Brincalhão, Juraci perde o amigo, mas não a piada

Brincalhão, Juraci perde o amigo, mas não a piada (Diário da Manhã, 14/02/09)

“Como que uma mulher tão bonita pôde se casar com homem feio como eu?” A indagação surge quando Juraci lança olhar saudoso sobre fotografia que registra o dia do casamento, 34 anos atrás. A imagem de Clarice, vestida de noiva, desperta certa nostalgia, misturada com satisfação. Em cima da mesa, dezenas de fotos estampam um pedaço da história do prefeito de Rio Verde e trazem à tona um passado não muito distante. Juraci Martins (DEM) há algum tempo não abria a pasta recheada de fotos da família. Na manhã de sábado, sentado na varanda de casa, permite-se transportar para lugares que só os retratos são capazes de resgatar.
O preto-e-branco da fotografia que o sogro tirou, em Jataí, ao lado do ex-presidente Juscelino Kubitschek, contrasta com balões coloridos que enfeitavam festas de aniversário dos filhos. “Fui um pai ausente. Estava sempre viajando, trabalhando. Hoje sei que não há nada que valha mais do que estar perto da família”, conclui Juraci, reconhecendo, contudo, que a jornada que inicia como prefeito pode adiar os planos caseiros. Naquele momento, porém, é mais pai do que prefeito. Política fica de lado por instantes para ceder espaço à “corujice” paternal. “Esse é meu filho, Augusto”, diz, apontando orgulhoso para o retrato que tem nas mãos. “Formou-se em Veterinária, para cuidar da família”, diz, aos risos.
A piada, de alguma forma, pode ser levada a sério. Mila e Flora ocupam lugar privilegiado na família. Com lacinhos caprichosamente presos às orelhas, as cadelinhas Shitzu dividem com Juraci a casa e o café da manhã. “A peludinha é mais exigente”, referindo-se a Mila. “Mas divido tudo na mesma medida, para não gerar complexo. Um pedacinho para uma, um para outra”, enquanto as duas disputam o biscoito de queijo. A relação que Juraci tem com Mila e Flora vai de encontro com o rótulo de pai ausente. Passeios matinais são regra. Enquanto as cadelinhas ganham as ruas, ele provoca dono do restaurante vizinho. “Esse aí é eleitor do Wagner (Guimarães), mas almoço aqui do mesmo jeito.” Quando Mila e Flora se aproximam, fazendo festa para o dono, Juraci brinca. “Aí minhas eleitoras fiéis.”
Mila, Flora e mais 35.402 rio-verdenses. Juraci tentou a prefeitura pela primeira vez no último pleito, aos 62 anos. Começou a campanha com 2%, terminou com 45%. A vitória sobre o peemedebista Wagner Guimarães surpreendeu a todos, menos ao próprio Juraci. “Fui criado para ser vencedor. Meus pais queriam que me tornasse médico, engenheiro ou político. Tinham pouca instrução e nutriam o sonho de que fosse bem-sucedido. Meu pai sempre desejou que fizesse algo para ajudar as pessoas.” Juraci só não foi engenheiro. Formado pela Universidade Federal de Goiás (UFG), exerceu a Medicina por 18 anos. Mais tarde, ingressou em atividades rurais e no meio político. Foi vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), vice do Sindicato Rural e vice do PP de Rio Verde. “Fui vice demais! (risos). Meu filho já estava dizendo: ‘Papai, quando eu crescer quero ser vice que nem o senhor’.”
Hoje, titular do mais alto cargo da cidade em que nasceu, Juraci se emociona quando lembra dos ensinamentos dos pais adotivos, Augusto e Anísia, que o criaram desde pequeno. “Eles me ensinaram a perseverar. Há 30 anos sou cogitado para ser candidato a prefeito de Rio Verde. Chegou a hora.” E por que só agora? “Antes não dava porque ainda era ‘verde’ demais. Mas também não podia esperar ficar podre”, diverte-se, prometendo tentar contemplar os anseios que Seu Augusto, já falecido.

Poder não muda hábitos


Enquanto Maria, que trabalha há 25 anos com Juraci, prepara a comida no fogão na área externa da casa, ele se prepara para ir ao barbeiro. Antes de se despedir, mostra a esteira coberta por pano e Maria acusa. “Ele nunca usou.” O prefeito é obrigado a concordar, mas rebate. “Emagreci oito quilos durante a campanha.” Minutos mais tarde, atrás da porta de vidro, Wesley, o barbeiro, recebe o cliente antigo. “Ele é o único que apara retinho”, elogia Juraci que, desde menino, frequenta a mesma barbearia, agora responsável por manter bem cuidado o característico bigode. “Se não for grande administrador, o primeiro que vai criticar é o Wesley. Na barbearia é de onde saem fofocas.”
O estilo brincalhão acompanha o prefeito até o Bar do Toninho, onde frequenta há 25 anos. Um lugar minúsculo, onde algumas cadeiras amarelas de plástico acomodam os clientes que querem um copo de cerveja e boa conversa. Juraci é de casa. Abre o freezer, pega o que deseja, mexe com dono do bar. “Esse daí também é eleitor do Wagner. O único da família que votou em mim foi o Zé Cabrito, irmão do Toninho. Mas gosto de você mesmo assim, Toninho, preocupa não.”
Juraci diz que a boa mesa é um de seus maiores prazeres. Almoça churrasco em restaurante tradicional da cidade com frequência. Enquanto os garçons, velhos conhecidos, servem os pratos, o prefeito ironiza sobre os benefícios de ocupar cargo tão ilustre. “Antes, nunca trouxeram nem um pãozinho para mim.”
À tarde, de volta para casa, aproveita o dia de folga dirigindo-se à fazenda ou assistindo TV. Ex-noveleiro assumido, garante que o hobby, agora, é ver corridas de Fórmula 1. “Torço pelo Felipe Massa, mas meu estilo está mais para Rubinho: chorão.” As semelhanças, garante, param por aí. Diz não querer ficar para trás na corrida que iniciou no dia 1º de janeiro. Telespectador assíduo de televisão, o prefeito foi, ele próprio, favorecido pelo veículo. “Hoje sou líder. A TV ajudou a construir isso, durante a campanha.” O mais novo líder de Rio Verde se define de maneira simples. “Fui criado para ser um cara gente boa. Estou pelejando para ser.”