Quando as ruas se calam, o povo geme

Quando as ruas se calam, o povo geme (Diário da Manhã, 23/04/09)

Todas as liberdades alcançadas por um povo foram conquistadas no calor das grandes manifestações, no confronto com a força imposta pelo sistema, nas diversas manifestações públicas, como nas passeatas, nos comícios, nas caminhadas e até mesmo nas guerrilhas. No Brasil, durante a ditadura militar, inúmeras pessoas foram violentadas, mortas e exiladas, simplesmente pelo fato de clamarem por seus direitos fundamentais, como a liberdade de expressão, direito ao voto secreto e direto, educação, saúde, moradia, transporte público, etc.

Atualmente, estamos vivendo sob a égide do fantasma da pós-modernidade, onde um conformismo crônico parece pairar sobre nossas mentes. Vemos as injustiças imperarem e não temos mais a coragem de nossos heróis, de um Brasil bem recente, que não temiam as baionetas, os cães, os policiais enfurecidos, os gases lacrimogêneos, as torturas, as prisões e as mortes. As estruturas parecem falidas devido aos reflexos de ‘“uma ética do chamado capitalismo tardio’’.

O parlamento, que deveria ser a representação legítima da sociedade, a cada dia vai se envolvendo na lama da corrupção, e uma grande parcela de parlamentares legisla em causa própria, desrespeitando os eleitores que deram a eles um voto de confiança. As duas maiores casas de leis do País, Senado e Câmara dos Deputados, constantemente vivem sob os escândalos advindos das práticas corruptas de seus nobres pares, dentre eles, velhas figuras que representam o que há de mais retrógrado no comando das duas casas, senador José Sarney e deputado Michel Temer, que sempre são eleitos por interesses das bancadas oligárquicas do Senado e da Câmara.

As ruas se calam e o povo geme sem vez e voz. Um exemplo disso foi a recente manifestação feita pelos estudantes da UFG, quando protestaram contra o aumento abusivo e injusto da passagem de ônibus, uma vez que a realidade do transporte público é caótica e humilhante, onde usuários, para embarcarem nos ônibus, principalmente os que dependem dos terminais, necessitam se digladiarem uns contra os outros numa verdadeira batalha de animais irracionais e são transportados como feras a caminho da imolação, devido à superlotação dos coletivos.

Algo que me chamou bastante a atenção durante as manifestações dos estudantes foi a força policial usada contra os manifestantes, como se esses estivessem praticando algo injusto ou algo que fere os padrões éticos da sociedade, quando na verdade estavam lutando pelos direitos básicos e essenciais garantidos por nossa Carta Magna. Assistimos às manifestações como que anestesiados, pela inércia de uma consciência cauterizada; governantes, deputados e vereadores, em sua grande maioria, também resolveram se omitir, sendo totalmente coniventes com o aumento da passagem para R$ 2,25, que representou um grande aumento, uma vez que Goiânia é uma das capitais brasileiras com tarifa de ônibus mais cara do País.

Que a manifestação dos estudantes nos leve a refletir sobre a importância de engajarmos na luta por um transporte coletivo mais digno, uma tarifa de ônibus mais barata e compatível com os nossos salários, pelo passe livre estudantil, que já deveria ser algo conquistado pelos estudantes e garantido pelos governantes. A voz das ruas é o termômetro da população. Se as ruas se calam, a corrupção prolifera, o autoritarismo prevalece, os direitos básicos da sociedade são burlados e a população geme.