Quem sofre é a população

Técnicos de futebol costumam dizer “eu venci”, quando seu time ganha uma partida; “eles perderam”, referindo-se aos jogadores, e “nós empatamos”. Dividem unicamente o empate. Esse costume de vangloriar-se pelas vitórias e transferir para o outro a culpa pelas derrotas não é só um chiste do meio esportivo, mas um costume.

Na noite de 19 de junho o prefeito Paulo Garcia e o governador Marconi Perillo reuniram-se para decidir, conjuntamente, a redução no preço da tarifa de ônibus de 3 reais para R$ 2,70. Ambos estavam pressionados pela onda de manifestações contra o aumento do preço da passagem, anunciado em maio, e por melhoria na qualidade dos serviços públicos.

Como os protestos eram difusos, governador e prefeito tiveram disposição política de se reunir e anunciar uma medida popular, o que lhes poupava um desgaste maior na grande manifestação que ocorreria no dia seguinte em todo o País, e que acabou reunindo cerca de 50 mil pessoas só em Goiânia. Passada a fase do “eu ganhei” com a repercussão da medida, vieram os problemas.

As empresas que operam o transporte coletivo acusam prejuízos com a redução do preço da tarifa e o serviço que já era ruim só tem piorado. O sistema vive um grande impasse.

A concessão do transporte público é municipal, estabelece a Constituição Federal. Deveria, portanto, ser uma obrigação apenas do prefeito. Só que pelo modelo vigente desde 2001, o Paço tem 50% de sua gestão, o Estado, 25%, restando 25% aos demais 17 municípios que compõem a região metropolitana. Essa divisão se reflete na composição da Câmara Deliberativa do Transporte Coletivo (CDTC), responsável pela definição de políticas para o setor, e na CMTC, esta com a incumbência de executar essas políticas.

Por isso, a gestão do transporte é um assunto da conta do Estado e dos municípios, com responsabilidades proporcionais às cotas de cada um nesse contrato de gestão. Isso significa que todos têm responsabilidades, maiores ou menores, na solução dessa crise, que não nasceu da redução da tarifa, mas que se aprofundou depois dela. Vale lembrar que as reclamações pela melhoria do transporte em Goiânia não começaram este ano, como registra a morte do perueiro José Marcos Ferreira, há 14 anos, em um protesto no Câmpus 2 da UFG.

Exatamente por este modelo de gestão compartilhado que governador e prefeito se reuniram às vésperas da manifestação de 20 de junho, quando tiveram oportunidade de capitalizar politicamente com a redução da tarifa. Vitória deles, derrota dos empresários. Pelo mesmo motivo, Estado e município agora se mantêm distantes da crise, como se não tivessem responsabilidade em liderar uma discussão que será longa e difícil em função da complexidade da questão, pois, como os treinadores de futebol, acham que a derrota é do outro. Só que assim como torcedores dos times de futebol, quem sofre é a população.

Fonte: O Popular