Alimentação saudável protege o coração

Estudo com 45 mil voluntários sugere que seguidor de dieta vegetariana tem chance 28% menor de desenvolver alguma doença do coração e 32% de ser hospitalizado ou de morrer por complicações cardiovasculares, em comparação com quem consome proteína animal

 

Faz tempo que inúmeros especialistas vêm associando o consumo de carne vermelha a um risco maior de mortalidade. Recentemente, um estudo britânico, que será publicado na edição de março da revista "American Journal of Clinical Nutrition", dos Estados Unidos, concluiu que ser vegetariano é melhor para a saúde do coração.
A pesquisa se concentrou em 45 mil voluntários com idades entre 50 e 70 anos na Inglaterra e na Escócia, e as análises foram de que as pessoas que seguem a dieta vegetariana têm reduzido em 32% o risco de hospitalização e morte por doenças cardiovasculares, em comparação com as que consomem carne e peixe.
Conforme os cientistas, como resultado da dieta que seguem, os vegetarianos, geralmente, apresentam pressão arterial mais baixa e níveis de colesterol menores do que os não vegetarianos. 
Além disso, os resultados apontaram que vegetarianos não só tendem a apresentar um índice de massa corporal (IMC) menor e um menor risco de diabetes, como também viam reduzido em 28% o risco de sofrer de doenças cardiovasculares.
Fatores como idade, tabagismo e consumo de álcool, prática de atividade física, nível educacional e desenvolvimento socioeconômico foram levados em conta pelos cientistas, que analisaram questionários detalhados sobre saúde e estilo de vida dos participantes durante 12 anos. 
Conforme declarações da autora do estudo, Francesca Crowe, epidemiologista da Universidade de Oxford, na Grã-Bretanha, grande parte da diferença dos resultados obtidos se deve aos efeitos do colesterol e da pressão sanguínea, que geralmente são mais altos entre os consumidores de carne do que em vegetarianos.

Estudos
Professora da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Goiás (UFG), Mara Reis Silva destaca que a alimentação vegetariana tem sido associada com algumas vantagens em relação à saúde em diversas pesquisas já realizadas no mundo todo, com importantes e significativos resultados.
Porém, a professora ressalta que é preciso ter cuidado com as interpretações, pois, segundo ela, ainda são necessários estudos para embasar dados mais definitivos sobre o assunto, para saber quais aspectos de uma dieta vegetariana influenciam nos resultados finais.
Mara explica que alguns pesquisadores questionam se as vantagens de uma alimentação vegetariana bem conduzida são causadas pelo padrão alimentar, pelo estilo de vida dos vegetarianos ou ainda por algum componente alimentar, já que, em geral, os que seguem a dieta procuram viver de maneira mais saudável, com a prática de exercício físico, a baixa ingestão de bebida alcoólica e a exclusão de fumo.
“Como a alimentação vegetariana pode diferir muito com relação aos alimentos consumidos, mesmo considerando a ausência de carne, isso dificulta a análise dos resultados das pesquisas. Por isso, é preciso cautela e mais estudos ainda serão necessários para analisar todos os aspectos da dieta vegetariana”, destaca a professora.
Coordenadora de Vigilância nutricional da Secretaria Estadual de Saúde (SES), Maria Janaína Cavalcante considera que muitos outros estudos têm de ser realizados, com número maior participantes, já que não é possível concluir que a alimentação vegetariana seja a mais saudável. 
Maria Janaína explica que, comprovadamente, quem busca a dieta vegetariana aumenta o consumo de cereais integrais e alimentos que têm como base as sementes, capazes de prevenir riscos de muitas doenças crônicas.
Mas, em contrapartida, a coordenadora adverte que é necessário avaliar, especialmente fatores relacionados aos agrotóxicos, que trazem susbstâncias que nem foram pesquisadas em humanos.
“Podemos afirmar que os vegetarianos têm uma alimentação saudável  com relação ao fator nutricional, mas não do ponto de vista sanitário, já que a presença dos agrotóxicos nos alimentos podem fazer mal à saúde.”

Decisão de não comer carne exige cuidados e enfrenta barreiras

Abolir o consumo de carne da alimentação diária não é uma tarefa simples e exige cuidados para que esta seja uma escolha saudável e sem prejuízos em qualquer fase da vida.
No Estado, assim como no restante do País, segundo a coordenadora de Vigilância Nutricional da SES, Maria Janaína Cavalcante, não há dados referentes à quantidade de pessoas que seguem a dieta vegetariana.
Para a coordenadora, o que é possível afirmar é que esses números têm aumentado devido a fatores relacionados à mudança de estilo de vida em busca de uma alimentação mais saudável e ecologicamente correta.
Maria Janaína diz que essas mudanças têm impulsionado muitos jovens e adultos, desde motivos relacionados à saúde, questões éticas, ecológicas, religiosas ou até mesmo para garantir uma alimentação benéfica ao organismo.
Em 2000, aos 38 anos, após passar por uma depressão, Vera Lúcia da Silva Fernandes começou a praticar Ioga e, em seguida, decidiu deixar de comer carne. Em 2001, já era totalmente adepta ao vegetarianismo estrito (o que não consome nada derivado do animal).
Vera conta que no início, sem orientação alguma e não fazendo conta de questões nutricionais, procurou substituir a carne pela soja, para que o marido André Luís, 48, e os três filhos, Alex, 25, Guilherme, 18, e Ciro, 15, fossem se adaptando, mas a resistência persistiu fora de casa, com amigos e parentes.
Quanto à saúde, Vera diz que a falta da carne não melhorou alguns problemas, como a gastrite e o peso, porque, por não ser muito discipli­nada,  ela acaba abusando das massas e carboidratos.
“A decisão de aderir ao vegetarianismo encontra barreiras na substituição dos alimentos e na resistência da família. Hoje, por opiniões do avô e dos tios, que são pediatras, meus filhos voltaram a ingerir carnes, porém em quantidades menores. Meu marido é quase um vegetariano nato.”
A professora de Sociologia, graduada em administração cooperativista Nilza Maria Cerqueira Brito também é adepta do vegetarianismo há  cinco anos. Entre as dificuldades que passou, ela destaca que a mais incidente foi a de se fazer respeitar em sua escolha, sobretudo com pessoas mais velhas,  pelo estereótipo de que sem carne a pessoa fica fraca. 
Nilza conta que embora a decisão de não ingestão de carnes tenha sido consciente, o processo de adaptação foi mais extenso e doloroso, ficando entre a informação da conduta ideal e a luta contra a dependência corpórea e até emocional das velhas práticas alimentares.
E nestes cinco anos de dieta vegetariana, Nilza observa que algumas mudanças foram claramente perceptíveis; mais controle sobre a ansiedade, baixa no estresse, pele, cabelos e unhas mais saudáveis, além de sono mais tranquilo e de melhor qualidade.  
“Aos poucos os hábitos foram se formando, e consolidando um comportamento mais assertivo a respeito de uma nova prática alimentar, aquela que prima para além da saúde individual. Man­tenho minhas relações com amigos e família normalmente. Como aquilo que não tem carne. Apenas isso.”
Professora da Faculdade de Nutrição da UFG, Mara Reis Silva considera que a dieta vegetariana pode fazer diferença, sim, em termos de saúde, e quem decidir riscar os alimentos de origem animal do cardápio deve atentar para a substituição adequada dos nutrientes abundantes na carne vermelha, frango e peixe.
Para ela, esses cuidados devem ser observados porque toda alimentação monótona e muito restritiva pode aumentar o risco de deficiências nutricionais, especialmente em estágios de vida ou condições fisiológicas mais vulneráveis, como crianças, gestantes e idosos.
“Pessoas que excluem todos os alimentos de origem animal podem não atender às necessidades de vitamina B12, vitamina B2, cálcio, ferro, zinco, ácido graxo essencial n-3”, afirma a professora.

Fonte: Tribuna do Planalto