Ficou fechado por pura picuinha?

 

Centro Cultural Oscar Niemeyer

Ficou fechado por pura picuinha?

Local foi reaberto no segundo dia do novo governo com exposição do artista Siron Franco, o que leva ao questionamento sobre as razões de Alcides Rodrigues não ter concluído o pouco que faltava da obra

 

Sarah mohn e

Cezar Santos

 

Dois seguranças, quatro funcionários da exposição de arte “Segredos”, que reúne criações do artista plástico Siron Franco, e um visitante totalizavam o número de pessoas circulando pelo Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON) no final da tarde de sexta-feira, 7. Até as 16 horas, cinco pessoas haviam assinado o caderno de presença instalado na entrada do Museu de Arte Contemporânea (MAC), espaço em que estão as obras de arte. Na mesma página, que registrava a lista de visitações também do dia anterior, era possível visualizar outras nove assinaturas.

 

Segundo a equipe de organização do evento, cerca de 100 visitantes passaram pelo local durante a primeira semana da exposição. Mas os próprios organizadores ressaltam que o balanço engloba as visitas realizadas em 2 de janeiro, data da posse do secretariado do novo governo estadual, que ocorreu no CCON e atraiu, por tabela, o público presente no local.

 

Controvérsias numéricas à parte, fato é que o cenário de vacas magras capaz de deixar de cabelo em pé qualquer organizador de eventos culturais reflete muito mais que a debilitada tradição goiana de atrair grande contingente de cidadãos a exposições de arte. Sem dúvida, uma das principais causas para a fraca presença de público pode estar relacionada ao impasse que manteve interditada por cerca de dois anos a mais importante obra arquitetônica do Estado.

 

Reaberto em partes desde 2 de janeiro — apenas o MAC está em funcionamento diariamente —, não seria estranho constatar que boa parte da população goiana ainda não sabe a quantas anda a situação do CCON ou por que o espaço permaneceu interditado por tanto tempo. Aliás, também não seria de se estranhar que o local, até há pouco tempo impedido de funcionar sob a alegação de passar por problemas estruturais, tenha voltado à visitação pública logo no segundo dia da nova gestão estadual.

 

Na opinião de aliados do governador Marconi Perillo (PSDB), não resta dúvida de que toda a polêmica envolvendo a não-conclusão e a interdição do CCON nos últimos anos teve como principal motivador divergências políticas entre o atual e antigo governo do Estado, administrado por Alcides Rodrigues (PP). “Ficou claro que o posicionamento do governo anterior de não concluir a obra e de impedir o funcionamento dela foi feito com a intenção de desgastar o governador Marconi Perillo”, desabafa Carlos Rosemberg, ex-presidente da Agência Goiana de Transportes e Obras (Agetop).

 

Foi durante a gestão de Rosemberg que o centro cultural saiu do papel. O ex-presidente garante que o CCON foi entregue “praticamente pronto”, restando apenas a conclusão de detalhes inerentes à etapa final de qualquer construção. “Nós entregamos a obra funcionando normalmente. Havia detalhes de acabamento, mas o centro estava perfeitamente em condições de funcionar, tanto é que foram realizadas várias exposições em seguida e até show na abertura.”

 

Rosemberg diz que a equipe de governo envolvida com a construção do CCON no segundo governo de Perillo “não imaginava” que o governo do sucessor Alcides Rodrigues descumpriria o acordo de finalizar os “detalhes de acabamento” imediatamente. A respeito da atual situação do espaço, o ex-presidente justifica que os problemas estruturais existentes hoje são naturais de toda obra que não recebe manutenção por dois anos. “As pessoas que foram à posse do secretariado viram que a obra está perfeitamente em condições de funcionar. Os ajustes que estão sendo feitos agora são naturais pelo tempo em que a obra ficou paralisada e pelo desgaste da falta de manutenção.”

 

Nova gestão

 

Para o diretor do Centro Cultural Oscar Niemeyer, Nasr Chaul, a interdição do local por dois anos não se justifica, já que logo após a entrega da obra e durante 2006 e 2007 o espaço funcionou normalmente, sediando cerca de 40 eventos culturais, como shows de rock e MPB, lançamento de livros e CDs, exposições artísticas, concertos e mostras nacionais, como a de Darwin e Pablo Picasso.

 

“Não posso dizer que o centro ficou fechado por picuinha política, porque eu não estava na gestão anterior. O que posso afirmar é que, tendo vontade política, você coloca as coisas para funcionar. Poderia ter havido um esforço maior em prol do Centro para resolver os empecilhos que barravam a conclusão da obra. Por exemplo, em relação às licenças ambientais, nós fizemos em quatro dias o que não fizeram em dois anos. Se tivesse havido, eu poderia, por exemplo, ter entrado aqui agora e não ter tido problema com licenças ambientais”, diz Chaul, que esteve à frente da Agência Goiana de Cultura (Agepel) durante os dois governos anteriores de Marconi Perillo. 

 

Assim como tucanos que estiveram desde o início envolvidos com a execução da obra, Chaul ressalta a importância de se considerar o CCON uma obra de arte, e não apenas um empreendimento arquitetônico. “Ele não pode ser entendido como uma obra de engenharia, mas como uma obra de arte. Os problemas do centro cultural não se tratam de problemáticas comuns.”

 

Entre os defensores do CCON, faz-se coro em torno da crítica de que o espaço não recebeu a atenção necessária nos últimos anos e acabou sendo relegado aos padrões de construções comuns. Nesse contexto, defendem que, por não se tratar de uma obra simples de ser implementada, necessitava de período de adaptação posterior à conclusão para que fossem executados os ajustes finais.

 

Prova do descuido, foi a polêmica envolvendo a biblioteca do CCON. Antes de a obra ser entregue, ainda no final de 2005, questionou-se a capacidade de o espaço — que presta homenagem a Bernardo Élis, o único escritor goiano a pertencer à Academia Brasileira de Letras — abrigar o acervo de livros. Chaul explica que não era necessário o cálculo arquitetônico para que fossem destinados três pisos aos livros. “Vamos colocar a biblioteca em um piso e meio, a administração em outro piso e no andar restante ficará o minimuseu da língua portuguesa e a biblioteca virtual.”

 

Levantando a bandeira de que o CCON será palco para realização de eventos nacionais e internacionais, Chaul promete dar “vida ao centro cultural”. Informa que, além da exposição de Siron Franco, ainda neste mês, de 19 a 22, o centro sediará a quinta edição do Goyaz Festival, evento voltado exclusivamente para a música instrumental. Entre as atrações previstas na programação, estão instrumentistas nacionais como o pianista Cesar Camargo Mariano, o maestro Jaques Morelenbaum, o violonista Yamandu Costa e o trombonista Bocato. O Goyaz Festival ocorrerá no Palácio da Música, um dos quatro monumentos que compõem o CCON.

 

Na história

 

A ideia de criar o Centro Cultural Oscar Niemeyer em Goiânia partiu do projeto de expansão da política cultural do segundo governo de Marconi Perillo. Ainda em 2004, o também na época governador tucano e sua equipe foram ao Rio de Janeiro convidar o arquiteto Oscar Niemeyer para realizar o projeto. Niemeyer veio a Goiânia e analisou as três opções de locais previstos: área do Lago das Rosas, Morro da Serrinha e o espaço no início da GO-020, onde hoje está o CCON.

 

A área foi doada ao Estado, mas estava em litígio, com o doador querendo sua devolução. O governo negociou e ficou com o espaço de forma definitiva. A construção do CCON teve início em 2005. A obra ficou a cargo da Agetop e foi executada pela empresa goiana Warre Engenharia, sendo supervisionada pelo sobrinho de Oscar Niemeyer, o também arquiteto João Niemeyer. Professores da Universidade Federal de Goiás (UFG) e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) também acompanharam a execução da obra.

 

Em 31 de março de 2006, ao deixar o governo para se candidatar à vaga de senador da República, Marconi Perillo inaugurou o Palácio da Música, o Museu de Arte Contemporânea, a Esplanada de Shows e o miniauditório. Faltou entregar apenas a biblioteca. O então vice-governador, Alcides Rodrigues (PP), comprometeu-se a finalizar a obra assim que assumisse o Palácio das Esmeraldas.

 

O espaço inaugurado funcionou normalmente entre 2006 e 2007, mas nos anos seguintes foi interditado sob alegação de que havia problemas estruturais no corpo da obra. Os principais argumentos que passaram a ser levantados foram: inauguração antes da conclusão da obra; gastos excessivos na execução da obra; erro de cálculo na biblioteca e o não-pagamento de honorários ao escritório do arquiteto Oscar Niemeyer.

 

O projeto arquitetônico do CCON foi contratado por R$ 690 mil ao escritório de Niemeyer. Todos os projetos foram pagos, apenas faltando a última de cinco parcelas, no valor de R$ 280 mil, correspondente ao pagamento de outros escritórios subcontratados por Niemeyer. O resultado final da obra é um complexo cultural em área construída de 17 mil metros quadrados, que custou cerca de R$ 60 milhões aos cofres públicos.

 

No ano passado, o TCE questionou o processo de contratação da obra, contestou alguns pontos de gestão do contrato e em 2010 determinou que se fizesse nova licitação para o término dos detalhes que ainda faltam. O governo anterior prometeu concluir a obra até julho de 2010, mas não cumpriu o acordado. Em 2 de janeiro, data da posse do novo secretariado, o governo Marconi assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) junto ao Ministério Público de Goiás se comprometendo a entregar a obra completa até o final deste ano. Resta saber se a novela não se repetirá.