Mudanças na medicina
CFM reconhece novas especialidades médicas que vão tratar desde enfermidades ligadas ao sono até a dengue
Por outro lado, resolução exclui existência de áreas como reprodução humana, perícia, aeroespacial e cirurgia de coluna
Wanda Oliveira e Lethícia Ávila
Editoria de Cidades
Três novas áreas de atuação médica são reconhecidas oficialmente pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Tratam-se das medicinas do sono, paliativa e tropical, que passam a ser associadas a uma série de especialidades. As mudanças fazem parte da Resolução 1973/2011, publicada no dia 1º de agosto no Diário Oficial da União. O objetivo da medida é que o profissional poderá, a partir de agora, receber treinamento adicional específico durante o programa de residência.
Por outro lado, com a resolução, deixaram de ser tratadas como áreas de atuação a cirurgia de coluna, perícia médica, reprodução humana e medicina aeroespacial. O secretário-geral da Associação Médica Brasileira (AMB), Aldemir Soares, explica que a partir de agora, no caso dos especialistas em ginecologia e obstetrícia, eles não precisam de certificado específico na área de reprodução humana para atuar nesse tipo de modalidade médica.
De acordo com a medida, os titulados em Medicina do Sono terão como pré-requisito especialização em Neurologia, Psiquiatria, Pneumologia e Otorrinolaringologia. A paliativa está vinculada à clínica médica, cancerologia, geriatria e gerontologia, medicina de família e comunidade, pediatria e anestesiologia. Já a tropical está ligada à infectologia, que estuda o tratamento de doenças como a malária, febre amarela, dengue e leishmaniose.
A medida amplia ainda as áreas de atuação de medicina da dor e da hepatologia, associadas também à acupuntura, medicina física e reabilitação, neurocirurgia e ortopedia e traumatologia. A especialidade medicina legal passa a ser denominada medicinal legal e perícia médica. Ao mesmo tempo, deixam de ser tratadas como áreas de atuação a cirurgia da coluna, perícia médica, reprodução humana e medicina aeroespacial.
Aldemir Soares diz que essa atualização das áreas de atuação está ligada ao desenvolvimento da medicina no País, que também acompanha os avanços científicos no mundo inteiro. Afirma que, oficialmente, essas novas áreas estão valendo, mas ao que tudo indica, o reconhecimento dos primeiros titulados só deve acontecer em 2012.
De acordo com Soares, no caso de residência, como os cursos já começaram este ano em todas as universidades do Brasil, o prazo previsto é de um ano para o início de especialização nas áreas de Medicinas do Sono, Paliativa e Tropical. Ele acredita que a certificação por parte das sociedades brasileiras, em cada especialidade médica, deve ser reconhecida em seis meses.
Soares informa que os cursos já existem, mas cada área segue regra própria. A AMB vai formatar o modelo de grade ideal de cursos e em seguida definir quem está habilitado para se submeter às provas, a fim de obter o certificado de especialista em uma das novas áreas de atuação médica. Segundo ele, qualquer área reconhecida pelo CFM pode ser extinta porque a sua permanência depende do desenvolvimento da medicina.
"Não adianta reconhecer algumas subespecialidades e não ter profissionais suficientes. É preciso formar médicos e, para isso, é necessário ter discussão antes." Regularmente, a Comissão Mista de Especialidade (CME), o CFM e a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM) se reúnem para decidir quais áreas de atuação médica podem ser criadas ou extintas no País.
O presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás (Cremego), Salomão Rodrigues Filho, considera as mudanças positivas. Ele diz que o órgão federal está apenas legalizando áreas que já existiam ao estabelecer normas claras de atuação. "As alterações estimulam o médico que se dedica a uma dessas novas áreas a estar mais preparado na profissão. Isso vai garantir também serviços de maior qualidade para o paciente", diz.
O presidente da Associação Médica do Estado de Goiás, Rui Gilberto Ferreira, afirma que o Conselho Federal de Medicina está apenas legalizando áreas que muitos médicos já se dedicam há anos. Segundo ele, a resolução vai normatizar o ensino e, com isso, abrir vagas para estagiários, principalmente para aquelas pessoas que já se dedicam a essas áreas. Os pacientes também acabam sendo bem mais atendidos de uma maneira geral no futuro.
MEDICINA DO SONO
Uma das três novas áreas de atuação médica previstas na resolução do CFM engloba a medicina do sono. Ao ingressar em programa de residência da especialidade Otorrinolaringologia, por exemplo, o médico pode, a partir de agora, receber treinamento adicional específico nesta área.
Otorrinolaringologista e especialista em Medicina do Sono desde 2004, Fernanda Silveira Chrispim explica que a resolução surge para oficializar a área e dar mais segurança e proteção aos especialistas do ramo. “É uma luta nossa de muito tempo, na verdade, foi uma guerra. Agora, o ramo vai ser aceito como área de atuação. Anteriormente, ele não era reconhecido como em outros países. No Brasil, ainda é uma área recente, pois tem pouco mais de 20 anos”, afirma.
Fernanda aponta que a oficialização da Medicina do Sono veio para acrescentar e dar reconhecimento a esses profissionais, além de possibilitar a Associação Brasileira de Medicina do Sono a ter maior controle dos laboratórios associados para a prática do exame de polissonografia, realizado para diagnosticar os distúrbios do sono.
No entanto, a médica frisa que a decisão imposta pelo CFM não vai restringir especialistas de outras áreas a continuarem tratando os problemas relacionados ao sono, nem tampouco impedir que esses profissionais continuem direcionando os pacientes para tratar o problema.
“A área de Medicina do Sono é multidisciplinar. O que muda é mais na questão do laboratório de sono, que deve ter um médico apto para realizar os exames. Agora, relacionado às queixas dos pacientes em relação aos distúrbios do sono, elas são diagnosticadas por profissionais de diversas áreas, e isso continuará acontecendo, cada um atuando nas suas funções e encaminhando para o profissional do sono para realização de exames caso seja necessário.”
REPRODUÇÃO
Outras mudanças atingiram áreas da medicina e causaram descontentamento para esses profissionais. Uma delas foi a reprodução humana, que até a decisão do Conselho Federal de Medicina (CFM) era tratada como área de atuação da ginecologia. Com as alterações, os campos de reprodução humana, cirurgia de coluna, perícia médica e medicina aeroespacial deixam de ter o certificado como área específica.
A modificação do campo foi reprovada pelo ex-presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana e professor do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de Goiás (UFG), Waldemar Naves do Amaral. O médico salienta que a área de reprodução foi a que mais obteve avanços científicos na especialidade ginecológica e argumenta que a área é “altamente solicitada, de grandes investimentos tecnológicos que são transformados em benefícios para a população”.
Amaral aponta que havia uma desejo da classe em lutar para que o ramo se transformasse em uma especialidade médica e acredita que a mudança proposta na resolução foi um retrocesso. “A decisão caminhou no sentido oposto às nossas expectativas, e quando ela recua na defesa do médico, o profissional da área recua também na forma de atuação do profissional. Ela está encolhendo o setor, que é totalmente grandioso, e tem grande respaldo populacional”, alerta. O médico diz ainda que continuará lutando para que a reprodução seja, no mínimo, vista como área de atuação.
Saiba mais
Confira quais são as novas áreas
Medicina do sono – uma área da saúde que estuda as funções do sono, os seus distúrbios e o impacto destes na vida dos indivíduos. Incluída nas especialidades de Otorrinolaringologia, Neurologia, Psiquiatria e Pneumologia;
Medicina paliativa: trata de pacientes com estado de saúde irreversível e incurável, dando ao indivíduo suporte de ar, água, alimento, analgésico e conforto. Incluída nas especialidades de Clínica Médica, Geriatria e Gerontologia, Medicina de Família e Comunidade, Pediatria e Anestesiologia;
Medicina tropical: é dedicada ao estudo e tratamento de doenças como malária, febre amarela, dengue, leishmaniose, entre outras enfermidades típicas de regiões tropicais. Incluída na especialidade de Infectologia;
Dor: A área de atuação da dor, que já existia, passa a ser associada também à acupuntura, medicina física e reabilitação, neurocirurgia, ortopedia e traumatologia.
Exclusões de áreas
Cirurgia da coluna
Medicina aeroespacial
Perícia médica
Reprodução humana