'Não há como não se deixar afetar pelas mazelas do cotidiano'

'Não há como não se deixar afetar pelas mazelas do cotidiano'

A programação do encontro literário Banquete de Livros, realizado no Centro Cultural UFG, traz em sua programação de hoje Marçal Aquino, autor que não habita apenas as prateleiras das livrarias ou as mesas de cabeceira de seus leitores. Muita gente tem contato direto com sua obra e, não raro, não liga o nome à pessoa. Roteirista de cinema e TV, é um nome de grande prestígio, conquistado com trabalhos consistentes na literatura e no audiovisual. Entre seus livros mais conhecidos estão O Invasor, que virou filme, Famílias Terrivelmente Felizes e Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios e a narrativa Cabeça a Prêmio.
Esse paulista de Amparo, nascido em 1958 e adepto de uma literatura de corte realista, também é jornalista e já assinou textos em veículos como os jornais O Estado de S. Paulo e Jornal da Tarde. Seus trabalhos com maior repercussão junto ao grande público, porém, são os realizados para a TV e o cinema. Marçal Aquino é autor, sozinho ou em parcerias (muitos com o diretor Beto Brant), do roteiro dos filmes O Invasor, Cheiro do Ralo, Nina, Os Matadores e Ação Entre Amigos.
Para a TV Globo, concebeu a série policial Força-Tarefa, da Rede Globo, que mostra os bastidores de um grupo de elite da PM carioca incumbido de punir crimes cometidos por colegas de farda.
A experiência foi compartilhada com o autor Fernando Bonassi, com quem Aquino participa de um debate às 15 horas, cujo tema será Livro e Cinema. Em pauta, a convergência de linguagens entre a literatura e a sétima arte. Em entrevista ao POPULAR, Marçal Aquino fala de como lida com esse encontro de universos e revela como foi escrever o romance O Invasor já pensando-o como um roteiro para a telona. O autor explica ainda as razões que o fazem abordar a violência em seus trabalhos, diz que sempre cuidou para não fetichizar ou glamourizar o tema e revela como surgem os títulos de seus livros.
Você vai participar de um debate sobre livro e cinema. Gostaria de saber como enxerga essa relação e quais são, em sua opinião, as possibilidades ainda a ser exploradas desse encontro de linguagens.
Embora seja antiga a relação entre o cinema e a literatura, que, na verdade, serviu de matriz para filmes desde o início do cinema, é sempre complicado pensar o processo de adaptação. Em primeiro lugar, porque são linguagens distintas, reinos de valores diferentes. E as pessoas acabam se esquecendo disso quando vão assistir a um filme adaptado de uma obra literária; não é incomum saírem dizendo "o livro é melhor". Ora, o livro é sempre melhor, porque único em sua forma e conteúdo. O cinema será necessariamente um diálogo com a obra literária ou algum comentário sobre algum de seus múltiplos aspectos. E aí pode ou não estar à altura do livro sobre o qual se debruçou. Mas compará-los friamente, livros e filmes, me parece infértil.
O Invasor, um de seus livros mais famosos - que, aliás, foi adaptado para o cinema - acaba de ganhar uma nova edição. Como você avalia a perenidade dessa obra? Por que, em sua opinião, ela não só continua atual como tem suscitado debates que não havia criado quando foi lançada originalmente?
O Invasor foi lançado junto com o filme do Beto Brant, em 2002, depois de um processo muito árduo de criação, uma vez que começou como livro, virou roteiro no meio do processo e voltou a ser livro depois de cinco anos. Pretendo nunca mais repetir esse tipo de experiência. Na minha opinião, a novela é uma fábula sobre a ambição e a culpa, e esses são temas centrais da existência humana e, portanto, caros a qualquer tempo. O Invasor, deliberadamente, tanto roteiro e filme quanto o livro, aborda situações de extrema violência, porém sem nunca mostrá-las de forma explícita (é um filme policial sem um tiro sequer) ou mesmo descrevê-las (não existe um soco no livro e no roteiro). Foi uma decisão minha já no início da escrita do livro, que foi encampada pelo Beto. Lembro que, logo que comecei a escrever a novela, em agosto de 1997, vi o filme Funny Games, do Michael Haneke, em que as cenas ultraviolentas se dão todas fora de quadro, não são vistas, têm de ser imaginadas sétima arte. Em entrevista ao POPULAR, Marçal Aquino fala de como lida com esse encontro de universos e revela como foi escrever o romance O Invasor já pensando-o como um roteiro para a telona. O autor explica ainda as razões que o fazem abordar a violência em seus trabalhos, diz que sempre cuidou para não fetichizar ou glamourizar o tema e revela como surgem os títulos de seus livros.
Você vai participar de um debate sobre livro e cinema. Gostaria de saber como enxerga essa relação e quais são, em sua opinião, as possibilidades ainda a ser exploradas desse encontro de linguagens.
Embora seja antiga a relação entre o cinema e a literatura, que, na verdade, serviu de matriz para filmes desde o início do cinema, é sempre complicado pensar o processo de adaptação. Em primeiro lugar, porque são linguagens distintas, reinos de valores diferentes. E as pessoas acabam se esquecendo disso quando vão assistir a um filme adaptado de uma obra literária; não é incomum saírem dizendo "o livro é melhor". Ora, o livro é sempre melhor, porque único em sua forma e conteúdo. O cinema será necessariamente um diálogo com a obra literária ou algum comentário sobre algum de seus múltiplos aspectos. E aí pode ou não estar à altura do livro sobre o qual se debruçou. Mas compará-los friamente, livros e filmes, me parece infértil.
O Invasor, um de seus livros mais famosos - que, aliás, foi adaptado para o cinema - acaba de ganhar uma nova edição. Como você avalia a perenidade dessa obra? Por que, em sua opinião, ela não só continua atual como tem suscitado debates que não havia criado quando foi lançada originalmente?
O Invasor foi lançado junto com o filme do Beto Brant, em 2002, depois de um processo muito árduo de criação, uma vez que começou como livro, virou roteiro no meio do processo e voltou a ser livro depois de cinco anos. Pretendo nunca mais repetir esse tipo de experiência. Na minha opinião, a novela é uma fábula sobre a ambição e a culpa, e esses são temas centrais da existência humana e, portanto, caros a qualquer tempo. O Invasor, deliberadamente, tanto roteiro e filme quanto o livro, aborda situações de extrema violência, porém sem nunca mostrá-las de forma explícita (é um filme policial sem um tiro sequer) ou mesmo descrevê-las (não existe um soco no livro e no roteiro). Foi uma decisão minha já no início da escrita do livro, que foi encampada pelo Beto. Lembro que, logo que comecei a escrever a novela, em agosto de 1997, vi o filme Funny Games, do Michael Haneke, em que as cenas ultraviolentas se dão todas fora de quadro, não são vistas, têm de ser imaginadas pelo espectador. Aquilo me animou a tocar em frente a minha estratégia literária.
Durante algum tempo, a literatura que falava mais sobre violência, crimes e o universo underground das grandes cidades foi rotulada e até discriminada. Essa percepção parece ter mudado bastante nos últimos tempos. Os autores que se dedicam mais a esse gênero ganharam prestígio e não são mais vistos como um gueto. A que você credita essa mudança?
A literatura policial sempre terá espaço e o apreço de leitores, assim como detratores. É normal, isso acontece com qualquer gênero literário. Não sei se houve alguma mudança nesse cenário.
O Brasil é um país com altos índices de violência. Alguns de seus trabalhos (livros, roteiros) falam disso de forma bastante contundente. Como você se sente ao tratar dessa temática? Como não se deixar abater com tantos casos escabrosos e ainda conseguir produzir arte a partir dessa realidade tão dura?
Não há como não se deixar afetar pelas mazelas do cotidiano, seja o sujeito escritor ou não. Minha literatura é de corte realista, fala da realidade. Assim, não poderia omitir a violência como temática, sob pena de estar fraudando alguma coisa ao abordar o real. Entendo que a violência é um tema tão legítimo como outro qualquer. A forma como esse tema é tratado faz toda diferença. E, acredite: nunca me ocorreu fetichizá-lo ou glamourizá-lo.
Os títulos de seus livros sempre me chamaram a atenção porque são surpreendentes: Famílias Terrivelmente Felizes, Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios. Como achar o título da obra? Como fazer para atiçar a curiosidade do leitor antes mesmo de ele ter aberto o livro?
Adoro livros a partir de seus títulos. E comigo já aconteceu diversas vezes de o título surgir muito antes de sequer eu suspeitar a narrativa em si. Foi assim com O Invasor e com Eu Receberia as Piores Notícias dos Seus Lindos Lábios, que me ocorreu uma noite, como uma frase que circulou pela minha cabeça. Achei intrigante, anotei no meu caderno de escritos, como sempre faço. Isso foi em 2000. Dois anos depois, quando comecei a contar a história de um fotógrafo que viaja ao Pará, onde se envolve com uma mulher bela e perturbada, lembrei daquele título estranho, que parecia mais um verso de bolero. E descobri que a história tinha nascido para o título e vice-versa. Acho até curioso que hoje pessoas comentem que adoram esse título e que chegaram a comprar o livro apenas por causa dele, já que não conheciam meu trabalho antes. Saiba que, no começo, muita gente torceu o nariz para esse título, chegaram a me aconselhar a não usá-lo. Os argumentos variavam: uns diziam que era estranho, longo demais, enquanto outros afirmavam ser anticomercial.
Programação
HOJE
9h -Conversa com Roger Mello e Odilon Moraes (Livro e Ilustração)
11h -Sessão de autógrafos com Roger Mello e Odilon Moraes
14h -Encontro com escritores Roger Mello e Odilon Moraes (Livraria da UFG)
15h -Conversa com Marçal Aquino e Fernando Bonassi
17h -Sessão de autógrafos com Marçal Aquino e Fernando Bonassi
17h -Encontro com a professora Maria das Graças Castro
19h -  Conversa com Zeca Baleiro
21h -  Sessão de autógrafos com o autor
AMANHÃ
9h - Conversa com Bariani Ortencio e Jadir Pessoa (Bariani - Homenagem ao Escritor Goiano)
10h- Lançamento das coleções Vertentes e Belamor (edital UFG de 2009)
11h- Sessão de autógrafos com Bariani Ortencio, Edmar Guimarães, José Marcio de Melo e Rogerio Luz
20h -Show de Zeca Baleiro (Teatro Rio Vermelho - Centro de Cultura e Convenções / Ingressos a R$ 120 (plateia inferior) e R$ 60 (plateia superior)