Regulação da mídia já entra na pauta

 

29 de junho de 2014.

Diário da Manhã

Renato Dias

Regular a mídia não quer dizer censurá-la, ao contrário, diz o historiador Daniel Aarão Reis Filho. Se trata é de garantir a pluralidade das vozes e das opiniões, impedindo monopólios, sempre nocivos, sobretudo quando se trata de órgãos que contribuem para a formação da opinião pública, explica ele. 

Para o professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), a proposta de regulação da mídia não tem nada de revolucionária. “Todos os países capitalistas têm suas mídias controladas e reguladas, restringindo-se os monopólios”, observa. Espero bem que, no processo eleitoral, o tema volte a ser cogitado, atira.

  • Com a centralidade que merece e se transforme em critério para o voto consciente. 

Sou plenamente favorável à regulação da mídia, completa o autor de Ditadura e Democracia no Brasil – 50 anos do golpe de 1964 (2014), Zahar. Já se discutiu muito o assunto em fins do segundo governo Lula, sob coordenação do então ministro da Comunicação, Franklin Martins. 

  • Infelizmente, depois, diante da cerrada oposição dos grandes monopólios mediáticos, Lula e Dilma, que o sucedeu, resolveram enrolar a bandeira e desistiram de suscitar o problema 

Doutor do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP), Lincoln Secco defende, hoje, a imediata regulação social da mídia. “Embora talvez não seja preciso seguir um modelo único. O grau de concentração de meios de comunicação de massa é muito grande no Brasil”, dispara, indignado.

  • Mas o nosso problema maior não é com a mídia impressa e sim com a digital e a eletrônica. 

Lincoln Secco avalia que o Brasil precisa adotar uma lei que restrinja a propriedade de um grupo econômico como a Rede Globo, por exemplo. Quem possui o monopólio dos meios de informação distorce a democracia, fuzila. Imagine o poder comercial e até político que duas redes de TV aberta concentram durante os jogos da copa do mundo, analisa ele. 

  • Isso é inadmissível. Já houve copas em que só a Globo transmitiu os jogos.

O Brasil, como os demais países democráticos do mundo, deve, sim, aprovar um novo marco regulatório das comunicações e não apenas das empresas de mídia. É o que afirma com exclusividade ao Diário da Manhã o presidente do Sindicato dos Jornalistas do Estado de Goiás, Cláudio Curado.

  • Regular as comunicações não é, como dizem os representantes das empresas do setor, censura. 

A regulamentação existe há bastante tempo em países como Estados Unidos, Portugal, Inglaterra, entre outras democracias, insiste. Precisamos regular e regulamentar o modelo de negócios das comunicações (incluindo a regulação das propriedades) e também o modelo de serviços que as empresas devem prestar, frisa.

A regulação e a regulamentação são complexas por, na atualidade, envolverem atividades que, até pouco tempo, eram bem distintas, mas agora não são mais, explica. Cláudio Curado refere-se às telecomunicações e à comunicação de massa, tratadas ainda hoje, do ponto de vista legal, como atividades distintas

Regras

O líder da categoria dos jornalistas afirma que, para ficar mais claro, hoje no Brasil, TV paga (por cabo, satélite ou MMDS) não são tratadas como empresas de TV e, portanto, não estão submetidas às mesmas regras que as empresas de radiodifusão, inclusive no que diz respeito ao capital estrangeiro. 

Já as empresas as empresas de comunicação que produzem para a internet, não estão sujeitas às mesmas regras que as empresas que produzem para os meios considerados tradicionais (rádio, TV, mídia impressa), revela. A regulação das comunicações no Brasil deve partir do princípio da convergência tecnológica, destaca.

“Não devemos seguir nenhum modelo. Temos condições de debater e aprovar um novo marco regulatório que leve em conta a convergência tecnológica e que esteja, de fato, sintonizado com os interesses públicos, da sociedade brasileira e não apenas das empresas de radiodifusão e de telecomunicações”, registra ele.

  • Que hoje estão no bilionário negócio das comunicações. 

Cláudio Curado é taxativo. “É preciso haver uma ampla revisão de tudo isso e com vistas à democratização dos meios de comunicação e ao atendimento às finalidades estabelecidas na Constituição brasileira (Capítulo V - Da Comunicação Social)” afirma o presidente do Sindicato dos Jornalistas de Goiás.

O Brasil precisa de normas para a imprensa, como para tudo, diz o professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Humberto Clímaco. Ele é membro do jornal O Trabalho, seção brasileira da Quarta Internacional, a central mundial da revolução fundada no ano de 1938, na França, por Liev Davidovich Bronstein, Leon Trotsky. 

  • A noção de liberdade de imprensa, como liberdade de cada um dizer o que quer, é um fetiche!

Regulamentação

Doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP), o jornalista e chargista Gilberto Maringoni diz ao Diário da Manhã que a mídia, como qualquer atividade pública, deve ser regulamentada. A regulamentação deve partir do que está na Constituição: impedir a formação de monopólios, registra.

  • É necessária também a constituição de um conselho federal de comunicação representativo e democrático. 

Segundo o ativista, ao Estado democrático cabe intervir na regulamentação da comunicação em todos os seus aspectos. “Buscando sua democratização, a universalização do acesso aos serviços e criando normas que impeçam excessos por parte dos órgãos de mídia”, explica, de forma didática Gilberto Maringoni. 

  • A maneira de fazer isso depende das condições políticas e da vontade de cada uma das partes em jogo. 

Sem censura

Tais intervenções nada têm a ver com uma suposta censura, argumento vazio utilizado pelas grandes corporações, fuzila. A acusação visa deixar o setor ao sabor de uma verdadeira lei da selva, na qual o predomínio será sempre dos grupos mais poderosos, faz uma análise sociológica dos monopólios midiáticos

Entre outros itens, dois são fundamentais, avalia o ex-integrante dos quadros do jornal O Estado de S. Paulo. Primeiro, o artigo 220, inciso 5º, que estabelece que os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio. Segundo, o artigo. 224. 

  • Para os efeitos do disposto neste capítulo, o Congresso Nacional instituirá, como seu órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social, na forma da lei.

De linhagem socialista, Gilberto Maringoni lembra que o  Brasil realizou, em 2009, sua Iª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Mais de 60 mil pessoas participaram de debates e consultas em todo o Brasil, recorda-se. Estiveram presentes governo, empresários e movimentos sociais, explica.

Conferência

Entre outros temas, a Confecom aprovou resoluções em linha com a Constituição de 1988, como a criação do Conselho de Comunicação Social, o combate à monopolização do setor, a pulverização das verbas de publicidade estatal, o direito de resposta e o fim da propriedade cruzada, informa.

  • Com isso tudo, é importante dizer: o modelo a ser adotado não é o de nenhum outro país, embora a legislação argentina seja muito interessante. Nosso modelo será genuinamente brasileiro.

Fonte: Diário da Manhã

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