Aumenta cerco contra agrotóxicos

Data: 22/05/2015

Veículo: Diário da Manhã

Link direto para a notícia: http://www.dm.com.br/cidades/2015/04/aumenta-cerco-contra-agrotoxicos.html

 

Welliton Carlos Da editoria de Cidades

Goiás é um dos grandes centros do agronegócio. Sua atuação no mercado de commodities é invejável e o faz líder em diversos segmentos. Contudo, é também um dos estados com maior incidência de casos de siameses e algumas espécies de tumores raros.

Há quem diga que o aumento de incidência de casos possa estar relacionado com fatores ambientais — e aqui se inclui o abuso dos agrotóxicos. É o caso do médico cirurgião pediatra Zacarias Calil, que tem sua carreira baseada nas complexas cirurgias de separação de siameses.  Esta pressão contra o produto está apenas no começo. Mas a marcha de confronto ao agrotóxico tem conquistado novos aliados.

Na última semana, o Instituto Nacional de Câncer (Inca) publicou documento técnico que trata de seu posicionamento público a respeito do uso de agrotóxicos. A principal instituição que pensa e debate os temas relacionados ao câncer trouxe à tona o grave problema.

O estudo do Inca trata dos riscos — que são muitos. Conforme o instituto, os agrotóxicos estão intimamente relacionados com o desenvolvimento de tumores. Infertilidade, neurotoxicidade, impotência, abortos, desregulação hormonal e efeitos sobre o sistema imunológico estão também relacionados no documento do Inca. E em específico as  malformações fetais.

O que mais assusta é o olhar de paisagem das categorias que defendem o uso de agrotóxicos. A maioria nega os riscos.

Existe uma complexa rede de interesses por trás da defesa. O grupo que defende o uso costuma cooptar professores de agronomia e química para criarem estudos que legitimem o uso. Na estratégia para defender o agrotóxico, eles usam o termo “defensivo agrícola”.

Tudo é muito bem instrumentalizado. Grandes veículos de comunicação realizam reportagens para ‘desmitificar’ o assunto ou para amenizar a situação, mas aumenta a cada dia a consciência científica de que o risco e o alto preço pago pelo uso do agrotóxico pode criar gerações e gerações de pessoas cada vez mais doentes.

ESTRATÉGIA

“A estratégia dos defensores do uso de agrotóxicos inclui nomear para secretarias que cuidam de Meio Ambiente os ruralistas e representantes do agronegócio, quando os temas produção agrícola e defesa ambiental são diferentes”, diz o ambientalista Alessandro Correa Lima.

Um dos principais líderes do Movimento dos Sem Terra (MST), João Pedro Stédile, tem denunciado em uma série de eventos pelo país a necessidade de adoação de uma agricultura defensiva ‘do consumidor’, que não utiliza agrotóxicos.

Stédile tem afirmado que existe uma estratégia montada a longo prazo. Desde o governo de Fernando Henrique Cardoso, explica, existe isenção de impostos para a compra de agrotóxicos. “Mas eles mantém a tributação do leite e da água mineral. Liberam o veneno”, avalia.   Conforme o Inca, engana-se quem pensa que ocorra a presença de resíduos de agrotóxicos  apenas em alimentos ‘in natura’. Biscoitos, salgadinhos, pães, cereais matinais, lasanhas, pizzas e outros que têm como ingredientes trigo, milho e soja também estão contaminados.

Tais produtos alimentícios foram processados, mas trazem em seu conteúdo alimentos que sofreram o processo de contaminação.  Mesmo carnes e leites de animais que se alimentam de ração com traços de agrotóxicos estão condenadas.

“A preocupação com os agrotóxicos não pode significar a redução do consumo de frutas, legumes e verduras, que são alimentos fundamentais em uma alimentação saudável e de grande importância na prevenção do câncer”, afirma Fabio Gomes, nutricionista do Inca.

 Defensores

O temor dos defensores dos agrotóxicos é de que o tema seja tão debatido na sociedade quanto, por exemplo, a questão da maioridade penal.  A popularidade do assunto assusta os que lucram com o uso dos agrotóxicos

Apesar do universo jurídico estar desatento quanto ao imenso debate que ocorre entre ecologistas e produtores, o assunto já chegou nas comunidades de direito.

Uma das linhas de pesquisa do mestrado em Direito Agrário da Universidade Federal de Goiás (UFG) é o direito agroalimentar e o tema do agrotóxico tem sido explorado nas pesquisas de mestrado — justamente as teses que faltam para embasar novas decisões judiciais. O fato é que a sociedade se organiza. A cada dia aumenta o cerco contra o veneno que coletamos da própria mesa.