[UFG] Arte Instigante (O Popular, 18/08/11)
Arte instigante
A artista plástica Suyan de Mattos recorre à mitologia grega para criar uma nova instalação inspirada em Sol LeWitt
Ana Cláudia Rocha 18 de agosto de 2011 (quinta-feira)
Foto da artista Suyan de Mattos
Uma viagem à mitologia grega e um mergulho em sentimentos como inquietação, estranheza e desorientação. Tudo isso está impresso no novo trabalho da artista plástica Suyan de Mattos, que ela expõe a partir de hoje na Galeria da Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás. A individual Hades das Artes: A Exumação da Memória Recente pode ser visitada até o dia 16 de setembro. São 36 fotografias em preto e branco com 25 x 25 cm.
A mostra foi divida em dois momentos: no primeiro, no mês de junho, a artista fez uma performance da qual retirou as imagens que estão sendo expostas. As fotografias documentam detalhes da exumação e do enterro de um cubo enferrujado. A artista explica que a inspiração veio a partir do questionamento do escritor Georges Didi-Huberman no livro O que Vemos, o que nos Olha . Ela tenta responder por meio da obra Buried Cube Containing an Object of Importance but Little Value, de Sol LeWitt. A obra do artista, de 1968, é tida como desaparecida. Por isso, Suyan repete o ato da exumação e do enterro, trazendo a proposta de arte de Sol LeWitt para os dias atuais. Ela é fiel aos fatos, repetindo inicialmente até mesmo a quantidade de personagens envolvidos: quatro convidados para assistir à cerimônia e outro convidado para desenterrar e enterrar novamente o cubo. Assim como fez Sol LeWitt na Holanda. Durante a cerimônia em Goiânia, no entanto, surgiu um sexto personagem, um aluno da UFG que integrou a performance.
"Ao ser exumada, ela será enterrada novamente como foi feito na Holanda, para voltar a estar desaparecida. Como a obra foi dada como desaparecida, para realizar a exumação foi necessário resgatar o cubo que estava abaixo da terra. Estando localizado no submundo, ele pode ser resgatado por qualquer entrada, já que o inferno tem múltiplas entradas", detalhe Suyan, usando uma linguagem metafórica. Ela recorre a mitos como Hades e Cérboro para situar sua obra (veja quadro). Assim, a artista representou o processo de exumação e enterro do cubo, com cenas registradas em fotografias agora expostas.
Suyan de Mattos é uma artista que leva sentimentos ao espectador. Sua arte traz intervenções urbanas discutidas no mundo contemporâneo. Trabalha sempre com instalação e arte-objeto. Impactantes, os objetos que cria costumam causar estranhamento no público. Questionadora, ela leva paixão ao que cria.
Retomada de vida
Um trabalho recente que também deu o que falar foi formado por diversos corações com intervenções artesanais. O momento de criação daquela fase foi particularmente especial. Suyan experimentava uma fase nova e difícil na vida. Ela se recuperava de uma encefalomielite que deixou sequelas como surdez e a dificuldade de andar.
Para chegar a essa etapa, é bom conhecer um pouco mais a história de vida dessa artista. Suyan de Mattos, nascida no Rio de Janeiro, mas residindo em Brasília desde muito jovem, é formada em História, com doutorado em História da Arte e pós-doutorado em Artes. Foi professora durante anos e dedicou-se à arte-educação. As exposições se tornaram regulares no início dos anos 90. Seus trabalhos já foram expostos em diversos salões do Brasil e do exterior, com algumas premiações. Suyan já fez também cenografias para algumas peças teatrais.
A rotina de múltiplas atividades como artista plástica e professora de artes, que incluía viagens ao exterior, teve de ser interrompida e revista após ela sofrer uma grave e rara doença. Durante uma viagem ao litoral do Rio Grande do Norte na semana do carnaval, ela sentiu fortes dores de cabeça. De volta a Brasília, passou por vários exames e internações até descobrir a encefalomielite. Com as limitações, teve se voltar a morar com a mãe - hoje sua fiel companheira - e reduzir suas atividades. A arte saiu ganhando, já que Suyan se aposentou por invalidez e decidiu ser apenas artista. A inquietação se tornou ainda maior, abrindo espaço para a criatividade que pode ser medida nessa nova série.
Entenda melhor
Na mitologia grega, Hades é o deus dos mortos, o responsável por governar o mundo subterrâneo e as almas após a morte. Por sua ligação com a morte, era um deus muito temido. Hades raptou a deusa Perséfone, para viver com ele no mundo subterrâneo, criando assim uma ligação entre a vida e a morte. Hades tinha um companheiro inseparável, seu cão Cérbero, com várias cabeças, aquele que guardava a entrada do reino dos mortos.