Presença literária de Nelly Alves de Almeida
Presença literária de Nelly Alves de Almeida (Diário da Manhã, 01/12/2008)
Wilton Vieira
Da Editoria de Esportes
Nesta manhã de festa e júbilo, pela presença marcante da Aflag, homenageamos uma das fundadoras desta importante entidade cultural de Goiás – e uma das mais entusiastas dentre suas integrantes. Em sua fecunda jornada literária, a escritora, professora e ensaísta Nelly Alves de Almeida teve um desempenho heróico, digno dos maiores louvores.
Dei a esta palestra o título “Presença literária de Nelly Alves de Almeida”, fazendo coro às homenagens que esta notável estudiosa fez a destacados escritores goianos. E o faço para destacar que, não obstante a cortina de silêncio colocada sobre seu trabalho, nada pode nublar os marcos de sua trajetória.
De professora de Filologia, por sua paixão e interesse em estudar os caminhos do verbo e da culta e bela língua portuguesa, passou a ensaísta, reconhecida e admirada fora de nossas fronteiras regionais. Entusiasta e participante acadêmica, integra os quadros da Academia Goiana de Letras. Foi co-fundadora da Academia Feminina de Letras e Artes de Goiás. Pertenceu aos Conselhos Estadual e Municipal de Cultura, e Academia de Filologia do Rio de Janeiro.
O ecletismo de sua personalidade criadora, no dizer de Nice Monteiro Daher, fez que sua capacidade de trabalho se estendesse aos campos da poesia, do conto e da crônica, ganhando destaque a sua produção ensaística, e da crítica, que fizeram dela o símbolo da mulher literária goiana, como Belkiss Spenciére o foi no campo da música erudita.
Embora isto seja um fato inegável, assinalado não só em Goiás, mas por parte de renomados filólogos e intelectuais brasileiros, como Antenor Nascentes, isto não vem sendo lembrado na medida justa e necessária. Não decorreu muito tempo, após seu falecimento, para ser percebível estar ocorrendo com sua obra e sua memória uma deslembrança bem típica de nosso Goyaz provinciano, padecente e sofredor de um complexo de inferioridade (ou de cachorro vira-latas), no dizer de Nelson Rodrigues, que nos faz sabotar a nós mesmos, ao aplaudir tão somente os que vêem de outros Estados, e aqui são recebidos como irmãos (o que é bom e necessário).
E o que vem sucedendo em relação à fecunda e produtiva jornada literária empreendida por Nelly Alves de Almeida? Em relação a seus livros e à sua vasta produção crítica publicada em jornais e revistas, caiu uma espécie de cortina de silêncio, um menoscabo não assumido, mas visível, mas explícito, que soa como menos valia – como se somente fosse digna de consideração e apreço a parca e rala crítica que vem das universidades, quase sempre a focar obras de autores de fora, e raramente voltada para a produção dos escritores brasileiros que vivem e trabalham em Goiás.
Pois chegamos ao absurdo de discriminarem a literatura goiana em departamentos de letras, como quando Carmo Bernardes foi excluído da lista de livros indicados para os concursos vestibulares, des-considerado como sendo “apenas um caipira”. A mim próprio já ocorreu ser vítima da intolerância da crítica universitária (se é que isto existe) em relação aos escritores goianos em geral.
Uma pessoa tentou habilitar-se ao mestrado apresentando um trabalho focando um de meus livros. Uma professora-crítica (aliás, de muito valor e competência) desaconselhou o candidato, sugerindo que ele procurasse um autor nacionalmente reconhecido, já com vasta produção crítica em torno de sua obra. Ora, senhoras e senhores: a caminharmos subjugados à lei do menor esforço, em que palhoça de provincianismo auto-imposto iremos parar?
Ao contrário de tal postura, Nelly Alves de Almeida foi uma intrépida e consciente defensora da boa literatura brasileira feita em Goiás. Não fazia distinção geográfica e nem buscava estudar autores já exaustivamente estudados, para desfrutar do falso conforto de limitar-se a citar e compilar, não tendo, em conseqüência, que estudá-los a fundo, como de fato o fez, como em sua alentada obra Estudos sobre Quatro Regionalistas. Trabalho de profunda investigação filológica que recebeu aplausos de eminentes autoridades desta área, bem como de renomados críticos literários brasileiros.
A franqueza e a coragem em expor sua visão de mundo, seus pontos de vista, são fato assinalados por Ana Braga, sua grande amiga, em livro-homenagem publicado quando ainda vivia esta notável intelectual goiana, nascida em Jaraguá. Ana Braga fala com ternura e amizade sobre esta “escafandrista do verbo”, referindo-se à sua importante obra Análises e conclusões como sendo fonte de pesquisa a estudiosos de nossos autores goianos, bem como de nossa história literária.
Ressalta Ana Braga sobre a obra Análises e Conclusões: “É um livro sério, feito com idealismo e sacrifício. É a própria autora quem o diz, no final de sua obra: “Assim busquei o mundo magnífico da palavra, que constrói e alimenta a fala, passando, depois, ao difícil roteiro da análise, demorando-me em alguns, no difícil caminho da pesquisa.”
Ana Braga enfatiza, mais adiante: “Podemos dizer, sem medo de errar, que nossa festejada escritora, consciente no manejo da pena, de há muito atingiu o que Par Lagerhinst, prêmio Nobel de Literatura (1951) proclama sobre a arte de escrever: “Ela é a força da consciência estética revelada na solução do tema; plenitude do símbolo de expressão e, afinal, construtividade!”
Um fato a assinalar, revelando, para conforto de nossa goianidade, o fato de não serem machistas os nossos varões intelectuais: a fundação da Aflag, que teve em Nelly Alves, Rosarita Fleury e Ana Braga os pilares idealizadores e construtores, contou com a presença estimuladora de muitos integrantes do dito sexo forte (algo a ser questionado, tendo-se em vista a inquestionável força e coragem das mulheres).
Assinala a acadêmica Ana Braga, em seu livro: “Foi assim que no dia 9 de novembro de 1969, no salão do sobrado, residência dos pais de Rosarita Fleury, nasceu a Aflag, sob a presença do dr. Jerônimo Geraldo de Queiroz, ex-reitor da Universidade Federal de Goiás, dr. Xavier de Almeida Júnior, Bariani Ortêncio, integrantes da AGL, e ainda do escritor Miguel Jorge, à época, presidente da UBE-GO. Da solenidade participaram também dr. Humberto Ludovico de Almeida, inseparável companheiro de Nelly, do economista Durval Teixeira, do engenheiro Jerônimo Augusto Curado Fleury, bem como de muitas outras presenças ilustres.”
Brasigóis Felício
Atual ocupante da Cadeira Número 25 na AGL