Medida valerá para quem entrar no cursos de instituições públicas e privadas a partir de 2015
Estudantes de medicina que entrarem na faculdade a partir de 2015 serão obrigados a prestar serviços no Sistema Único de Saúde (SUS) durante dois anos. A mudança vale para alunos de instituições de ensino públicas e privadas. A medida altera o tempo de duração dos cursos, que passam de seis para oito anos. A alteração curricular foi anunciada ontem pelo governo federal juntamente com o lançamento do Programa Mais Médicos, que pretende ampliar e descentralizar a oferta de profissionais no País, formalizando a possibilidade de contratação de médicos estrangeiros.
Os médicos recém-formados atuarão na atenção básica e nos serviços de urgência e emergência. Eles receberão uma bolsa custeada pelo governo federal. Alunos de faculdades privadas também serão contemplados e ficarão livres da mensalidade durante esse acréscimo de tempo na formação acadêmica.
Essa segunda etapa do curso poderá ser aproveitada como parte da residência médica ou pós-graduação caso o profissional escolha uma especialização no ramo da atenção básica. Até o fim do período no SUS, o estudante permanece vinculado à faculdade.
O secretário Estadual da Saúde, Antônio Faleiros, considera a medida importante para melhorar a formação dos médicos brasileiros. “A mudança vai proporcionar uma formação mais generalista. Hoje, profissionais formados em algumas especialidades sequer tiveram contato com o doente”, diz. Faleiros argumenta que no SUS o médico aprenderá a ouvir o paciente, a fazer uma boa entrevista e não se limitará a usar equipamentos e pedir exames.
Coordenador do curso de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG), Vardeli Alves critica a medida. “Essa conversa de obrigar o médico recém-formado a trabalhar no SUS vinha sendo comentada há algum tempo. Mas uma proposta não foi discutida formalmente com a comunidade acadêmica. Estão criando uma espécie de serviço militar obrigatório ao médico”, afirma. Vardeli sustenta que o estudante de Medicina já passa a maior parte do tempo de formação inserido no SUS. “O internato entre o quinto e o sexto ano de curso se dá inteiro na rede pública”, alega. Ele também levanta dúvidas acerca da constitucionalidade da alteração, que será feita por medida provisória e regulamentada por portaria conjunta dos ministérios da Educação e da Saúde. “Precisa ser esclarecido quem será o preceptor desse estudante durante o período de trabalho no SUS.”
Estudantes contrários à medida anunciada
09 de julho de 2013 (terça-feira)
Os estudantes de Medicina receberam com contrariedade o anúncio do aumento da carga horária do curso e a obrigatoriedade de prestar serviços no Sistema Único de Saúde (SUS) durante dois anos. Presidente do Centro Acadêmico da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), Gilberto Borges diz que “mais uma vez querem colocar na conta do médico as deficiências da saúde no Brasil”.
“Querem obrigar o médico a atender em um SUS sem condições de receber o profissional”, diz. Gilberto tem 24 anos e está no 5° ano do curso. Ele cobra que o governo federal se manifeste sobre mais investimentos, sobretudo em infraestrutura, nos municípios do interior do Brasil antes de determinar essa medida.
Ele sustenta que não é a remuneração que afasta o médico do interior. “Esse valor de R$ 10 mil é razoável. Mas o problema é que o interior não dá condições para exercer a medicina”, afirma.
Gilberto argumenta que os estudantes de Medicina são mais velhos que a média de outros cursos devido as dificuldades em passar no vestibular. “Dois anos a mais não vão melhorar a formação e ainda atrasarão a vida do recém-formado. Vão prolongar o curso sem a garantia de uma qualidade efetiva”, avalia. Ele diz que a maioria dos recém-formados já passam pelo SUS, pois são poucas as vagas em residência médica.
1.355373
Entrevista / Paulo Francescantonio
“Não vai adiantar nada”
Coordenador do curso de Medicina da PUC-GO, Paulo Francescantonio afirma que o trabalho obrigatório no SUS não garante melhor formação profissional e nem atinge a natureza dos problemas da saúde no Brasil. Ele defende a criação de carreira de Estado para aumentar o interesse do médico em trabalhar no interior.
09 de julho de 2013 (terça-feira)
Até que ponto a obrigação do estudante a trabalhar pelo SUS ajuda na melhoraria a saúde no Brasil?
Somente jogar o médico recém-formado no SUS não vai adiantar nada. Até porque ele já atua na rede pública quando forma. Existem poucas vagas em residência médica e muitos passam pelo SUS antes de ir para a especialização. Ainda há muitas dúvidas sobre como funcionará o curso de Medicina após essas mudanças. Não sabemos quem vai avaliar e supervisionar o estudante que estiver numa cidade distante.
A vinda de médicos estrangeiros pode colaborar com o serviço prestado pela rede pública?
Seria muito mais lógico o governo federal criar uma carreira de Estado para o médico. Assim os profissionais brasileiros ficariam atraídos a trabalhar no interior pela rede pública. Essa carreira teria ênfase na atenção primária, que corresponde à maioria dos atendimentos médicos, e viria acompanhada de investimentos na área de saúde.
No anúncio, o ministro da Educação, Aloísio Mercadante, afirmou que a medida ajudará a “humanizar” a formação do médico. O senhor concorda?
Eu volto ao mesmo ponto: soltar o formando em um posto de saúde para atender pelo SUS não colabora nem com a formação técnica nem com humanização. O governo está criando um atalho sem ir à gênese do problema.
1.355372
Entrevista / Maguito Vilela
“Presidente agiu certo”
Vice-presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), o prefeito de Aparecida de Goiânia, Maguito Vilela (PMDB), afirma que as medidas tocam nas principais questões que envolvem saúde no Brasil. Ele ressalta que mais de 700 municípios brasileiros não contam sequer com um médico, fato também recorrente em Goiás.
09 de julho de 2013 (terça-feira)
Como os prefeitos receberam a oficialização da possibilidade de médicos do exterior virem trabalhar no Brasil?
Essa foi uma bandeira levantada por nós, da Frente Nacional de Prefeitos (FNP). Acreditamos que a presidente Dilma Rousseff agiu certo, colocando uma ordem de preferência nas contratações. Será dada prioridade aos brasileiros interessados em trabalhar no interior e áreas pobres de grandes cidades. Caso as vagas não sejam preenchidas, os brasileiros formados fora do Brasil podem assumi-las. Se mesmo assim sobrarem postos de trabalhos, que venham os estrangeiros.
As medidas vão resolver o problema da saúde no Brasil?
A totalidade dos problemas não, mas essas medidas tocam em pontos nevrálgicos da questão. Está mais que comprovado que faltam médicos no Brasil. A relação entre profissionais e número de habitantes no País está entre as menores do mundo.
É preciso mais investimento em saúde?
O financiamento do Sistema Único de Saúde (SUS) também foi abordado pelo governo federal. Foram anunciados investimentos em Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Unidades de Pronto Atendimento (UPA). Não sei se será algo significativo, mas com certeza dará uma aliviada boa para os municípios.
1.355370
Médicos estrangeiros ocuparão vagas não ocupadas por brasileiros
09 de julho de 2013 (terça-feira)
O governo federal definiu ontem as normas para a “importação” de médicos. O Programa Mais Médicos vai oferecer bolsa de R$ 10 mil para profissionais atuarem na atenção básica da rede pública de saúde, sob a supervisão de universidades federais. Brasileiros e estrangeiros poderão assumir as vagas.
Municípios, instituições de ensino supervisoras e médicos precisarão aderir ao programa, por meio de editais. Os profissionais estrangeiros serão chamados para ocupar as vagas não preenchidas por brasileiros. Eles terão de ser fluentes em língua portuguesa e autorizados a exercer Medicina no país de origem.
O Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida) continuará a ser exigência para médicos atuarem livre e permanente no Brasil, exceto para os estrangeiros que ficarão no máximo três anos no País. O secretário Estadual da Saúde, Antônio Faleiros é contrário à medida. “Nós precisamos redistribuir os médicos, porque temos profissionais em número suficiente. Para isso, temos de saber o porque da concentração, que se relaciona às condições de trabalho e questões econômicas”, diz.
O programa dará prioridade para 1.582 áreas que incluem distritos de saúde indígena, municípios de alta vulnerabilidade social, cidades de regiões metropolitanas ou com mais de 80 mil habitantes que tenham baixa receita pública per capita. O governo também anunciou a criação de 3.615 vagas em Medicina nas universidades federais até 2017 e a contratação de 3.154 professores e 1.882 técnicos-administrativos para as universidades federais. As universidade privadas serão beneficiadas com a criação de 11.447 novas vagas até 2017. Vardeli Alves, coordenador do curso de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG), lembra que o Conselho Diretor da unidade tem resistência à ideia de aumentar o número de vagas.