isso tão logo seja tratada, melhor”, destaca. Além disso, tudo é feito em parceria com os responsáveis dos menores, que também são advertidos a promoverem as alterações necessárias.