Desenho Escrito
Desenho Escrito (Diário da Manhã, 28/04/09)
Artista plástico Glayson Arcanjo estreia exposição cujas obras revelam o intrigante resultado
À primeira vista são riscos, traços, rabiscos e palavras sobrepostas sobre papel branco. Não, não para aí. Para que a observação da obra de Glayson Arcanjo se torne mais clara, é preciso chegar mais perto e ajustar o foco da atenção. O artista mineiro que inaugura hoje a exposição A(i)nda desenho, na galeria da Faculdade de Artes Visuais, obriga o espectador a ir mais além. A confusão inicial na obra do artista é proposital e resultado das sobreposições de desenhos feitos a carvão realizadas pelo artista em um estudo sobre desenho sobre o próprio desenho, numa metalinguagem. A exposição traz outras linguagens visuais como fotografias e palavras esculpidas em areia e um vídeo, que mostra Glayson desenhando na areia. Radicado em Uberlândia (MG), Arcanjo desenvolve a pesquisa desde 2001 na tentativa de explorar e detalhar a linguagem da produção de desenhos. “A intenção era descobrir e entender melhor o desenho”, explica o artista. Os trabalhos não têm título e se convergem a um conjunto, dialogando entre si. “A união delas é o ponto mais importante”, pontua Arcanjo. O nome A(i)nda desenho foi escolhido devido ao uso de linhas e pelo fato de os desenhos não estarem completamente finalizados, dando a ideia de algo que ainda pode ter continuidade, de não ser estático. Parte das peças da exposição é composta por palavras, que aparecem misturadas a borrões e sinais originados da tentativa de apagar o que foi escrito em alguns trechos. Para o artista, as palavras também são uma forma de desenhar e de relatar vivências cotidianas. Estes escritos, explica ele, não são realizados de uma vez só, mas gradativamente. O gosto pelo desenho faz com que Arcanjo não o separe da escrita, por isso a presença dos dois no conjunto da exposição. “Para mim, desenho e escrita são inseparáveis. Por isso a confusão para quem olha pela primeira vez as minhas obras. Os escritos têm relação direta com a literatura, uma das principais influências e fontes de inspiração do desenhista. O artista é consumidor de poesia e de textos literários, o que acaba gerando relação direta no que produz, porém sem a intenção de fazer literatura nas peças produzidas. “Acabei misturando literatura e desenho em algumas peças, sem a preocupação de dosar cada uma e sem a pretensão de produzir algo tachado de literatura”, ressalta. Quem for ver a exposição vai poder conferir desde desenhos feitos em papéis com um metro de comprimento ou outro com 20 metros de extensão, realizado numa folha contínua em forma de ziguezague. Nesta obra, feita especialmente para a mostra da FAV, o gesto de desenhar é contínuo e busca mostrar o movimento de quem desenha, num estudo da parte física e do esforço feito pelo desenhista. Outro elemento explorado é a areia. Parte das obras é composta por fotografias de palavras escritas com formas sobre a areia, onde são exploradas a escultura e a fotografia. As montagens de areia foram feitas em praias na cidade de Barra de Itapemirim, no Espírito Santo. Trabalho semelhante está exposto no chão da galeria, com areia branca, que forma palavras. Desenhar na areia carrega o significado de que o trabalho artístico pode ser levado, modificado ou desmanchado. “O tempo pode desmoronar as letras escritas com areia e tudo virar pó. Existe a relação de que a obra pode ser transformada, devido a diferentes formas com que cada um interpreta”, conclui. O uso do grafite não foi escolhido por acaso. Assim como a ação do tempo leva o que foi escrito com areia, o grafite pode ser apagado com borracha. Para Glayson, são maneiras diferentes de algo se desfazer, mas ambas levam à interpretação de que aquilo que vemos pode ser efêmero, que não vai durar muito. “Meu objetivo é levar ao questionamento de que muitas coisas vividas podem ser apagadas. Daí, cada um imagina como se dá esse apagar.” O vídeo que será exibido durante a exposição traz imagens do artista plástico traçando sobre a areia. A função é mostrar e explicar, com o uso de outra linguagem, a da imagem em movimento, sobre o fazer artístico do desenho, na tentativa de demonstrar o empenho físico que a produção exige. A produção de desenhos não será interrompida, nem mesmo durante o tempo em que A(i)nda desenho estiver em cartaz na cidade. Glayson continuará a desenhar na própria galeria, obras com uso de palavras, tal como algumas peças expostas. Entretanto, não há a preocupação de produzir em série. Se hoje Glayson Arcanjo se dedica ao desenho e às artes plásticas, a raiz desta escolha vem da infância. “Desde criança desenhava muito, o dia todo, e daí não deu outra na hora de escolher o curso superior.” Como referências em seu estilo, estão artistas que trabalham, em paralelo, o desenho e a poesia. Uma das principais influências é o suíço Alberto Giacometti, conhecido pelo trabalho em esculturas surrealistas datadas do início do século 20. A primeira exposição individual de Arcanjo foi realizada em Uberlândia, na galeria Ido Finotti, com desenhos que também traziam a linha como principal elemento. Antes, experimentou outras linguagens, como o desenho gráfico, até se firmar no desenho propriamente dito. Apesar de se fixar na técnica, Arcanjo não descarta a possibilidade de transitar por outras áreas das artes plásticas. “Desenvolvi minha carreira até então fazendo desenho, mas isso não quer dizer não que vá me aventurar por outros rumos.” Interação Para a formação de novo público para arte, faz parte do programa da Galeria da FAV receber visitas agendadas de escolas e grupos de visitantes, por meio da proposta de ação educativa coordenada pelas professoras Irene Tourinho e Selma Parreira. Os interessados podem entrar em contato com a coordenação da galeria por meio dos telefones (62) 323521-1445 e 3521-1361 ou pelo e-mail galeriadafav@gmail.com. Mais informações no site da galeria (www.fav.ufg.br/galeriadafav). A galeria promove amanhã, às 10h, encontro com o artista, onde o público poderá conversar sobre a exposição e conhecer melhor o trabalho de Glayson Arcanjo. Exposição “A(i)nda desenho” Abertura: Hoje, às 10h Encontro com o artista: Amanhã, às 10h, no Galeria da FAV Visitação: De hoje a 22 de maio. De segunda a sexta-feira, das 8 às 17 horas Onde: Galeria da FAV.Campus II, da UFG Entrada gratuita