Alvo duplo

Data: 28 de outubro de 2014

Fonte/Veículo: Ciência Hoje

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Pesquisa realizada na Universidade Federal de Goiás identifica compostos com grande potência no combate à leishmaniose em testes ‘in vitro’. O segredo desses novos candidatos a medicamentos é atacar de uma só vez duas proteínas do parasita causador da doença.

Por: Isabelle Carvalho

Publicado em 28/10/2014 | Atualizado em 28/10/2014

A partir de simulações em computador, foram identificados dez compostos capazes de atacar simultaneamente duas proteínas do parasita causador da leishmaniose. Três deles mostraram resultados promissores em testes em laboratório. (imagem: Carolina Horta)

A leishmaniose faz parte de um grupo de doenças classificadas como negligenciadas, que ocorrem principalmente em populações de baixa renda de regiões da Ásia, África e América Latina. Para combater esse mal, que hoje atinge em média 4 mil pessoas por ano no Brasil, é importante desenvolver medicamentos mais eficazes, menos tóxicos e com preços acessíveis. Um estudo realizado na Universidade Federal de Goiás (UFG) dá um passo nessa direção, ao identificar compostos com grande potencial contra o parasita causador da leishmaniose.

A leishmaniose é provocada por parasitas do gênero Leishmania, transmitidos ao homem e a cães pelo mosquito-palha. A doença se manifesta basicamente de duas formas: a leishmaniose cutânea, que produz lesões na pele e nas mucosas; e a leishmaniose visceral, que atinge os órgãos internos, como baço e fígado, e pode levar à morte.

A farmacêutica Carolina Horta, responsável pela pesquisa na UFG, destaca a enorme necessidade de se descobrirem novos fármacos contra a leishmaniose. “Os principais medicamentos usados no tratamento da doença foram desenvolvidos na década de 1940, são injetáveis e tóxicos, podendo causar uma série de efeitos colaterais, como problemas cardíacos e no fígado”, diz.

Horta: “Os principais medicamentos usados no tratamento da doença foram desenvolvidos na década de 1940, são injetáveis e tóxicos, podendo causar uma série de efeitos colaterais”

Além disso, segundo Horta, os medicamentos existentes nem sempre são eficazes. “Eles atuam em apenas um alvo do parasita causador, que pode acabar se tornando resistente.” Para driblar esse problema, a pesquisadora adotou uma estratégia inovadora: buscar um fármaco que atue em mais de uma proteína do parasita.

O primeiro passo da pesquisa, que teve início em 2010, foi identificar, a partir de simulações computacionais do organismo daLeishmania, proteínas que pudessem ser alvo dos novos medicamentos. Os resultados apontaram dois nomes: piruvato quinase e esterol desmetilase, consideradas vitais para o parasita.

“A partir daí, utilizamos um banco de dados com mais de um milhão de compostos pertencentes a uma empresa estadunidense para verificar, com base em algoritmos esoftwares, quais seriam os melhores candidatos para agir contra essas duas proteínas”, conta Horta. Dez compostos foram selecionados e comprados pela equipe.

Alta potência

Esses compostos foram testados na espécie Leishmania infantum, causadora da pior forma de leishmaniose, a visceral. Os testes, feitos no Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo, com a colaboração do pesquisador André Tempone, levaram à seleção de três compostos, que se mostraram três vezes mais potentes que os medicamentos atuais contra o parasita.

Agora a equipe vai realizar ensaios com clones das duas proteínas da Leishmania infantum e com os compostos selecionados para entender como acontece a inibição do parasita. Em seguida, serão feitos testes em animais, que devem levar cerca de dois anos, para avaliar a eficácia dos compostos no combate à leishmaniose. “Depois, são necessários ensaios de segurança, testes de toxicidade e, se os compostos continuarem promissores, partiremos para os testes em seres humanos”, descreve Horta, estimando um período de 10 a 15 anos de pesquisa até a produção de um medicamento.

Por seu estudo com fármacos para leishmaniose, Carolina Horta foi uma das sete vencedoras deste ano do prêmio Para Mulheres na Ciência, promovido pela L’Oréal em parceria com a Unesco e a Academia Brasileira de Ciências. A pesquisadora recebeu a premiação das mãos do jurado Jaílson de Andrade, químico da Universidade Federal da Bahia, em cerimônia realizada no dia 21 de outubro. (foto: Rosane Bekierman)

Por esse estudo, Horta foi uma das vencedoras deste ano do prêmio Para Mulheres na Ciência, promovido pela L’Oréal em parceria com a Unesco e a Academia Brasileira de Ciências. Ela e outras seis pesquisadoras brasileiras de diferentes áreas receberam uma bolsa de 20 mil dólares para investimentos em futuras pesquisas.

Além da busca por fármacos contra a leishmaniose, Horta também atua em estudos para desenvolver medicamentos contra malária, doença de Chagas, esquistossomose, tuberculose e câncer. “Para as primeiras quatro, já temos alguns fortes candidatos a fármacos; já a pesquisa contra o câncer de mama e próstata ainda está bem no início”, comenta.


Isabelle Carvalho
Ciência Hoje On-line

Fonte: Ciência Hoje

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