Dinheiro não melhora aprendizado

São Paulo (AE) - O dinheiro que os municípios recebem do governo federal para investir em educação não faz com que os alunos aprendam mais e, consequentemente, que as escolas tenham melhores resultados no Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb). Essa é a conclusão da tese de doutorado defendida pelo professor Josedilton Alves Diniz na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da Universidade de São Paulo (USP). "Meu interesse era verificar se as transferências da União, que chegam aos Estados e municípios atreladas a usos específicos, geram maior eficiência na aprendizagem. Descobri que não", afirma Diniz.

Dos quatro programas considerados, apenas um contribui com a eficiência: o Programa Nacional de Alimentação Escolar. Os outros três não geram eficiência (retorno do dinheiro investido em termos de aprendizagem). São eles: Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE); e Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (PNATE).

Para chegar a esse resultado, Diniz elaborou uma ferramenta estatística que relacionou o volume de recursos dos quatro programas e a evolução no Ideb de 3.013 municípios no período de 2004 a 2009. O resultado considerou o total de municípios. Na leitura dos dados, apenas os recursos da alimentação tiveram relação positiva no Ideb.

Por outro lado, o estudo mostrou um avanço no Ideb naqueles municípios em que o dinheiro investido para cada estudante é maior por causa de programas para que os alunos permaneçam mais tempo na escola e para que se diminua a quantidade de alunos por sala de aula e o número de alunos por professor. "Isso mostra que, se quisermos atrelar os repasses à melhoria nos resultados, é preciso dar mais autonomia aos gestores", avalia o pesquisador.

Ele exemplifica com os recursos direcionados ao transporte, que são repassados às escolas rurais de acordo com o número de alunos. Segundo Diniz, há municípios em que, de fato, é preciso gastar todo o montante com transporte. Mas, naqueles em que não há necessidade, o ideal seria o remanejamento do repasse. "Do jeito que está hoje, uma escola rural do interior de São Paulo e outra no miolo da Amazônia recebem o mesmo valor por aluno. É preciso diferenciar o que é a universalização de um direito e o sistema engessado que isso pode criar", afirma.

Para Nelson Cardoso, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás (UFG), o problema é trabalhar com políticas amplas em um País muito desigual. "Temos de pensar numa forma de conciliar a federalização com a autonomia e as peculiaridades regionais." Segundo Naércio Menezes, do Insper, a pesquisa sinaliza como é tênue a associação direta que se costuma fazer entre infraestrutura física e qualidade. "O que importa, em última instância, é o aprendizado."

O professor Ângelo Ricardo de Souza, especialista em financiamento da Universidade Federal do Paraná (UFPR), defende a existência dos recursos vinculados. "Eles são fundamentais. Estímulos a outros fatores de impacto da aprendizagem já devem estar contidos no orçamento do município. Esses repasses não podem ser vistos como dinheiro a mais. Foram criados para esse fim e pronto."

Além disso, acrescenta, o repasse sem destino certo abre mais precedentes para desvios de verba pública, uma vez que dá abertura para todo tipo de gasto. Por fim, diz ele, é preciso considerar a qualidade técnica de quem vai gerir esses recursos. "Tenho dúvida se os gestores dos 5 mil municípios teriam competência para elencar prioridades e criar um plano de trabalho que relacionasse, corretamente, investimento monetário com aprendizagem." É a mesma opinião de Amaury Gremaud, da FEA Ribeirão Preto. "Num mundo ideal, os gestores teriam autonomia e competência, mas em educação não temos uma história de gestores tão eficientes assim."

Ensino de qualidade na periferia

Uma escola na periferia de Parnamirim é um exemplo de que medidas simples e o envolvimento de professores, pais e diretores valem mais do que dinheiro. Na Escola Municipal Professora Enedina  Eduardo Nascimento, no Jardim Cohabinal,  o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) deu um salto. Passou de 3.7, em 2009, para 5.0 no ano passado, superando a meta de 4.1 fixada pelo Ministério da Educação para 2011. A meta do governo é chegar a 2012 com nota seis na rede pública. Isso porque essa é a média registrada em países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) - o que a torna um padrão internacional de qualidade.

A Enedina tem atualmente 540 alunos distribuídos no ensino infantil, ensino fundamental e no EJA  (Educação de Jovens e Adultos). Logo na entrada, um cartaz de boas-vindas apresenta os valores que a escola desenvolve e procura preservar na sua prática diária: criatividade, participação, excelência, visão de futuro. "Temos um compromisso com a melhoria da qualidade do ensino", diz a diretora Liane Morais. Além dela, a equipe é composta  por 15 professores, vice-diretor, mediador de leitura e o pessoal de apoio.

Um outro fator considerado positivo para o sucesso no Ideb é a identidade da escola com a comunidade em que está inserida. É uma grande família. Os alunos entram no ensino infantil e vão atingindo os estágios seguintes na mesma escola, com os mesmos professores. "Quando a gente percebe que um aluno precisa de reforço no aprendizado, adotamos as providências", informa a diretora. A escola adotou o programa Aluno Presente, que faz  monitoramento da frequência escolar. Quando o estudante passa mais de três dias sem ir à sala de aula, a escola vai até a casa dos pais dele para saber os motivos.

Uma outra preocupação dos educadores é com a alfabetização dos alunos. O projeto Sala de Leitura ajuda a desenvolver o aprendizado. Na escola, uma garotinha de 6 anos - "vou completar sete no dia 12", avisa ela - se destaca. O nome dele à Isadora Camile, moradora da Rua São Vicente, perto da escola. Filha de pai operário, ela tem um gosto incomum pela leitura.

A pouca idade não a deixou inibida quando foi convidada a participar de um evento na Academia Norte-Riograndense de Letras. Em meio a senhores e senhoras acostumados a lidar com as letras, declamou o poema "A Bailarina", de Cecília Meireles. "Esta menina / tão pequenina / quer ser bailarina./ Não conhece nem dó nem ré / mas sabe ficar na ponta do pé", disse ela para encanto dos imortais da ANL.

A diretora Liane Morais acha que a tendência da escola, daqui para a frente, é crescer no Ideb. Na Enedina, o ano letivo é cumprido integralmente sem interrupções. Os professores não aderiram às últimas greves convocadas pelo sindicato.

No geral, a nota do Ideb da rede municipal de Parnamirim, nos anos iniciais, foi de 4.1 em 2011, cumprindo a meta de qualidade do ensino público. "Tivemos um crescimento de 9% nos anos iniciais", informou a secretária Valdilma Oliveira, que na semana passada enviou um documento à revista Veja esclarecendo a nota do Ideb dos anos finais.

Source: Tribuna do Norte