O bandeirante documentado (Diário da Manhã, 12/02/09)
O bandeirante documentado (Diário da Manhã, 12/02/09)
Elizabeth Caldeira Brito
Elizabeth Caldeira Brito é professora, psicóloga, escritora, chefe de gabinete, secretária- executiva e sócia titular do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás e secretária-geral da Comissão Goia
Por ocasião da colonização do Brasil, as Entradas e Bandeiras eram utilizadas pelos portugueses ou particulares: senhores de engenho, donos de minas e comerciantes. As Entradas tinham como meta explorações territoriais. As Bandeiras visavam combater tribos indígenas, capturar índios, resgatar escravos fugitivos, procurar pedras e metais preciosos (as Bandeiras). Foram responsáveis pela conquista e expansão territorial brasileira, desbravando os sertões além do Tratado de Tordesilhas. Em Goiás não foi diferente.
Bartolomeu Bueno da Silva, o último dos grandes bandeirantes a desvendar os caminhos para o oeste, tornou possível o conhecimento do alto sertão brasileiro, durante o período colonial, idos de 1682. Seu filho, de mesmo nome, com doze anos, participou da expedição, refez, desde São Paulo, quarenta anos depois, em 1722, o trajeto percorrido anteriormente com o pai. Durante três anos, a expedição procurou, em vão, os sítios antigos pelos sertões distantes. Não os reencontrando, fundaram um núcleo com o nome de Barro, em 1722. Em 1927, com a transferência para as proximidades do Rio Vermelho, denominaram-no de Arraial de Sant’Anna, mais tarde se tornou Vila Boa de Goyaz, hoje, cidade de Goiás.
Goiânia, para homenagear o desbravador que deu origem à capital do Estado, ergueu, em nove de novembro de 1942, o “Monumento ao Bandeirante”, obra do artista plástico Armando Zago: retrata, em bronze, Bartolomeu Bueno da Silva (filho). A escultura, com três metros e meio de altura, está instalada na Praça Atílio Correia Lima, no Centro da cidade, que, ao longo dos anos, paulatinamente, perdeu espaço para a metrópole, com seu vertiginoso fluxo de carros e transeuntes. Hoje, mal acolhe seu bravo hóspede. Sequer há espaço condigno para abrigá-lo. Seu complexo vislumbra somente reuniões do “homem da cobra” e manifestações de religiosos manipulados, fanáticos e solitários.
A família Cunha Bueno, liderada por Dora Silvia Cunha Bueno, presidente da Associação Paulista de Fundações e seu filho Theodoro Cunha Bueno Bannwart, descendentes de Antônio Silva Cunha Bueno, os responsáveis pela vinda, de São Paulo para Goiás, da homenagem, doou, à Universidade Federal de Goiás, os documentos relativos ao “Monumento aos Bandeirantes”, no dia nove de novembro de 1987. O acervo, resultado do empenho e pesquisas dos alunos da Faculdade de Direito da USP, perpetua a memória daqueles que contribuíram para a interiorização do País e a manutenção do sistema escravocrata que vigorava no Brasil Colônia.
Dora Bueno é herdeira não só do nome e tradição do historiador, mas também de sua força, determinação e persistência. Se não por ela e o filho Theodoro, os documentos teriam se perdido para sempre. Debandaram-se de seu espaço de guarda. Permaneceu por vinte e dois anos extraviados. Graças ao empenho de Armando Honório da Silva, da UFG, seu destino foi desvendado: estava na residência de uma das professoras que receberam o acervo, a despeito de realizar pesquisas.
No dia nove de fevereiro último, na Reitoria da UFG, ocorreu a reapresentação do Acervo Documental da Memória aos Bandeirantes. Nas presenças do reitor em exercício, Prof. Benedito Ferreira Marques, do presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, escritor Aidenor Aires, do presidente da União Brasileira de Escritores, escritor Edival Lourenço, da presidente da Funpego – Federação das Fundações Privadas do Estado de Goiás, profª. Vera Maria, do presidente da Fundação Pró Cerrado, dr. Adair Meira, de vice-reitores da UFG e convidados, foram acordadas ações para a disponibilização do acervo às instituições, aos pesquisadores e à comunidade educacional. Assim, pudemos testemunhar o resgate dessa preciosidade, que constitui a história de nossas origens, por aqueles que construíram caminhos para que possamos deixar também nossos rastros num porvir de mistérios decifrados.
Namastê.
Elizabeth Caldeira Brito
é escritora, sócia titular do IHGG e conselheira do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da cidade de Goiânia (beth-abreu@hotmail.com)