Atividade esportiva que motiva

atividade esportiva jpegData: 31/08/2014

Veículo: Diário da Manhã

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Deficientes físicos encontram nas práticas desportivas a superação para sobreviver diante das dificuldades

DIÁRIO DA MANHÃ

APARECIDA ANDRADE

Aos 23 anos de idade, o jogador de vôlei Alexandre Caetano de Souza foi surpreendido por um atropelamento que o deixou sem uma das pernas. “Veio um carro e passou por cima de mim, e para piorar, não me deram nenhuma assistência e foi preciso amputar a minha perna", lembra. Antes de sofrer o acidente Alexandre jogava vôlei no Sesc Faiçalville, onde jogou durante quatro anos. “No dia em que sofri o acidente eu tinha um campeonato para jogar, quando contei para meu treinador ele não acreditou.”

Alexandre se prontificou desde o início a aceitar a nova realidade a qual teria que viver, a partir daquele momento. “Eu superei o meu trauma no mesmo dia que acidentei, quando o médico chegou pra mim e disse – você tem duas opções: morrer com a necrose, ou amputar a perna, decidi na hora por amputar”, declara.

Passados os três primeiros meses, depois do acidente, Caetano, através de um convite feito para a mãe dele, por um amigo, foi convidado a fazer parte da Associação dos Deficientes Físicos do Estado de Goiás (Adfego). “Minha mãe conheceu o Gaspar que fez o convite para eu fazer parte da Adfego, já tem um ano e três meses que sofri o acidente,  depois de três meses já comecei a jogar”, conta.

Gaspar Lopes de Paiva, 49 anos, amigo e paratleta, é parceiro de Alexandre no vôlei sentado. Os quais participam frequentemente de campeonatos representando Goiânia pelo Brasil. Em 1987, após um acidente de trânsito, Gaspar teve que amputar as duas pernas e só assim conheceu a Associação Adfego, a qual fez parte nove anos mais tarde. 

Na época ele não morava, na capital. “Quando vim para cá, logo comecei fazer parte da associação, já faz dezenove anos que moro em Goiânia, e 28 anos que sofri o acidente”, diz. Em 1996 ele teve a oportunidade de conhecer o esporte adaptado. Mas, conta a reportagem do Diário da Manhã que, antes do acidente, assim como o amigo Alexandre, já praticava esportes. “Antes eu era jogador de futebol amador, aqui na Adfego já participei de algumas modalidades: tênis de mesa, atletismo, natação e basquete em cadeira de rodas”, destaca.

Para o paratleta, o esporte adaptado, além de ser uma integração social, proporciona a possibilidade de conhecer diversos lugares. “Tenho tido a oportunidade de conhecer cidades em diferentes estados, que já pensei que nunca iria conhecer um dia. Conheci lugares que só via antes pela televisão”, ele avalia.

Por meio do esporte adaptado, Gaspar já disputou dez campeonatos brasileiros desde 2004 e lembra que esse ano o campeonato acontecerá em novembro. “A nossa equipe já chegou o mais próximo da vitória em quarto lugar”, cita. Mas ele reconhece que o mais importante que a vitória em uma competição é a vitória que o esporte lhe proporciona.

resgata vidas

Para a diretora de esporte da Associação dos Deficientes Físicos do Estado de Goiás (Adfego), Belarmina de Sousa Santos, 36 anos, o esporte é uma das principais atividades da associação. “Ele contribui para a reabilitação e socialização dos atletas representando uma forma de divulgação, ajudando também a atrair os jovens.”

Acrescenta que o esporte é fundamental na vida de qualquer pessoa e no caso dos portadores de deficiência física, assume um importante papel na luta pela eliminação de preconceitos e reconhecimento de seus valores. “O esporte resgata vidas, a gente tem exemplos, aqui, de pessoas que estavam afundadas nas drogas. Porque depois de perderem uma perna muito cedo ou um braço, achavam que isso era o fim da vida deles, que não tinham como recomeçar.” 

Mas, acrescenta, “ao conhecerem a Adfego, primeiro pelo processo social de reabilitação e depois, quando vem para o esporte eles descobrem que aquele membro vai fazer falta, mas eles podem ser uma pessoa diferente. Se tornando independentes depois de conhecerem o esporte”, observa.

Belarmina é cadeirante e entende bem os receios e medos enfrentados por portadores de deficiência. A diretora teve poliomielite, paralisia infantil, quando tinha um ano e seis meses. Diz nunca ter sofrido nenhum tipo de preconceito. “Posso dizer para você que sou uma deficiente feliz porque nunca enfrentei preconceitos diretamente comigo”, menciona.

Conta que há quatorze anos, quando veio morar em Goiânia, teve a oportunidade de conhecer e fazer parte da associação, a qual assegura ter a resgatado para o esporte. “Até então eu era sedentária, só trabalhava e estudava e não praticava esporte. Conheci o vôlei sentado e me apaixonei. Daí, nunca mais larguei. Vai fazer dez anos que faço parte do vôlei sentado, sou capitã do meu time”, informa.

*Tetraplégica que se tornou exemplo *

Em 1995, aos 29 anos de idade, Maria de Fátima Carvalho, 48 anos, mãe de duas meninas com idade de dois e cinco anos, em plena ascensão profissional, sofre um acidente de carro que a deixou tetraplégica. “Quando você sofre um acidente e você não meche nada, você pensa, acabou, estou confinada a morte, vou perder meu marido, vou perder tudo”, descreve.

Maria conta ter sido esse um processo difícil, “Na época eu estava com 29 anos, já tinha minhas filhas, tinha uma realidade completamente natural de uma pessoa que não conhecia nada sobre deficiência. Andava no salto alto para cima e para baixo e não via o mundo como ele é, sabe, era muito fantasioso era muito luxo, era muita ostentação e de repente, você descobre que vale a pena ajudar as pessoas, vale a pena viver com dificuldades, vale a pena amar o próximo”, revela. 

Como parte do processo de reabilitação, Maria conheceu a associação Adfego onde iniciou a tratamentos fisioterapêuticos. “Lá também me incentivaram ao esporte, mas preferi ir para a área de trabalho, trabalhei na associação, depois fui presidente por mais de doze anos, na Adfego”, lembra. 

Hoje, Maria de Fátima é superintendente de Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, ligada à Secretaria de Cidadania e Trabalho (SECT), do Estado de Goiás. “Estou como superintendente há um ano e tem sido muito bom uma pessoa com deficiência estar nesse cargo. Temos feito uma diferença muito grande, porque a gente conhece, vive esse dia a dia, então a gente sabe onde colocar as pessoas, onde é que pode está melhorando, qualificando essas pessoas não só para o esporte, mas também para o mercado de trabalho”, analisa.

A superintendente observa ainda que muitas vezes a pessoa com deficiência não dá mais conta de atuar no mercado de trabalho. “Então o esporte é a saída que renova e dar gosto para a vida, levando essa pessoa a deixar as drogas, a depressão. Porque muitas vezes quando a pessoa sofre um acidente causa uma depressão até ela se reabilitar o esporte é fundamental nesse processo de integração da sociedade”, considera. 

Determinação

Para o professor de Educação Física, Luiz Henrique Pereira da Silva, 23 anos, formado pela Universidade Federal de Goiás (UFG), o que mais o surpreende, enquanto professor de paratletas é a determinação dos alunos. “A determinação, o desejo, a vontade, essa determinação deles faz com que a gente fique cativado a sair de casa todos os dias para vir treinar, fazer um trabalho diferenciado”, defende. 

Luiz Henrique alerta para o cuidado que a família deve ter o sentindo de não proteger demais o deficiente físico, o que pode atrapalhar o novo processo de readaptação de uma nova realidade. “O protecionismo da família acaba inibindo a pessoa de ter um vínculo social e isso acaba fazendo com que ele entre em um processo de depressão. Quando ele vem para um meio que tem vários deficientes físicos iguais a ele e ele percebe que existem muitas pessoas como ele que não tem vergonha e estão super felizes isso faz toda a diferença”, acrescenta.

O professor ainda observa que as pessoas têm a tendência de ver o deficiente como um ser totalmente diferente de se lidar, quando, na verdade, avalia não ser. “Eles tem apenas uma limitação a mais que você. Ver uma pessoa que acabou de se tornar um deficiente físico, às vezes por trauma, acidente de trânsito, e você consegue fazer essa pessoa se desenvolver chegar em alguma lugar é muito gratificante”, conclui.

Associação

A Adfego possui hoje em torno de 15.000 mil associados. A natação foi o primeiro esporte implantado na instituição, depois veio o basquete em cadeira de rodas e, atualmente, entre os associados há esportistas de diversas áreas. E frequentemente a associação participa de campeonatos de paraolimpíadas e mundiais.

Em todas as modalidades (atletismo, natação, tênis-de-mesa, vôlei sentado, basquete em cadeira de rodas, halterofilismo, futebol de amputados, ciclismo, montain bike e dança em cadeira de rodas) os atletas apresentam excelentes resultados, destacando o basquete de cadeira de rodas e futebol de amputados. 

Gaspar Lopes e Alexandre Caetano, juntamente com toda a equipe de basquete de cadeira de rodas estão se preparando para o campeonato que está previsto para novembro ou outubro. “Toda a equipe está treinando para, estamos montando um time forte para chegarmos, novembro ou outubro, na competição e jogar de igual para igual, porque tem que ter garra, para jogar o vôlei sentado”, afirma Gaspar. 

Fonte: Diário da Manhã

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