Afago aos municípios é questionado

Afago aos municípios é questionado (Diário da Manhã, 15/04/09)

Apesar do impacto futuro na inflação e do corte em investimentos, Lula anuncia R$ 1 bi e recebe crítica de todo lado


A decisão do governo federal de manter, em 2008, o valor repassado via Fundo de Participação dos Municípios (FPM) para todas as prefeituras preocupa especialistas, que veem na medida motivações políticas com sérios desdobramentos econômicos no futuro.
Na segunda-feira, ministros se reuniram com prefeitos para discutir a situação dos municípios. Saíram de lá falando que a solução para o enforcamento dos municípios seria eminentemente político. Paulo Bernardo (Planejamento) disse que recebeu de Lula um “xeque-mate”. Todo um esforço para evitar baixas na campanha da candidata do Palácio do Planalto à Presidência – a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
A despeito de um provável descontrole futuro na inflação e da redução da fatia do orçamento destinada a investimento em obras de infraestrutura, que já é ínfima (R$ 2,7 bilhões, frente a uma arrecadação global de R$ 86,1 bilhões), o presidente decidiu adotar caminho semelhante ao do colega norte-americano Barack Obama e despejar muito dinheiro para tentar salvar o País da crise. Esqueceu-se, no entanto, de que o Brasil não tem a estrutura financeira – e mesmo física – no que diz respeito às ditas obras que garantem crescimento com bases sólidas no futuro.
Lula utilizou o grave cenário econômico mundial como “licença” para gastar muito (e mal). Não quis saber de abrir linhas de empréstimo para os prefeitos. Falou logo em “compensação”. E disse que não era para ajudar apenas as cidades em situação mais calamitosa, mas todas elas, sem discriminação. Ordenou a concessão de crédito suplementar de R$ 1 bilhão para que as prefeituras recebam, na soma total, o mesmo valor que receberam em 2008, exatamente R$ 51,3 bilhões.
Lula ignorou o fato de que a União não tem condições de repassar, este ano, o mesmo valor repassado em 2008, ano de exuberância econômica.
Desprezou também o fato de que, nos dois últimos anos, o repasse do Fundos dos Municípios cresceu 17%. E que, à medida que aumentou o fluxo de caixa, as prefeituras incharam seus quadros de funcionários. Contrataram mais, terceirizaram mais. E agora, que o dinheiro minguou, a caríssima estrutura do funcionalismo público nos municípios ficou insustentável. Ruiu.
De acordo com levantamento realizado pela Folha de S.Paulo nas capitais, em Fortaleza a folha salarial cresceu 48,6% desde 2006. A prefeita Luizianne Lins (PT) gastou no ano passado R$ 1,1 bi. Recorde absoluto entre as capitais. No ranking de aumento percentual, em seguida, aparecem São Luís (R$ 530 milhões), Vitória e Campo Grande (R$ 410 milhões). A quinta colocação é nossa. A Prefeitura de Goiânia apresenta inchaço de 35,4% nos últimos dois anos do primeiro mandato de Iris Rezende (PMDB). No ano das eleições, o peemedebista destinou R$ 820 milhões para o funcionalismo.

INSUFICIENTE

Como era de se esperar, o aporte financeiro, por mais que vá provocar prejuízos futuros ao País, não satisfez a sanha dos prefeitos. O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, considerou o valor “irrisório”.
O presidente da CNM afirma que a ação emergencial que não vai suprir os problemas econômicos. Ziulkoski disse que o governo não ouviu o pedido dos prefeitos que queriam que a reposição das perdas fossem corrigidas pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), que ficou em 5,9%. A correção ficou apenas nos valores nominais.
A entidade explicou que os membros do Conselho Político não pressionaram o governo a realizar a revisão e auditoria da dívida dos municípios com o INSS. Os prefeitos querem o congelamento da cobrança.
O cientista político Leonardo Barreto afirma que o valor destinado às prefeituras não será suficiente para que cada uma saia do sufoco. “Parece-me que o governo, com essas medidas, tem o objetivo de segurar o índice de aprovação de Lula. Eles sabem que se as prefeituras quebrarem, isso terá um reflexo negativo para o governo”, explica.
Barreto também reforça a ideia do ritmo de campanha que Lula já teria incorporado em suas ações. “Por um lado, o governo vai alimentar seus planos político-eleitorais, mas não vai resolver o problema econômico. O objetivo é  manter o controle dos prefeitos com vistas para 2010”, acrescenta.
O especialista analisa que para o governo é melhor anunciar uma medida de “impacto”, que aos olhos da população R$ 1 bilhão significa um valor exorbitante, do que realizar medidas tímidas e de longo prazo que não trarão o bônus da mídia e da publicidade a Lula.
O cientista político Itami Campos, da UFG, afirma que o governo se encontra em uma situação complicada. “Primeiro, porque a criação do crédito pode não ajudar os municípios, e os prefeitos vão continuar cobrando. Segundo, porque se Lula não remediar os problemas, o quadro se complica mais ainda”, avalia. Itami acrescenta que a medida não deve ser considerada “fora do comum”: “Não é uma ajuda grande, e, sim, emergencial.”

 

Marconi participa de debate sobre crise no Brasil

O PSDB realiza amanhã o seminário “Realidade e Perspectivas dos Municípios Brasileiros”. O seminário vai discutir as crises econômica e financeira vividas pelos municípios prejudicados pelos benefícios fiscais do governo federal para a indústria automobilística e a construção civil, e as perspectivas de desenvolvimento para as cidades. No final, será elaborado um documento com as propostas do encontro.
O presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), o economista José Roberto Afonso e o presidente do Instituto Teotônio Vilela (ITV), deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (ES), e lideranças da oposição participam do evento. O prefeito de Teresina (Piauí), Sílvio Mendes, é um dos destaques do seminário na condição de secretário nacional de prefeitos do PSDB. A coordenação do encontro está a cargo do senador Marconi Perillo (foto).
O seminário dos partidos de oposição será realizado no auditório do hotel Brasília Alvorada, das 10h às 13h.

 

Para presidente, metade da crise no País é “pânico”

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que 50% da crise no Brasil é reflexo de pânico e não condiz com a realidade. Segundo o presidente, o País vive momento de “estabilidade e credibilidade política”, mas que o pessimismo disseminado atrapalha a economia. As declarações foram feitas durante visita de Lula à unidade de produção de papéis para embalagem da Klabin, no Paraná, que completa 110 anos.
“(...) Precisamos todo santo dia fazer quase que uma procissão de fé em reafirmar as convicções no País. (...) Se a gente não fizer assim, vai se deixar abater pela primeira notícia negativa que ler”, afirmou Lula. “Às vezes, eu chego a pensar que 50% do resultado da crise é um pouco de pânico que tomou conta da sociedade. Quando conversei com o presidente [Barack] Obama, eu dizia que se não houver movimento mundial para convencer o consumidor a acreditar no poder de consumo, comprar o que precisa, a economia para.”
Ao afirmar que o Brasil está melhor do que outros países na crise, Lula disse que “vivemos um momento de estabilidade e credibilidade política”. “Não há venda barata de otimismo”, afirmou.

Habitação
Ainda no Paraná, Lula afirmou que todas as cidades brasileiras poderão participar do programa de habitação popular do governo federal “Minha Casa, Minha Vida”.
“Todos os prefeitos, empresas e sindicatos que tiverem bons projetos não deixarão de ser atendidos. O que queremos é construir um milhão de casas”, disse.

 

Após compensação generosa, governo prepara novo pacote

Depois de abrir os cofres do Tesouro em cerca de R$ 1 bilhão para compensar as perdas de receita dos municípios, o governo vai lançar um “pacote de bondades” para aliviar a situação financeira dos Estados. As medidas, autorizadas pelo presidente Lula, pretendem neutralizar discursos oposicionistas e proteger a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, à Presidência no próximo ano.
“Nem todos os Estados estão no sufoco, e temos que ir ajudando os mais necessitados”, disse Lula, depois de participar da cerimônia de 110 anos da produtora de celulose Klabin, na cidade de Telêmaco Borba, no Paraná.
Segundo Lula, os ministros da área econômica e a própria Dilma estão conversando com os governadores para melhor diagnosticar os problemas de cada um.
De acordo com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, que acompanhou Lula no Paraná, a ajuda aos Estados não seguirá o modelo de socorro dirigido aos municípios. “Para os municípios, é um auxílio financeiro. Os recursos vão ser repassados, e se a arrecadação aumentar não vai ter volta”, disse Bernardo. No caso dos Estados, o dinheiro do Tesouro não terá mão única.
Desse arsenal de “bondades” em formatação fazem parte empréstimos com juros atrativos concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O governo estuda a flexibilização da contrapartida dos Estados em obras do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).


Protestos devem continuar hoje

Prefeitos da oposição e até da situação não demonstram, ao menos por enquanto, grande entusiasmo com o pacote de R$ 1 bilhão anunciado pelo presidente Lula, nesta terça-feira, em ajuda às prefeituras, por causa da queda no repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Até mesmo um protesto marcado para hoje nas 853 prefeituras de Minas Gerais deve ocorrer, embora sem o fechamento – previsto anteriormente – dos prédios da administração municipal.
“O pacote é o primeiro passo para resolver o problema, mas ainda é tímido. Temos outras reivindicações, como a suspensão por seis meses dos pagamentos ao INSS, com a troca do fator de reajuste dos financiamentos por outro mais favorável e o pagamento da inflação dos últimos três meses do ano passado”, afirmou o prefeito de São Gonçalo do Pará (MG), Angelo Roncalli (PR). De acordo com ele, a cidade de 11 mil habitantes perdeu R$ 400 mil em arrecadação no primeiro trimestre.