Som das origens
Som das origens
Atabaque, cavaco, tamborim: o Carnaval dos Tambores inicia folia de rua em Goiânia com desfile de blocos e resgate da cultura popular afro-brasileira celebrada pelo afoxé e outros estilos
Humberto Wilson
da editoria do DMRevista
Se não houvesse as belas mulheres e a cerveja, seria “batuque” a palavra que melhor definiria o carnaval. E com razão: em praticamente todas as vertentes da música popular no País, tambores e derivados ditam a percussão que anima a folia. Ritmos fundamentalmente africanos, personagens de uma transformação improvável que só poderia acontecer na terra da alegria: no lamento triste do negro que veio nos navios de escravos, jogou-se o tempero de um sorridente povo que traduz a dor em força e, então, criaram-se os sons que embalam o carnaval, a maior festa popular do planeta. Samba, pagode, frevo, axé, afoxé, todos ritmos genuinamente brasileiros, mas com um pé lá na África.
Origens
Criados há mais de um século, os afoxés são uma presença constante nos carnavais de várias capitais do País. São grupos que levam para as ruas o som percussivo dos atabaques, agogôs e xequerês, os cantos, as danças, os aromas e as cores do candomblé, religião de matriz africana recriada no Brasil. Uma das mais fortes características do movimento é a consciência de grupo, de valores e hábitos que os distinguem de qualquer outro bloco. Para quem não conhece o candomblé e suas cantigas, olha como se fosse um bloco carnavalesco diferente, mas é o candomblé de rua, segundo Raul Lody, antropólogo, museólogo e professor brasileiro, responsável por vários estudos na área das religiões afro-brasileiras, um dos mais respeitados do ramo.
As principais características do afoxé são as roupas, nas cores dos Orixás, as cantigas em língua Iorubá, instrumentos de percussão, atabaques, agogôs, afoxés e xequerês. O ritmo da dança na rua é o mesmo dos terreiros, bem como a melodia entoada. Os cantos são puxados em solo, por alguém de destaque no grupo, e são repetidos por todos, inclusive os instrumentistas. Antes da saída do grupo, ocorre o ritual religioso (como a cerimônia do “padê de Exu” feita antes dos ritos aos orixás numa festa de terreiro). O afoxé Embaixada da África foi a primeira manifestação negra a desfilar no Brasil, pelas ruas da Bahia, em 1885. Em seu primeiro desfile, utilizou indumentária importada da África. No ano seguinte, surgiu o afoxé Pândegos da África. Hoje, são diversos os grupos que mantêm vivas as tradições espalhados por vários Estados da Federação, inclusive Goiás.
Cultura popular
No dia 5 de março (sábado), o Setor Pedro Ludovico será palco do evento Atabaque, Cavaco, Tamborim: o Carnaval dos Tambores, como parte das comemorações do carnaval de rua de Goiânia. A realização é da Associação Desportiva e Cultural Mestre Bimba e do Pontão de Cultura República do Cerrado/UFG, e o objetivo da atração é fomentar espaços alternativos na cidade, apresentando mais uma opção aos foliões goianienses que, por um motivo ou outro, decidem passar o carnaval na Capital.
Apesar de o poder público se isentar de seu papel no que se refere às políticas públicas de cultura e de caráter continuado como o carnaval, o evento tem como ponto forte a participação de vários grupos que mantêm em Goiânia a riqueza da musicalidade e da cultura popular e afro-brasileira como afoxé, samba-de-roda, pagode, escolas de samba e blocos carnavalescos. O Carnaval dos Tambores tem como parceiros Assessoria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial de Goiânia – Aspir –, Secretaria Municipal de Esporte e Lazer – Semel –, Belcar Caminhões, ABC – Ação Brasil Central, Coletivo Gente Brasil, Círculo Azul Produções, Grupo de Capoeira Angola Barravento, Escola de Samba Flora do Vale, Banda Visual Ylê, Grupo Agitos do Samba, Associação Pérola Negra, Bloco Em cima da Hora, DJ Claudinho, Bloco Gato Pingado e Congada Irmandade 13 de Maio.
Afoxé Asè Omo Odé
Criado na década de 1990 por Pai João de Abuque (o mais antigo babalorixá e o primeiro ancestral do candomblé goiano), o Afoxé Asè Omo Odé trouxe ao carnaval dos anos de 1990 a 1993 a riqueza das expressões artísticas da tradição afro-brasileira, para a construção da tradição afro-goiana.
No ano de 2008, por iniciativa da Associação Desportiva e Cultural de Capoeira Mestre Bimba e do terreiro Ilè Ibá Ibó Mim, o Afoxé, sob direção do ogã Mestre Luizinho – herdeiro do famoso Mestre Bimba, retoma suas atividades festivas, nas ruas de Goiânia, em rememoração ao dia 13 de maio. Desde então, realiza anualmente cortejos pelas ruas do Setor Pedro Ludovico em homenagem a importantes mestres da tradição afro-brasileira como: Pai João de Abuque, Mestre Bimba – criador da capoeira regional, Mestre Pastinha – ícone da capoeira angola – e aos Capitães da Congada de Goiânia.O bloco é regido pelo orixá Oxossi, protetor dos caçadores, das matas e, portanto, do meio ambiente. Todos os que participam do grupo, independente de fazer ou não parte do Candomblé, recebem a proteção desta e de outras divindades africanas.
Já 2009 e 2010, o afoxé abre o carnaval de rua de Goiânia na Avenida Araguaia com o seu real objetivo, que é apresentar o candomblé na rua e anunciar o que ainda está por vir. Para 2011, o Afoxé Asè Omo Odé abre os caminhos para O Carnaval dos Tambores no Setor Pedro Ludovico, com o som percussivo dos atabaques, agogôs e xequerês, a beleza dos cantos e das danças, a força das cores e dos ritos do Candomblé em um grande cortejo, que destaca a riqueza rítmica e estética de Ogum, orixá dono dos caminhos e da tecnologia; de Oxóssi (patrono desse afoxé), protetor dos caçadores e das matas, e a exuberância de Oxum com o seu ritmo ijexá. Uma oportunidade rara de prestar as devidas homenagens às origens da cultura popular que se tornou sinônimo de brasilidade.
Atabaque, Cavaco, Tamborim: o Carnaval dos Tambores
Quando: 5 de março, a partir das 17 horas
Onde: Setor Pedro Ludovico (Alameda João Elias da Silva Caldas – próximo ao Colégio Dom Abel)
Mais Informações: Ceiça Ferreira (62) 8191-2122 / Clécia Santana (62) 9310-6395 / Janaína Soldera (62) 9975-7363