População indígena é mais propensa a transtornos mentais, segundo pesquisa da UFG
Estudo realizado com o povo Karajá revela que a prevalência em indígenas é 22,1%, enquanto que o índice observado na população não indígena fica em torno de 13%
A Universidade Federal de Goiás concluiu em 2018 mais uma etapa de uma pesquisa iniciada em 2006 com indígenas da etnia Karajá para avaliar a incidência de transtornos mentais entre crianças. O estudo, que foi realizado em uma tribo, levou em consideração a avaliação das crianças, seus pais ou cuidadores e de seus professores. Além disso, usou mais de uma metodologia de detecção para garantir os resultados. A conclusão é que a prevalência dos transtornos em indígenas é de 22,1%, superior à encontrada em estudos nacionais e internacionais com população não indígena que fica em torno de 13%. Porém, o dado é semelhante às taxas com população indígena de outras etnias.
Observou-se que mesmo na etnia Karajá, que preserva aspectos culturais dos seus ancestrais que viveram há 10 mil anos, existem problemas psiquiátricos com apresentações clínicas similares às encontradas em sociedades modernas civilizadas, tais quais hiperatividade, déficit de atenção, podendo o contexto cultural influenciar nas manifestações dos sintomas e da prevalência. A escolha do povo Karajá não é por acaso. “Essa é uma das tribos brasileiras que preservam de forma mais forte sua cultura e vivem como seus ancestrais”, explica o professor Paulo Verlaine, psiquiatra e pesquisador que iniciou a pesquisa .
Segundo o pesquisador, a maior parte dos estudos com nativos indígenas é feita com populações que já passaram por processo de aculturação, associados a um aumento na prevalência de transtornos mentais e que podem mascarar a real prevalência destes nessas populações. A intenção, segundo ele, é avaliar até que ponto as características biológicas e culturais podem influir na incidência de transtornos mentais. “Já sabemos que o lado biológico e o cultural estão atrelados e que já está superado na psiquiatria que o lado cultural age separado do biológico. Por outro lado, não há como negar que os transtornos mentais são as causas para as principais mazelas da saúde humana e entendê-los pode auxiliar muito nosso sistema de saúde e a população indígena também pode ser beneficiada”.
Pioneira
A Universidade Federal de Goiás é uma das primeiras a realizar estudos em saúde mental com crianças indígenas. A pesquisa que foi realizada em campo pelo professor Paulo Verlaine em seu doutorado e orientada pelo professor Leonardo Caixeta teve também a participação da pesquisadora e psiquiatra Daniela Taveira, que realizou em seu doutorado concluído em 2018 a análise de dados de uma parte do material colhido durante a pesquisa. Também participaram da pesquisa dois tradutores, sendo um farmacêutico e uma enfermeira, funcionários da Fundação Nacional de Saúde/ Distrito Sanitário Especial Indígena Araguaia (Funasa/DSEI Araguaia). Os dados confirmaram os já encontrados pela pesquisa de Paulo Verlaine, mostrando uma incidência maior de transtornos mentais entre indígenas.
Os pesquisadores esperam que os resultados alcançados possam subsidiar políticas públicas para a população indígena que, segundo eles, pode e deve se beneficiar do tratamento psiquiátrico, bem como de terapias e outras intervenções. “Um aspecto que precisamos ressaltar é que o fortalecimento da cultura dos indígenas e seus valores, sem impor crenças ou modelos é a melhor forma de garantir a proteção dessas populações também do ponto de vista da saúde mental”, afirma o professor.
Sobre a pesquisa 1
Pesquisador: Paulo Verlaine Borges e Azevêdo
Orientador: Leonardo Ferreira Caixeta
Unidade vinculada: Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Sobre a pesquisa 2
Tese: Prevalência de transtornos mentais em população infantil de indígenas da etnia Karajá (2018)
Pesquisadora: Daniela Londe Rabelo Taveira
Orientador: Leonardo Ferreira Caixeta
Unidade vinculada: Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás