Jamais serão vencidos

Colegas, companheiros e camaradas, dirigido por Ranulfo Borges, faz panorama histórico do movimento estudantil em Goiás dos anos 50 aos dias atuais. Personagens e fatos marcantes são resgatados por meio de depoimentos


Da redação

Produzido com recursos da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, o filme Colegas, companheiros e Camaradas, vídeo documentário de média metragem dirigido por Ranulfo Borges, faz um panorama histórico do movimento estudantil em Goiás, a partir do final dos anos 50 aos dias atuais. Personagens e fatos marcantes são resgatados por meio de depoimentos, material de arquivo e cenas da atualidade, e a obra traz entrevistas com líderes e militantes de várias gerações – entre eles, os ex-deputados federais Tarzan de Castro e Aldo Arantes, o professor de jornalismo da UFG Juarez Ferraz de Maia, o ex-deputado federal e ex-prefeito de Goiânia Pedro Wilson Guimarães, a ex-deputada estadual Denise Carvalho, o professor da PUC Goiás Gil de Paula, o professor de cinema da UFG Lisandro Nogueira e o jornalista Renato Dias.
Foram colhidas ainda depoimentos de Luiz Carlos Orro, Igor Campos, Henrique Lemos, Pedro Ivo Guerra e de representantes atuais do movimento, ligados à União Goiana de Estudantes Secundaristas (UGES) e ao Movimento Estudantil Popular Revolucionário (MEPR). Os militantes dos anos 50 e 60 falam sobre tempos áureos do movimento secundarista, quando o Lyceu era o principal colégio de Goiânia e o Castelinho (prédio do Lago das Rosas) abrigava a sede da UGES.
Seguindo a ordem cronológica dos acontecimentos, os personagens contam histórias sobre a militância durante ditadura militar, os estudantes goianos desaparecidos, a participação no processo de redemocratização do País, as manifestações dos cara-pintadas em Goiânia, e a militância nos dias atuais. Comentam também sobre a relação dos estudantes com o contexto político de cada época, tanto em Goiás, como no Brasil e no mundo. A revolução cubana, os governos de Jânio Quadros e João Goulart, o governo de Mauro Borges, a campanha das Diretas Já e o apoio de entidades estudantis ao governo Lula são alguns dos temas trazidos à tona pelos entrevistados.

Histórias
Tarzan de Castro, Pedro Wilson Guimarães, Aldo Arantes e o professor Juarez Ferraz de Maia contam histórias dos anos 50 e 60, época em que as entidades estudantis estavam entre os principais movimentos sociais organizados do Estado. Falam também de suas participações na luta contra o governo militar, quando muitos estudantes goianos foram presos e torturados e alguns foram mortos, como é o caso de Marco Antônio Dias Batista e Honestino Guimarães. Aldo Arantes se destacou nacionalmente quando se elegeu presidente da UNE em 1961, durante o governo de Jânio Quadros, e conta como foi sua atuação à frente da entidade.
O comício das Diretas Já, realizado na Praça Cívica, em 1984, também é lembrado com vídeos e fotos da época, com destaque para as presenças de Ulisses Guimarães, o cartunista Ziraldo e o cantor Belchior. Depoimentos de Denise Carvalho, Luiz Carlos Orro e Gil de Paula resgatam a atuação dos estudantes goianos na luta pela redemocratização do País, por meio de passeatas, greves e a participação na campanha pelas eleições para presidente.
Também dos anos 80, o professor Lisandro Nogueira, fala de sua participação no Cineclube Antônio das Mortes. Ele, Lourival Belém e os outros integrantes do grupo encontraram no cinema, um caminho de participação e militância política. Promoviam mostras e debates em Goiânia, no interior e em outros Estados, com presença de jovens, trabalhadores e públicos de comunidades carentes. Da década de 90, o documentário resgata a participação dos goianos no movimento "Caras Pintadas", que levou os estudantes às ruas para pedir o impeachment do presidente Fernando Collor de Mello.
O filme mostra também ações da geração atual. Um vídeo traz manifestação de estudantes e ativistas goianos realizada em frente ao Clube Militar do Rio de Janeiro em 2008, onde oficiais debatiam a possível revisão por parte do governo federal da Lei de Anistia, o que levaria a julgamento acusados de torturar presos políticos durante a ditadura. Os manifestantes, entre eles, Tales de Castro, Igor Campos e Waldomiro Batista (Mirinho), ficaram frente a frente com militares de reserva que teriam atuado nas forças de repressão na época da ditadura. Entre os presentes estava o deputado Jair Bolsonaro (PP), que também é militar de reserva. Em uma acalorada discussão com os estudantes goianos, o deputado defende a ação dos torturadores.  
Na parte final, o filme promove uma discussão sobre o papel do movimento estudantil atual. Para alguns dos antigos militantes, os estudante entraram em estado de letargia e as entidades que os representam se tornaram submissas aos governos. Para outros, os estudantes continuam atuantes, mas de outras formas, que estariam mais de acordo com o contexto político e social de nossa época.

Arquivo
O material de arquivo inclui fotos, revistas, jornais, livros, cartazes e vídeos obtidos em centros de documentação públicos, internet e acervos particulares. Entre esses documentos históricos, inclui-se uma foto de 1959, que mostra Tarzan de Castro, ainda adolescente, discursando no Palácio das Esmeraldas, como presidente da UGES, na cerimônia em que o governador José Feliciano doa o Castelinho (antigo prédio localizado no Lago das Rosas) aos estudantes.
Um marco para o movimento estudantil em Goiás, o Castelinho foi destruído durante o regime militar. Era o local onde alunos do Lyceu, Pedro Gomes, Ateneu Dom Bosco e outros colégios se reuniam para discutir e planejar greves e manifestações, que tinham grande repercussão e, muitas vezes, "paravam a cidade". Do antigo prédio, resta apenas um coreto, onde foram colhidos depoimentos de Tarzan de Castro, presidente da UGES nos anos 50, e dos atuais dirigentes da entidade. Outro ponto histórico é a Praça Universitária, um dos principais palcos do movimento estudantil de todas as épocas, que também serve como cenário para um depoimento. A importância deste local é resgatada em fotos e material de arquivo.
Colegas, Companheiros e Camaradas tem direção e roteiro do jornalista Ranulfo Borges. A trilha sonora é assinada por Welliton Carlos, com tema especial ao piano do maestro e compositor Beto Strada. A edição é Renato N. Prado, que também fez a captação de imagens com Marcos Vinícius Brito.

O filme
A narrativa segue uma ordem cronológica que é dividida por décadas, começando pelo final dos anos anos 50, quando o Colégio Lyceu reunia as principais lideranças estudantis da época, entre elas, Tarzan de Castro, Pedro Wilson Guimarães, Aldo Arantes e Íris Rezende. Como explica Tarzan de Castro, havia poucas faculdades em Goiânia e inexistiam movimentos sociais organizados, por isso os secundaristas se destacavam como força política e tinham grande poder de mobilização, assumindo um papel que ia além de suas funções. Eles “paravam” a cidade em greves e manifestações contra os preços de mensalidades nas escolas e nas passagens de ônibus.
A entidade que os representava era a União Goiana dos Estudantes Secundaristas (UGES), cuja sede ficava no Castelinho, prédio localizado no Lago das Rosas, que lhes foi doado pelo governo de José Feliciano em 1959. 
Um marco dos anos 50 lembrado no filme é o massacre de estudantes durante uma manifestação na Praça do Bandeirante realizada no dia cinco de março de 1959. Muitos saíram feridos por tiros disparados pela polícia. O episódio dá origem ao nome do jornal Cinco de Março, criado posteriormente pelo jornalista Batista Custódio.
Depois vieram os anos 60 e o movimento estudantil vai assumindo uma força cada vez importante nas lutas que se travavam no País durante os governos de Jânio Quadros e de João Goulart. Essa década presenciou as primeiras grandes mobilizações em defesa de reivindicações de caráter educacional. A chamada “Reforma Universitária” consistiu numa das mais importantes bandeiras do movimento estudantil.
Aldo Arantes, que então estudava no Rio de Janeiro, fala do trabalho que desenvolveu nessa época como presidente da União Nacional de Estudantes, num dos períodos mais ricos da história da entidade. A UNE, que juntamente com outras instituições formaram a Frente de Mobilização Popular, defendia mudanças sociais profundas no País, entre elas, a Reforma Universitária como parte das reformas de base propostas no governo Jango. Aldo conta também sobre a UNE Volante, que percorria o país com atividades culturais e políticas e promovendo a discussão sobre a Reforma Universtária.
O professor Juarez Ferraz  também conta sobre sua militância nos anos 60. Ele ocupou a presidência da Confederação Goiana de Estudantes e, posteriormente, ingressou na Ação Popular (AP), grupo surgido a partir da atuação dos militantes da Juventude Universitária Católica (JUC) e que tinha entre seus membros Herbert José de Souza, o Betinho, José Serra, Aldo Arantes, além de lideranças camponesas e operárias. Também fez parte de outros grupos que se opunham ao regime militar, entre eles o VAR - Palmares, do qual participava Dilma Roussef.
Juarez, Tarzan e Aldo contam histórias dos anos de chumbo, quando passaram a atuar na clandestinidade, foram presos, torturados e seguiram para o exílio. Além deles, outros estudantes goianos tiveram atuação destacada contra a ditadura e alguns deles pagaram com a própria vida. O depoimento do jornalista e sociólogo Renato Dias resgata um pouco das histórias de Honestino Guimarães, Paulo de Tarso Celestino e de seu irmão, Marco Antônio Dias Batista, estudante secundarista que tinha 15 anos quando foi preso, torturado e morto pelos militares e seu corpo nunca foi encontrado.
No filme há espaço também para a discussão sobre a situação do movimento estudantil na atualidade, que vive um estado de letargia e está submisso ao poder. Essas críticas levam ao confronto de opiniões entre os entrevistados, pois para outros, os jovens continuam atuantes na vida política, só que em outras frentes.


Ficha técnica:
Título: Colegas, Companheiros e Camaradas
Gênero: documentário
Duração: 63 minutos
Mídia: vídeo digital (Mini-DV)
Direção e roteiro: Ranulfo Borges
Lançamento: 9 de maio de 2011
Local: Cine Goiânia Ouro
Horário: 20 horas
Informações: 8448-6132 (Ranulfo)