Escola de emoções
Entre as profissões com o maior índice de desgastes emocionais está a medicina; por isso mesmo, desde cedo os alunos aprendem a mergulhar na realidade da vida
Clenon Ferreira Estagiário convênio Tribuna/PUC-GO
O estresse emocional não ataca apenas pessoas maduras que levam uma vida atribulada em função do trabalho. O problema também pode devassar uma jovem alma. Para isso, basta estar no redemoinho das atividades modernas, do mundo cheio de cobranças, que vem de todos os lados, inclusive da escola.
Se esta escola for a de medicina, quanto mais cedo aprender a lidar com os desgastes emocionais, melhor para o futuro médico. Isso porque a profissão é uma das que mais exigem da pessoa como ser humano, por estar em meio ao sofrimento alheio. Mesmo assim, é um dos cursos mais procurados em qualquer vestibular do país.
De acordo com a Fundação Universitária para o Vestibular (Fuvest), medicina é o curso com maior número de inscritos há nove anos. "É preciso ficar atento, pois a profissão exige muito e quem não tem vocação não demora muito para perceber que fez a escolha errada", explica a doutora Ana.
Para a pediatra, o que falta para os jovens egressos são maturidade e humanização. “No início, eles não têm noção da importância do profissional da medicina. Os que não estão preparados levam um tremendo choque de realidade com cenas de compaixão ou sofrimento.”
Na residência, que é o período de treinamento após concluir a faculdade, a imersão no ambiente de dor e desespero já começa. Mas muitos alunos procuram entrar em contato com essa realidade bem mais cedo.
As faculdades de Medicina da Universidade Federal de Goias (UFG) e da Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, fornecem aos seus estudantes cursos relacionados à cidadania e responsabilidade social. O trabalho é simples: os professores levam seus alunos para trabalhar em organizações sociais, à exemplo de asilos e creches.
Preparados
A estudante da UFG, Joana Ferreira já está no quarto ano de faculdade. Ela diz que os trabalhos voluntários servem como instrumentos de humanização. Mesmo assim, o estresse emocional é muito grande. “O convívio diário com a dor e o sofrimento alheios são desconsoladores.”
“Trabalhei em algumas creches durante este ano. Conhecer crianças que trabalham pesado em semáforos e outras deixadas pelos pais é retrato de um país que precisa de ajuda. Os profissionais devem estar preparados para o estresse emocional do dia a dia médico”, ressalta.
Humanização
Os profissionais da CAJU (Casa da Juventude) promovem trabalhos sociais para jovens com o intuito de promover trabalhos de inclusão social. Segundo o coordenador executivo da organização, Paulo César Pereira, eles ajudam 300 pessoas. A ONG serve para humanizar os próprios funcionários.
“A casa está aberta de segunda a segunda. Nós ajudamos os jovens a se socializar melhor com a comunidade. Muitos dos alunos são de regiões periferias e sentem-se excluídos das partes centrais de Goiânia. É necessário ouvir muito e ter sabedoria de não se estressar emocionalmente”, explica.
A CAJU completa 27 anos, agora no dia 19 de outubro. O trabalho assistencialista reflete no cuidado que se deve ter na formação da juventude. “Um caso que me deixou desconsolado foi de um garoto que estava furtando dentro da Instituição. Entramos em contato com a nossa psicóloga, que orientou a criança.”
Trabalhar com jovens e tentar ajudá-los em determinadas formas é um trabalho árduo. Segundo Pereira, o profissional deve ter vocação, sabedoria e um bom diálogo. “Os jovens são violentados, maltratados pelo governo e em alguns casos pela família. Eles precisam ter espaço no lazer e na cultura. Nós como profissionais tentamos ao máximo ajudar.”
A Instituição fornece aulas de dança, teatro, informática e cidadania. Há psicólogos, voluntários, assistentes sociais e pesquisadores trabalhando incansavelmente para romper preconceitos. “É gratificante e desafiador trabalhar na CAJU. Apesar do estresse emocional, o valor da vida está acima de tudo.”