Vandalismo x arte

A arte de rua está nas capas de revistas, em aberturas de novela e na embalagem de produtos dispostos nas prateleiras dos supermercados. Tem sido cada vez mais estudada e disseminada, atraindo profissionais do design, da televisão e da indústria fonográfica, que a estampa em capas de discos, entre outros. Mas, apesar dessa massificação, muitos artistas ainda sofrem certo tipo de preconceito por parte da sociedade e até mesmo da polícia. A discussão é antiga e acerta em cheio o caso do grafite, da pichação e outros estilos de street art: qualquer expressão que apareça nos muros da cidade pode (ou deve) ser considerada uma manifestação artística?

“Uma vez estava trabalhando com o André Morbeck e um policial falou que eu não era artista. O Morbeck era, mas eu não porque nem nome de artista tinha. Isso deixa a gente triste”, lembra Decy. “O pessoal não tem definição para diferenciar o grafite da pichação. Às vezes estamos fazendo algum trabalho e, por estarmos usando o spray, fazem uma comparação com o piche. Já cheguei a assinar um boletim de ocorrência porque acharam que eu estava pichando”, complementa ele.

Segundo Jordana Falcão, doutoranda em arte e cultura visual pela UFG, quase todas as formas de expressão foram muito usadas em momentos de protesto, de reivindicação de minorias, por exemplo. “Mas houve um momento pelos anos 80 que as instituições de arte abraçaram o grafite, que, de certa maneira, desenvolveu uma preocupação mais estética, enquanto o piche ainda funciona como espaço de disputa de bairros, gangues, etc. Muitos grafiteiros que hoje são considerados artistas começaram pichando, pintando espontaneamente na rua. Acredito que o incômodo fica na dúvida sobre que mensagens (e práticas) estão por trás dessas imagens”, avalia.

Marginalidade

Odiada por muitos e defendida por poucos, a pichação é a intervenção urbana que mais gera polêmica pelo caráter quase indissociável da marginalidade. A manifestação persiste até os dias de hoje e pode ser facilmente identificável na capital nos muros, nos prédios – abandonados ou não – nas portas, bancos ou janelas dos ônibus.

“Acho lindo, são calígrafos, na maioria das vezes, maravilhosos. Sou a favor, mesmo quando ele está no lugar errado. Defendo uma ideia que tudo que está voltado para as ruas é das pessoas que passam”, comenta Oscar Fortunato.

“Esse ponto é bastante delicado. Mesmo incomodando, essas práticas são chamadas de arte, talvez pelo fato de ocuparem espaços destinados à apreciação. As pessoas continuam acreditando que arte tem de ser agradável e intocável. Vejo como uma forma de expressão muito forte e legítima. Há regras entre os pichadores para conquistar status – tomá-la apenas como vandalismo é uma questão de manutenção da propriedade. Agora, como em qualquer atividade, os praticantes podem se envolver com comportamentos destrutivos”, analisa Jordana Falcão.

Segundo o artista Oscar Fortunato, o grande problema do piche é a falta de comunicação com as pessoas. “Muitos não entendem o que está escrito e veem a manifestação como uma sujeira. Ninguém vai vencer a pichação, que faz parte da nossa sociedade, do nosso tempo. Não adianta você querer proibir, é preciso aceitar e entender, olhar como outra coisa”, defende.

Fonte: O Popular