Usando resina de cajueiro, pesquisa da UFG cria plástico biodegradável

Data: 14/07/2016

Veículo: G1 Goiás

Notícia contém material audiovisual, para assistir clique aqui: http://g1.globo.com/goias/noticia/2016/07/usando-resina-de-cajueiro-pesquisa-da-ufg-cria-plastico-biodegradavel.html 

 

Ele serve para acondicionar alimentos e como curativo de ferimentos; veja. Material demorou 8 anos para ser desenvolvido e se decompõe em 30 dias.

Pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG) conseguiram criar um plástico usando como base a resina - ou goma, como é conhecida - de cajueiros. Os estudos duraram oito anos até que as características consideradas ideais do material fossem encontradas. Chamado de filme, o produto pode ser utilizado para embalar alimentos e também, quando manipulado com outras substâncias, serve de curativo para ferimentos.

O projeto foi liderado pela professora Kátia Fernandes, coordenadora do Laboratório de Química de Polímeros da instituição. Ela explica que o carboidrato da goma é extraído e a partir de processos químicos, resulta no material (veja vídeo acima).

Além disso, o filme é atóxico, transparente e biodegradável. Segundo Kátia, já ficou comprovado que ele se decompõe na natureza em apenas 30 dias. Já o plástico comum leva cerca de 50 anos para ser absorvido completamente pelo solo.

Com 25 anos de experiência, a pesquisadora conta que a ideia surgiu depois de um projeto de pós-doutorado, em Londrina (PR), onde ela fez um experimento semelhante: criou um plástico a partir do amido de mandioca. Mas o resultado não foi o esperado, fazendo-a ir em busca de melhorias.

"Aquele filme tinha uma aparência esbranquiçada. Então voltei [para Goiânia] com a ideia de fazer algo transparente. Comecei a estudar quais elementos que poderia usar e vi na goma do cajueiro uma possibilidade de produzir um plástico que agregaria as características que eu procurava: algo biodegradável, transparente e não tóxico", disse ao G1.

Curativos e embalagens
Quando a fórmula alcançou os aspectos desejados, o grupo de 16 pessoas do laboratório começou a procurar em que situações o filme poderia ser utilizado. A primeira delas foi na área da saúde. Ao perceberem que ele não produzia nenhum tipo de problema no contato com as células humanas, surgiu a ideia de criar um curativo.

Usando resina de cajueiro, pesquisa da UFG cria plástico biodegradável em Goiás (Foto: Sílvio Túlio/G1)
Plástico de amido de mandioca (à esquerda) e o de cajueiro, que é transparente (Foto: Sílvio Túlio/G1)

Para chegar a essa aplicação, o material é combinado, durante o seu preparo, com substâncias farmacológicas. Já foram produzidos produtos indicados para três tipos de enfermidades: os que ajudam na cicatrização, outros que agem em feridas infeccionadas e purulentas, além de um terceiro com ação anti-inflamatória para dores localizadas.

O filme também pode ser utilizado na área alimentícia. De acordo com Kátia, quando usado par embalar frutas e legumes, por exemplo, é possível concluir que o plástico impede o crescimento de fungos.

"Fizemos alguns testes. Em temperatura ambiente, o morango, quando embalado pelo plástico comum, apodrece por completo em 48 horas. No que a gente produziu revestido pelo filme, passou uma semana e a fruta seguiu brilhante. Temos dois pontos: o aumento de vida último no supermercado e a diminuição do agrodefensivo na lavoura, uma vez que a embalagem já protege o alimento", atesta.

Usando resina de cajueiro, pesquisa da UFG cria plástico biodegradável em Goiás (Foto: Sílvio Túlio)
Em sentido horário: veja como fica o filme acondicionado e, depois, retirado para uso (Foto: Sílvio Túlio)

Renovável e mais barato
Outro fator preponderante na criação do filme é o uso de uma matéria-prima vegetal e renovável. O plástico comum é derivado do petróleo, produto que, de acordo com Kátia, deve desaparecer em alguns anos. Por isso, há a necessidade de criar outras alternativas.

"Nós não vivemos sem plástico. Ele é o quarto reino, depois do animal, vegetal e mineral. A primeira coisa que tem de ser considerada é que a indústria petroquímica precisa de soluções, porque o petróleo vai acabar. Com isso, o preço vai subindo ao longo do tempo", salienta.

A pesquisadora calcula que o processo produtivo do filme criado a partida da goma custa um terço a menos que o tradicional. Os resultados da pesquisa já foram publicados em revistas científicas norte-americanas, mas, até o momento, não houve procura de investidores.

A falta de apoio desanima Kátia. Para ela, o país precisa olhar mais para o que é produzido dentro das universidades, além de tomar iniciativa de explorar as descobertas antes que outras nações façam isso.

"O problema é justamente achar os parceiros. O Nordeste brasileiro é responsável por 99% da produção de caju e castanha de caju. O volume de informações da comunidade científica internacional é tão grande que o que será convertido depende da disponibilidade. Por isso, a indústria brasileira é quem teria que explorar isso", desabafa.

Usando resina de cajueiro, pesquisa da UFG cria plástico biodegradável em Goiás (Foto: Sílvio Túlio/G1)
Kátia com a goma do cajueiro: matéria-prima para o plástico biodegradável (Foto: Sílvio Túlio/G1)