Confinamento à base de milho

Confinamento à base de milho (Tribuna do Planalto, 16/05/09)

Avançar a criação de gado confinado em Goiás é a proposta de um novo sistema de engorda sem a pastagem, também conhecido como volumoso, desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG) e Universidade São Marcos, de São Paulo, em parceria com a iniciativa privada. O experimento inédito no País, que prevê a troca da alimentação à base de capim por milho inteiro, foi alvo de pesquisas por dois anos e tema da tese de doutorado do professor Helio Louredo, da Escola de Veterinária da UFG, defendida e aprovada no início de 2009.

A dieta de confinamento sem volumoso começa a ser comercializada pela empresa de nutrição animal Agrocria, que tem como proposta democratizar o acesso ao sistema de confinamento para todos os pecuaristas do País. O diretor comercial da Agrocria, o veterinário Ricardo Scartezini Azeredo Coutinho afirma que o foco de todo o trabalho de pesquisas e desenvolvimento do produto está voltado para a atração de novos confinadores para o mercado. Segundo ele, esse novo sistema de alimentação exige um custo pequeno de investimentos em infra-estrutura e em ração animal, o que facilitará a inclusão de pequenos e médios produtores no sistema de confinamento.

Apesar de ser referência nacional na criação de gado confinado, Goiás ainda é um Estado que utiliza pouco essa ferramenta de engorda. Censo realizado pela Associação Nacional dos Confinadores (Assocon) em 2007 apontou que no Estado há 518 confinamentos, com uma média de 875.962 animais. Trata-se da maior concentração de confinamentos do País, com 2,7 milhões de cabeças, um número pequeno frente ao total de animais bovinos que é de 30,5 bilhões de cabeças, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os benefícios oferecidos pelo sistema de confinamento são a criação de animais em um espaço reduzido, o que libera a área da fazenda para outras produções, e a diminuição do período de engorda para o abate, que é concluído em dois anos. No sistema convencional, o prazo é de três anos. Além disso, a carcaça do animal fica mais padronizada e a qualidade da carne é mais produtiva. O veterinário Ricardo Scartezini reforça que o novo produto – denominado Engordim – tem como meta atrair os produtores de gado de corte, que ainda estão no sistema tradicional de pastagem e também os que já atuam com o confinamento.

O professor doutor Helio Louredo afirma que a aproximação entre universidade e iniciativa privada proporcionou o desenvolvimento de um produto inédito, que oferece novos parâmetros teóricos para a ciência e também a transferência desses conhecimentos para a sociedade. "O Brasil é o maior exportador de carne do mundo e detém o segundo maior rebanho, mas em contrapartida ainda investe pouco em pesquisa. Esse trabalho em parceria com a iniciativa privada vai gerar não só essa pesquisa, a nossa previsão é de que outros 30 trabalhos nesta área sejam publicados nos próximos três anos."

Ricardo Scartezini explica que a produção de volumoso e o alto investimento em infraestrutura para a implantação do sistema padrão de confinamento são considerados gargalos pelos produtores. Ele afirma que um ponto importante do novo sistema de confinamento é a pouca estrutura exigida. Segundo o diretor comercial, a distribuição da dieta aos animais é muito mais fácil do que no sistema tradicional, sendo possível tratá-los a pé ou com carroça, dependendo da quantidade.

Dietas personalizadas
Não são necessários, portanto, grande volume de mão-de-obra, bem como gastos com óleo diesel ou aquisição e manutenção de máquinas e implementos, o que facilita a adoção deste modelo também por pequenos e médios produtores, que não precisarão investir em estrutura como no confinamento tradicional. Segundo ele, este trabalho cria opções para os produtores, especialmente em regiões onde não há volumoso ou há grande dificuldade em produzir silagem.

O novo sistema de engorda em confinamento sem volumoso possibilita a elaboração de dietas personalizadas de acordo com a produção agrícola da região. A base principal desta alimentação é o milho inteiro, mas as rações podem ser combinadas com outros grãos, como soja e algodão e também a torta gorda, que é feita de resíduos da indústria do biodiesel como dendê, soja e bagaço de cana. A composição alimentar é dividida em 85% de milho grão inteiro e 15% de núcleo protéico-mineral-vitamínico peletizado, o que dispensa o uso de volumoso. 

O médico veterinário e doutor em Ciência Animal e Pastagem pela Esalq/USP Flavio Castro, gerente de produtos da Agrocria e membro da equipe que desenvolveu as pesquisas, explica que essa alimentação proporciona ganho de peso privilegiado, baixo consumo de alimento, excelente conversão alimentar e extraordinário rendimento de carcaça. Num período de 90 dias de confinamento, o rendimento médio do gado corresponde a um ganho de peso de 1,4 quilo por dia e um aproveitamento de carcaça em 55%, além de um acabamento adequado com 4,3 milímetros de espessura de gordura subcutânea, em média. Em geral, são feitos dois tratos diários e o consumo de alimento gira em torno de 8,5 kg/cabeça/dia (2% de peso vivo).

Outra vantagem do sistema de engorda sem volumoso é que a técnica pode se implantada tanto nos currais próprios para confinamento quanto nos piquetes dos pastos. Flávio explica que, quando desenvolvido em sistema tradicional de engorda confinada em currais sem adaptação prévia, os animais podem sentir a mudança da dieta com volumoso para dieta sem volumoso com milho grão inteiro. 

Segundo ele, na tentativa de aprimorar o sistema surgiu a técnica de manter os animais a pasto, permitindo o acesso dos bois ao volumoso durante o período de adaptação. "Os animais não passam mais por uma mudança abrupta na dieta, pois há uma alteração progressiva do pasto para a dieta de milho inteiro", afirma o especialista. O uso de milho grão inteiro em dietas de confinamento surgiu nos Estados Unidos, na década de 70, sendo bastante utilizado na Argentina, principalmente por pequenos produtores desprovidos de equipamentos.

Todavia, de acordo com Flávio, não existiam no Brasil pesquisas sobre o confinamento sem volumoso. Além de detalhar tecnicamente todos os experimentos, inclusive testando seis opções de dietas sem volumoso durante as pesquisas, este projeto evoluiu até o ponto de propor aos produtores o confinamento  sem volumoso, utilizando o grão de milho inteiro. Ele explica que neste sistema os animais são mantidos a pasto, com lotação de 30 a 40 cabeças por hectare, dependendo da quantidade de forragem disponível. O objetivo desta alta taxa de lotação é permitir a disponibilidade de forragem do pasto apenas durante a adaptação dos animais à nova dieta na primeira quinzena do confinamento.

Após o período de adaptação, os animais podem permanecer no pasto (piquete) ou em currais de confinamento. O importante é que não haverá mais forragem disponível. O sistema apresenta vantagens em relação ao semiconfinamento, no qual a possibilidade de ocupação do pasto é de uma cabeça por hectare contra 30 a 40 cabeças por hectare do confinamento a pasto.

Saiba mais

Resultados do confinamento sem volumoso
Consumo de matéria original: 2,0% peso vivo
Ganho médio diário: 1,4 Kg
Rendimento de carcaça: 55%
Acabamento de carcaça adequado
Dois tratos diários

Vantagens da dieta de milho grão inteiro

* Em virtude da baixa necessidade de instalações, equipamentos e mão-de-obra, torna-se mais prática e de maior amplitude de uso
* Melhor opção para confinamento sem volumoso dentre as seis dietas testadas;
* Possibilita confinar bois sem volumoso
* Dieta de oportunidade (depende do preço do milho)
* Requer cuidado especial no período de adaptação e no manejo de cocho
* Lotes uniformes com bom desempenho e adequado acabamento de carcaça