Uma obra marcada por ideais feministas

Data: 14 de abril de 2015

Veículo: Diário de Cuiabá 

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A poetisa Cora Coralina é considerada por especialistas em sua obra como uma mulher forte e libertária. Embora não tenha incorporado o discurso feminista, a forma como ela se impôs na sociedade machista e conservadora em que vivia fez com que também pudesse ser estudada sob a perspectiva de gênero. 

Nascida e criada na cidade de Goiás, Cora saiu de lá em 1911 para poder viver ao lado do advogado Cantídio Tolentino de Figueiredo Bretas, que era casado. Criou quatro filhos trabalhando no interior de São Paulo, após a morte do marido. E, 45 anos depois, teve a coragem de voltar para buscar suas memórias e escrever sobre aquele espaço. “Na cidade de Goiás, como antiga capital do estado, havia uma agitação cultural forte e mulheres inscritas no tradicionalismo, no conservadorismo da cidade, mas que também atuavam”, disse a professora Goiandira. 

Cora publica seus primeiros textos no semanário A Rosa, dirigido por ela própria e outras poetisas. A poetisa, que viveu até os 95 anos, não se inspira apenas nas mulheres, mas lia poetas como Almeida Garrett e textos que vinham do exterior. “Ela estava alguns passos à frente dessas mulheres que escreviam nos moldes tradicionais, sonetos, poesia metrificada, ou simbolista ou parnasiana. Elas tinham medidas. Cora não, Cora era da desmedida. Seus primeiros versos assustaram tanto as pessoas que os imputaram ao primo dela, Luiz do Couto”, contou Goiandira. 

“Eu vejo a Cora como uma feminista de vanguarda”, explicou a professora da UFG Maria Meire de Carvalho. 

Doutora em gênero e estudos feministas pela Universidade de Brasília (UnB), a especialista diz que Cora atuou ativamente, mas não se reconhecia como feminista, assim como outras mulheres que romperam padrões a seu tempo. 

“Às vezes as mulheres têm medo de dizer que são feministas porque pega mal. Mas esse pegar mal na sociedade já mostra a cultura machista. Uma feminista é aquela que tem metas que ultrapassam as impostas. E as ações de Cora estavam totalmente envolvidas no processo de emancipação das mulheres”, explica Maria Meire. 

Para a professora Ebe Maria de Lima Siqueira, essa face de Cora, como uma mulher que estava rompendo limites, estava muito clara na cabeça dela, embora o conservadorismo da formação que recebeu também fosse muito presente. “Ela dizia que mulher não devia trabalhar, tanto que ela cuidou dos filhos, foi dona de casa, e, enquanto esses filhos não se encaminharam, ela não deu seu grito de independência”, disse Ebe. 

Para a pesquisadora, Cora tinha essa consciência de gênero, mas não no sentido de uma liberação sexual. Embora tenha sido ousada para o tempo dela, pelos registros históricos e depoimentos, ela foi fiel ao marido e a essa memória até a morte. “Para romper isso ainda precisaria de mais 50 anos de vida de Cora, tanto que voltar para a cidade de Goiás tinha esse papel [de rompimento]. Quando ela diz que está escrevendo para gerações futuras, ela sabia que não ia encontrar eco na sua geração”, disse Ebe. 

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