A difícil busca pela liberdade

Data: 21 de setembro de 2014

Fonte/Veículo: O Popular/Mundo

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Separatistas

 

Segundo especialista, conquistar a independência apenas com palavras é uma tarefa inédita no mundo

Gilberto G. Pereira

Atletas timorenses em evento esportivo. Timor Leste se tornou independente em 2002

A Escócia mostrou ao mundo, além do civismo, a dificuldade que é conquistar a independência, seja com as armas em punho ou pelo viés democrático, que foi seu caso, buscando nas urnas um comum acordo se deixaria ou não o Reino Unido. O Não ganhou. No século 21, apenas três países ganharam o status de independentes, Sudão do Sul, Montenegro e Timor Leste. Nenhum baseado na civilidade dos atos, todos pelas armas em meio a muitas mortes.

De acordo com o professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Goiás (UFG), Matheus Pfrimer, o caso da Escócia chama a atenção justamente porque a independência bateu na trave pelo uso exclusivo da democracia (desta vez, já que houve outras lutas em séculos anteriores). Na quinta-feira, 84,5% dos 4,28 milhões de escoceses que se inscreveram foram às urnas para decidir seu futuro. Destes, 55% preferiram o conforto da proteção da coroa britânica (não sem uma pressãozinha comercial) do que se aventurar a construir uma nação independente.

“Os nacionalistas não venceram, mas o caso abre um precedente na história. Vários outros Estados se sentirão forçados a fazer referendos, e caso os separatistas ganhem, poderão ser forçados a reconhecer a secessão”, observa Pfrimer, que é especialista em segurança internacional e geopolítica. Segundo ele, o referendo pela independência é uma questão problemática. “O principio da autodeterminação dos povos, presente da Carta da ONU, não significa estritamente a ideia de um povo, um Estado. Isso representaria uma ameaça à estabilidade do Sistema Internacional”, avalia o professor.

Casos como o da Escócia, e outros mais complexos e violentos, existem aos borbotões pelo mundo todo. Muitos seguem silenciosos, outros fazem barulho, como líderes da Catalunha, uma das regiões mais ricas da Espanha. Eles vêm tentando se tornar independentes, e viram no exemplo da Escócia que é possível, embora a legislação espanhola seja de outro modelo (o governo exige que todos votem, não só a região interessada).

Segundo Pfrimer, são inúmeras as implicações que ocorrem quando um território se separa. As principais se referem à construção de infraestrutura que volte a articular as diferentes regiões do território do novo Estado e a estruturação de novos centros de poder, uma das razões pelas quais os cidadãos escoceses preferiram dizer não. “A formatação de uma nova arquitetura do poder se torna essencial.”

Além disso, diz o professor, a independência do novo Estado precisa angariar reconhecimento dos outros Estados já consolidados, com credibilidade no trânsito internacional. “Esse é um fator que muitas vezes dificulta a possibilidade da criação de novos Estados, já que novas unidades políticas impactam diretamente a estabilidade das relações internacionais tanto no Sistema Internacional, como também dos arranjos regionais”, analisa Pfrimer.

Por esta razão, sem armas em punho, é difícil ver o nascimento de um país. E pela violência, muitos morrem antes de um novo alvorecer. “O maior ônus que se tem ao longo do processo de separatismo é o número de vidas humanas que são ceifadas ou passam a viver em situação precária de campos de refugiados”, conclui o professor. 

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