Essas mulheres vitoriosas
Essas mulheres vitoriosas (Diário da Manhã, 03/02/09)
Corria o ano de 1963, tempo em que o Instituto de Desenvolvimento Agrário de Goiás – Idago – estava instalado num galpão melhorado, na Rua 3, Centro, onde está edificado o Mercado Municipal; pois lá, na sede do Idago é que as jovens secretárias-datilógrafas Iris Araújo e Beatriz Avelino Araújo trabalharam sob as ordens do então secretário da presidência daquele instituto, o também jovem advogado Gercy Lino Bezerra Tocantins, hoje juiz de Direito aposentado.
Mas as duas secretárias-datilógrafas, muito bem-comportadas e eficientes nos serviços, após as 18 horas, eram as namoradas que cativaram Iris Rezende Machado e este modesto escriba, sendo que Iris Araújo e seu xará masculino formavam o par melhor assistido, pois o também jovem deputado estadual Iris Rezende possuía um automóvel, um Ford 1935 ou 1938, que nunca pegava na partida quando o Iris ia buscar a Iris na saída do trabalho, mas todos nós dávamos uma mãozinha para fazer o carro pegar no tranco. De minha parte, Beatriz sempre tinha coragem de ser transportada no banco do passageiro da minha histórica lambreta, livres para ter o vento acariciando nossas faces e a alma cheia de esperanças.
No ano seguinte, Beatriz passou a ter Neder no seu nome após o nosso casamento, que já completou 45 anos. Iris Araújo tornou-se senhora de Iris Rezende Machado; cada casal seguiu o seu destino, apesar dos laços de amizade sendo alimentados em visitas em certas ocasiões, até que outra vez nossas relações se estreitaram, quando Beatriz e eu fomos jogados no olha da rua pela Revolução de 1964 e Iris Rezende Machado foi cassado pela mesma dita-cuja revolução. A solidariedade nos uniu para que a desesperança não fosse o norte sem a amargura das injustiças que toldavam nossos horizontes.
O tempo passou, Beatriz fez brilhante curso de Direito da Universidade Federal de Goiás, dirigiu a Diretoria do Fórum de Goiânia e secretariou Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça de Goiás, mas com a minha aposentadoria, deixou o serviço público e veio advogar ao meu lado, tornando-se a lutadora imbatível no Tribunal do Júri, cujas defesas feitas com amor à causa fizeram dela a oradora inflamada, intransigente na defesa dos direitos de seus constituintes, ao ponto de, certa vez, haver aparteado o ministro Galotti, do Supremo Tribunal Federal, quando o ministro disse que a prisão do réu que Beatriz defendia estava bem na cadeia, comendo e dormindo sob a proteção do Estado... Foi aí que Beatriz atravessou o aparte, dizendo: “Sr. ministro, aquilo onde o meu constituinte está confinado, não é cadeia, é a sucursal do inferno!” E a vida nos uniu e nos fez mais fortes quando a vinda do nosso filho Alex Neder tornou nosso escritório conhecido como “trio parada dura”, popularizando nossas atuações em julgamentos memoráveis no Tribunal do Júri.
Iris Araújo escolheu o caminho da política para brilhar com a força do seu talento, da sua perseverança e da capacidade de ser companheira à altura de um homem que fez a mais rica trajetória política de Goiás, através do voto, vencendo todas as adversidades, indo aos postos de ministros de Estado para trabalhar nos caminhos do País em desenvolvimento.
Iris Araújo teve na campanha das Diretas Já papel relevante de organização do monumental comício na Praça Cívica Pedro Ludovico Teixeira, afirmando a vontade política respaldada na presença extraordinária do povo na praça, o poder legítimo na democracia. Ao enfrentar a eleição, como candidata a vice-presidente da República, mostrou que tinha disposição para o embate político, levando ao povo a ideia da valorização da mulher como ente que, sem deixar o forno e o fogão, é capaz de pelejar para mudar os rumos no sentido de maior bem-estar às populações, na mudança limpa e honesta, através do voto.
Agora, é a deputada federal que recebeu do povo de Goiás a maior votação, reconhecida como legítima representante da gente goiana, atuando com destaque na Câmara dos Deputados, justificando honradamente a confiança de seu enorme e valioso eleitorado.
Essas mulheres vitoriosas, Beatriz e Iris, não são apenas exemplos de jovens que vieram de famílias humildes e se fizeram através do trabalho, do amor à família e da dedicação ao ideal de servir – e de bem servir – a seus semelhantes.
Mas, veja bem caro leitor, os maiores beneficiários dos talentos dessas mulheres que se fizeram vitoriosas somos dois homens que já chegamos aos setenta e... anos de idade: Iris Rezende Machado e João Neder, dois amigos de muita sorte!
João Neder
é jornalista, advogado criminalista e promotor de Justiça aposentado