Biblioteca na palma da mão
Thaís Lobo Estagiária convênio Fasam/Tribuna
Inserção dos livros digitais e tablets nas escolas, embora ainda tímida no Brasil, inaugura uma nova era no processo de ensino-aprendizagem
Ele já tem 40 anos, mas muitos brasileiros nem sabem que ele existe. Agora, o livro digital ou ebook ressurge com a revolução tecnológica que o traz em um novo suporte que promete transformar o modo como lidamos com a informação e também com o ensino nas salas de aula.
Criado em 1971, nos Estados Unidos, o ebook nasceu com a proposta ousada de digitalizar, arquivar e distribuir todos os livros do mundo. Até então, eles só poderiam ser lidos em computadores e mais recentemente em notebooks, celulares e palms.
A procura por uma leitura cada vez mais versátil levou ao desenvolvimento dos primeiros tablets ou e-readers (leitores de livros digitais).
Através da Amazon, uma das principais empresas especializadas em comércio eletrônico, os estadunidenses novamente inovam ao lançar, em 2007, o Kindle.
O pequeno equipamento possibilitava acessar o site da Amazon, baixar os livros e lê-los no próprio aparelho.
Esse foi o primeiro tablet realmente significativo que modificou a estrutura do mercado editorial e lançou novas possibilidades para o livro digital.
Mas foi somente em 2010, com o lançamento do iPad, da gigante Apple, que o futuro do livro impresso começou a ser debatido.
Jornalismo digital
A diferença é que o aparelho da Apple traz mais recursos. Ele é touchscreen, acessa internet (e não só o site da Amazon, como o Kindle) e possui diversos aplicativos que vão desde a diversão banal dos games até aplicativos de controle financeiro e de apoio pedagógico para os estudantes.
O sucesso não demorou a chegar. Em fevereiro deste ano, por exemplo, foi lançado o The Daily, jornal norte-americano exclusivo para o iPad.
Para não perder o título de pioneiros nessa área, os Estados Unidos também já tem escolas adotando o aparelho como item obrigatório nas escolas. O objetivo é substituir os cadernos e livros nas salas de aula.
Embora ainda de forma muito tímida, o Brasil começa a se render aos apelos dos livros digitais.
No Colégio Dante Alighieri, em São Paulo, uma experiência concreta já está sendo desenvolvida. "Aqui temos algumas ações incipientes e alguns projetos pilotos. Estamos testando equipamentos e tateando as possibilidades da inserção dessa tecnologia em sala de aula", explica a coordenadora do Departamento de Tecnologia Educacional, Valdenice Minatel.
Na unidade educacional paulistana são oferecidas oficinas de Jornalismo para estudantes da segunda fase dos ensinos Fundamental e Médio. Durante as atividades, eles são incentivados a utilizarem os diversos dispositivos eletrônicos que existem hoje no mercado.
A geração da imagem
Outra iniciativa dos educadores é observar os alunos que trazem os aparelhos eletrônicos para a sala de aula.
Segundo Valdenice, como se trata de novidade, a direção do colégio tem buscado ouvir os alunos que levam tablets para "entender esse processo".
A meta da escola é buscar uma solução que seja adequada a realidade dos jovens de hoje, já que o grande sucesso dos tablets está baseado no fato do equipamento atender as necessidades dos nativos digitais.
"Tudo que é multimídia desperta o interesse dos adolescentes porque exercita todos os sentidos", argumenta a coordenadora.
Em Goiânia, uma das primeiras experiências é a do Colégio Ávila COC, que abriu as portas para os tablets.
A iniciativa quer ir de encontro aos interesses da "geração da imagem", conforme definição da supervisora Lílian Maria Cintra Campos. "Os alunos estão acostumados a aprender por intermédio dela [imagem]", justifica.
Segundo ela, a escola já possui os livros e as apostilas em versão digital. Acervo que funciona como apoio ao material convencional.
A supervisora destaca ainda que todas as salas de aula do colégio possuem lousas eletrônicas e os professores utilizam um programa educacional específico: o Builder.
Além disso, por meio das lousas eletrônicas, os educadores fazem pesquisas em tempo real e ainda podem exibir filmes, experiências e desenhos. "Esses recursos potencializam as aulas", diz Lílian.
Mundo, vasto mundo!
O aluno do 3° ano, Guilherme Fernandes,16, gosta da interação com o mundo virtual.
Ele sempre carrega o seu notebook ou o iPad do colega para a sala de aula e garante que isso o ajuda no processo de aprendizagem.
"Eu acho muito chato e muito antigo", brinca o estudante ao se referir aos cadernos e livros impressos em papel.
"Além do livro digital você tem acesso à internet. Então uma coisa que o livro não tem, você pode abrir direto no Google e achar. É bem melhor trabalhar com o tablet", afirma.
Mas o uso dos tablets como recurso pedagógico tem deixado muitos profissionais preocupados.
Para o diretor da Editora Contexto, Daniel Pinski, os tablets são uma possibilidade pedagógica bastante interessante porque oferece interatividade.
"A criança pode mexer, clicar, fazer com que apareça uma imagem, mas eu não consigo enxergar um substituto para o livro. Se todos os livros forem de filminhos e musiquinhas nós perderemos muito porque a imaginação não é tão estimulada quando você já está dando respostas", comenta Pinski.
Já a professora da UFG Débora Duran, autora do livro Letramento Digital e Desenvolvimento: das Afirmações às Interrogações, acredita que o imbróglio não diz respeito aos aparelhos, mas às práticas sociais de leitura realizadas nas escolas.
"O desafio para nós, profissionais da Educação, é despertar o interesse dos alunos pelas múltiplas leituras que envolvem as linhas e entrelinhas, e que ultrapassam os textos para além das linhas".
Sendo assim, para Débora, o potencial do livro digital como recurso didático não deve ser discutido apenas "em função do caráter provocativo do aparelho, já que os meios não podem ser confundidos com os fins".
Os desafios
A professora ressalta que a sociedade está diante de um desafio pedagógico e não apenas tecnológico. E justifica: "As mediações humanas e não apenas as mediatizações tecnológicas é que irão revelar, ou não, o potencial dos tablets".
Outra discussão que não pode ser esquecida diz respeito à capacitação dos professores.
Para Valdenice, "os dispositivos móveis" abrem novos paradigmas e o educador deve estar aberto para aprender com os próprios alunos e refletir em que momento esses equipamentos podem ser inseridos no contexto do aprendizado.
Mas além do querer aprender do professor, há outros fatores que precisam ser refletidos.
Na opinião de Débora, as ideias de inclusão e Educação para a cidadania não podem ser limitadas à "mera instrumentalização de usuários, pois isso aponta para a necessidade de formação de profissionais capazes de compreender e de se posicionar diante das implicações sociais, éticas, econômicas e políticas atreladas ao avanço tecnológico".
E o Brasil, onde fica?
Discussões à parte, a realidade brasileira ainda está distante dessas inovações tecnológicas que inundam o mundo.
Em pesquisa realizada pela GFK, 67% dos brasileiros ainda não conhecem o ebook. De acordo com o diretor da Editora Contexto, Daniel Pinsky, hoje as vendas dos livros digitais no mercado nacional ainda são irrelevantes.
Em compensação, atualmente nos Estados Unidos, a Amazon já comercializa mais livros na versão digital do que na impressa em papel.
Para Pinsky, a razão do pouco sucesso dos ebooks no Brasil se deve ao pouco investimento que houve no setor.
Esse desinteresse resultou numa pequena oferta de conteúdos e nos altos preços dos tablets. Mas essa realidade pode mudar.
No mês passado, a presidente Dilma Roussef aprovou medida provisória que enquadra os tablets na Lei do Bem.
Essa lei garante incentivos fiscais para a produção de computadores no país com a intenção de, futuramente, diminuir o preço dos equipamentos e inseri-los nas escolas públicas brasileiras.
A iniciativa, claro, reduzirá paulatinamente o uso dos livros didáticos tradicionais. Uma experiência inédita nesse sentido já vem sendo realizada pelo governo sul-coreano.
A Coréia do Sul já começou a adquirir os primeiros tablets para uso dos alunos e a meta é a substituição total do material didático até 2014. A partir daí, os livros tradicionais só poderão ser encontrados nas bibliotecas.
Plano em discussão
O Brasil ainda não tem um plano específico para a aplicação dos tablets nas escolas brasileiras, mas o assunto tem sido discutido em conjunto pelos ministérios da Comunicação, Educação e da Ciência e Tecnologia.
E somente esse debate já tem repercutido. "Eu acho que a substituição definitiva poderá acontecer nos próximos anos. É até necessário porque essa medida traz um monte de soluções. Diminui a utilização de papéis e o desconforto dos alunos em carregar tanto material", acredita Lílian Maria Cintra Campos, supervisora do Colégio Ávila COC.
Conforme ela, isso será um passo importante tanto na literatura quanto na informação. Na escola de Lílian, por exemplo, a partir de 2012 todo o material didático utilizado por alunos e professores será digitalizado.
Já a professora Débora Duran sugere maior cautela. Para ela, a disseminação do uso dos tablets nas escolas públicas não significa apenas benefícios.
"Vai depender das práticas sociais de apropriação desenvolvidas em contextos educacionais específicos. Portanto, não podemos confundir revolução tecnológica com revolução pedagógica".
Porém, a partir da realidade brasileira, essa revolução ainda vai demorar um pouco a chegar. Prova maior disso são os dados da pesquisa realizada pela GFK, onde 71% dos entrevistados não enxerga o livro digital como uma ameaça à versão impressa, contrariando a tendência mundial. Mas isso, só o futuro dirá!
Nome aos bois
Ebook – Ou e-book é a versão digital do livro de papel. Pode incluir somente textos ou textos e imagens.
Tablet - Computador (foto) em forma de prancheta eletrônica, que não usa teclado e tem tela sensível ao toque.
E-readers – Equipamento utilizado para leitura dos textos e outros conteúdos em formato digital.
Kindle - Leitor exclusivo de livros digitais, o tablet lançado pela Amazon acessa os livros disponibilizados exclusivamente pelo site da empresa. Hoje são mais de 88 mil títulos.
Iphone - Produzido pela Apple é uma convergência de mídias. Reúne as funções de câmera digital, Ipod, internet e telefone.
iPad – Evolução do tablet lançada pela Apple, é um híbrido de Iphone e notebook.
Touchscreen – Sistema de reconhecimento de toque na tela. Foi uma revolução no mundo das novas tecnologias.