Ética, política e eleições

Estamos nos aproximando das eleições municipais, momento importante para a democracia brasileira. Temos a oportunidade de escolher nossos representantes para o Executivo (prefeito e vice-prefeito) e para o Legislativo (vereadores). Participar de uma eleição, seja como candidato ou como eleitor, exige uma postura ética para que esse momento seja de fato relevante para a sociedade.

A ética (do grego ethos) significa bons costumes, modo de ser ou caráter de uma pessoa, mas também diz respeito à teoria de um certo tipo de experiência humana, ao comportamento moral das pessoas. A moral (do latim mores) significa costumes. Mas podemos dizer que a moral também se refere às normas, aos valores e às leis que regem a vida em sociedade. Assim, o objeto de investigação da ética é a moral. Quando aparecem dúvidas sobre a validade dos costumes, valores, leis, condutas, então há a necessidade de recorrer à contribuição da ética para compreender o seu sentido. Ela tem a função de nos indicar quando o comportamento é bom, justo e humano.

O ethos (ética) é a casa, a morada, a acolhida, o abrigo protetor e seguro da vida do homem em sociedade. A partir do ethos, o espaço do mundo humano (sociedade) torna-se habitável para o homem, torna-se espaço de afirmação do humano (Escritos de Filosofia II: Ética e Cultura, 1993). Com o ethos, a solidariedade, a cooperação e a alteridade passam a ser as referências da vida em sociedade, contrapondo-se ao egoísmo, ao individualismo e à barbárie.

Para essa concepção ética, a areté, a excelência do agir humano ou o conjunto dos valores que forma um ideal de convivência em sociedade, é a referência fundamental. As ações dos homens, no âmbito da economia, da cultura, da religião, do trabalho, da educação, do lazer, da família, deveriam ser orientadas pela ética, para que a sociedade fosse mais justa e humana. Assim também deve ser a ação do homem no âmbito da política.

A política, até 1532, quando surge a primeira edição da obra O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, era compreendida de modo indissociável da ética. A partir de Maquiavel ela passa a ser concebida como esfera autônoma da vida social. Deixa de ser guiada por orientações éticas e passa a ser entendida e praticada como uma técnica, com leis próprias. Com Maquiavel desaparece a ideia da política como busca da justiça e do bem comum. A preocupação agora é com a conquista e a manutenção do poder político. Conquistar e manter o poder serão as finalidades da política. É nesse sentido que Maquiavel elabora a famosa frase: “Os fins justificam os meios”.

Enquanto na concepção que advoga a indissociabilidade entre ética e política a areté é a referência principal, em Maquiavel essa referência é virtú (do latim virtus), que pode ser traduzida por habilidades, estratégias, mas também como a sutil combinação entre a força e a astúcia. Com isso, passamos a ter uma visão instrumental e pragmática da política.

Essa visão instrumental e pragmática da política em Maquiavel, ao orientar o Príncipe, o governante, para que assumisse a virtú como orientação da sua ação, tinha como fim o bem da sociedade. Entretanto, essa orientação foi assumida pela maioria dos nossos políticos de forma enviesada, como uma orientação para assumir o poder e garantir não os interesses do Estado e da sociedade, mas os seus interesses particulares, principalmente para se apropriar dos recursos públicos como se fossem recursos privados, como a imprensa tem cotidianamente denunciado nos dias atuais.

As eleições são um importante momento para mudar essa realidade, para contribuir para que a política volte para a morada, para o abrigo, para a proteção do ethos; para que a areté, a excelência do agir humano, seja o fundamento da ação política, e não a virtú, a esperteza, a estratégia, a habilidade. É comum percebermos a atitude de candidatos assumindo virtú, a estratégia, para burlar a legislação eleitoral ou para satisfazer seus interesses particulares. Exemplos: a estratégia de candidato que assume como nome político o nome de sua empresa. Fora do período eleitoral, são espalhadas por Goiânia placas da empresa anunciando promoções. Na época de eleições, essas placas são substituídas pela propaganda da candidatura... outra prática é a de candidato a vereador, também em Goiânia, que aproveita a influência do poder político para acumular cargos no Estado e em municípios, sem cumprir horários de trabalho, caso do vereador Tiãozinho do Cais (O POPULAR,12/8/2012); e ainda, candidatos que abusam do poder econômico para se eleger, tornando o processo eleitoral ainda mais desigual. Daí a importância do eleitor procurar conhecer a vida política dos candidatos e fazer uma escolha que contribua para melhorar a nossa cidade e trazer a política para a morada do ethos.

 

Adão José Peixoto é mestre em Filosofia (Puccamp), doutor em Educação (USP), professor da Faculdade de Educação da UFG